taçó e mais terras de Monte-Mór o Novo, (1) bem como as villas de Sardoal, Punhete, Marvão, Villa Nova de Anços, as terras e herdados que a Infanta D. Beatriz possuia em Extremoz, Aviz e Evora, a Quinta do Judeu em Santarem, as Alcaidarias de Portalegre e Alemquer, e o senhorio do Castello de Alcanede. D. Leonor Telles nomeou Vasco Pires de Camões aio do Conde de Barcellos seu sobrinho; todas estas liberalidades foram causa d'elle seguir depois o partido do Conde Andeiro contra o Mestre de Aviz. Em vista de tanta benignidade regia, comprehende-se logo a quem se refere a estancia VIII da Carta em redondilhas de Manoel Machado de Azevedo escripta a Sá de Miranda: Hade enfreiar sua penna Que Camões ou João de Mena. (2) Juan de Mena era o poeta cesáreo de Henrique II de Castella; Vasco Pires de Camões, abandonando o partido de Henrique 11, e seguindo a causa já morta de Pedro Cruel, sustentada por el-rei D. Fernando de Portugal, cá veiu encontrar na liberalidade real a compensação da perda da sua patria e solar. Tantas mercês e doações o tornaram por assim dizer o typo pro (1) Liv. I da Chancell., fl. 9; ib., liv. 11, fl. 2. Ι (2) Apud Historia dos Quinhentistas, p. 108. verbial do aulico favorito, como o era na côrte de Castella o poeta Juan de Mena. (1) Com Vasco Pires de Camões tambem veiu para Portugal um seu primo, Ayres Perez de Camões, como se vê pela Chronica de D. João I, de Fernão Lopes; (2) «Entonce ficou com elles Ayres Peres de Camões, seu primo... O velho trovador galeziano, grato á memoria de el-rei D. Fernando, seguiu o partido de D. Leonor Telles, e resistiu contra o Mestre de Aviz, na sua Alcaideria de Alemquer; Fernão Lopes, que recolheu nas suas Chronicas as tradições do tempo, retrata-o com um caracter venal, contractando com o Condestavel a sua entrega por dinheiro: «E contado havemos como, jazendo o Mestre sobre Alemquer, preitejava com Vasco Pires de Camões, que lhe desse o logar com certas condições, em que se concordaram, recebendo entonce do Mestre soldo elle e Gonçalo Tenreiro seu sogro... e mandou Vasco Pires ao Mestre Gonçalo Tenreiro, seu sogro, com recado sobre certas cousas, e quando tornou de Torres Vedras, parece que Vasco Pires nom foy con (1) O snr. Visconde de Juromenha equivocou-se attribuindo a essa quadra um sentido allusivo a Luiz de Camões, para provar: «a consideração e estima que houve logo na côrte por elle. (Obras, t. 1, p. 28.) Além do argumento que acima fica, outro se tira da propria Carta, onde Manoel Machado de Azevedo chama a Så de Miranda: «Amigo, senhor e hirmão. » A palavra hirmão aqui significa cunhado; sendo o casamento de Sá de Miranda em 1536, e referindo-se a carta ao desgosto que o fez saír da côrte em 1534, com certeza não póde alludir a Luiz de Camões, que só começou a figurar na côrte em 1546. (2) Cap. 186, f. 392. tente da resposta ou por ventura tinha vontade de fazer aquello que fez, e buscou azo de o fazer mais sem prasmo. » (1) E accrescenta: «Falando em esto de praça, o que lhe houverom por mal para fidalgo: - Olhay, que vos valha Deus, que boa preytezia fazia commigo o Mestre: Mandey lá meu padre Gonçalo Tenreiro com alguns desembargos, e nam me tornou nenhuma cousa, inda se me trouvera mil dobras emburilhadas em um trapinho, guardar-lhe-ia preytezia; pois me não trouve nada, nam curo de lha guardar.» (2) Na Chronica anonyma do Condestavel, tambem se fala em Vasco Pires de Camões, que abraçara o partido de Castella: «Tendo Vasco Pires de Camões a Villa e o Castello de Alemquer por a rainha D. Leonor, e com muita gente de Castellãos e portuguezes, o Mestre se partiu de Lisboa, e Nunalvres com elle, nom mais que com duzentas ou trezentas lanças e poucos homens de pé e besteiros, e se foi a Alemquer sobre Vasco Pires. E foram hy feitas muitas escaramuças da gente do Mestre com os que estavam na villa. » (3) D'este facto historico se originou a tradição de Luiz de Camões ter nascido em Alemquer. Vasco Pires de Camões ficou prisioneiro na batalha de Aljubarrota. No Cancionero de Baena, ha um verso de Fray Diego de Valencia, que allude a este captiveiro: Que Dios vos guarde de mala prision. (1) Cap., f. 391. (2) Ib., A. 393. Vid. tambem cap. 17, fl. 34; cap. 31, fl. 55. (3) Chr. do Cond., cap. 21. D. João I confiscou-lhe as immensas doações regias, deixando-lhe apesar de tudo as herdades de Evora, Estremoz e Aviz, de que fez varios morgados conhecidos pelo nome das Camoeiras. Em Evora dava-se o nome de Camoeiras ás casas do Recolhimento de Santa Maria Magdalena, assim chamadas por terem pertencido aos descendentes de Vasco Pires. (1) O Morgado das Camoeiras de Evora, pertenceu, segundo Alão de Moraes, a Lopo Vaz de Camões, e no termo de Alemquer existiu outra propriedade com o titulo de Quinta de Camões. (2) Como sabemos pela authoridade historica de Fernão Lopes, no tempo das luctas do Mestre de Aviz, era Vasco Pires de Camões casado com uma filha de Gonçalo Tenreiro, aí apellidado Mestre, e nos Nobiliarios, chamado Capitão-Mór das Armadas de Portugal; segundo Alão de Moraes, o nome de sua mulher era Maria Tenreira. (3) Os talentos poeticos de Vasco Pires de Camões eram conhecidos tanto em Portugal, como em Castella; o Marquez de Santillana, escrevendo ao Condestavel de Portugal, antes de 1449, cita-o como um representante dos ultimos restos da eschola provençal da Peninsula: «Depois d'estes (João Soares de Paiva, e Fernant Gonzales de Senabria) vieram Basco Peres de Camões e Ferrant Casquicio, e aquelle grande ena (1) Fonseca, Evora gloriosa, pag. 233. (2) Juromenha, Obras, t. 1, not. 12. (3) O snr. Visconde de Juromenha, traz o nome de Francisca. Obras, t. I, p. 13. morado Macias.» (1) Apesar de se encontrar no Cancioneiro da Vaticana o nome de um Vasco Perez, crêmos comtudo que as poesias de Vasco Pires de Camões não foram recolhidas n'esse Codice, não só porque, segundo Wolf, termina em 1357, mas principalmente porque o Marquez de Santillana, descrevendo o Cancioneiro que possuia sua avó D. Mecia de Cisneros, e falando das Canções de el-rei D. Diniz e de outros trovadores, escreve: «Depois d'estes vieram...» e n'esse Codice não se acham as canções de Macias nem de Ferrant Casquicio, com que elle representava a nova influencia litteraria. (2) Do seu casamento com a filha de Gonçalo Tenreiro, teve Vasco Pires de Camões tres filhos, sendo o primogenito, Gonçalo Vaz de Camões; do seu filho segundo, João Vaz de Camões, é que descendo o immortal poeta Luiz de Camões; e finalmente de sua filha Constança Pires de Camões descendem os Severins de Faria, distinguindo-se entre estes Manoel de Faria Severim, que fez o primeiro estudo sobre a vida de Camões, com elementos autobiographicos, e Gaspar de Faria Severim, sobrinho do erudito Chantre da Sé d'Evora, que mandou gravar o primeiro retrato de Camões. D'esses tres filhos de Vasco Pires de Camões continuou a descendencia, excepto a de João Vaz de Camões, que (1) Apud Poetas palacianos, p. 166, Carta, § xv. (1) Osnr. Visconde de Juromenha, interpretou esta passagem da Carta, menos proximo da verdade. Obras., t. 1, p. 13. |