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II

MARTIM FRANCISCO RIBEIRO DE ANDRADA

Ill.m

mo Sñr. Antonio de Menezes Drummond.

Bordeaux, 2 de Setembro

(de 1824).

Meu bom amigo, recebi a carta de V. S." e já respondo a ella.

Folguei com a noticia, que me deu, de haver recebido carta de seu mano, de estar elle solto e restituido ao seu emprego: quando lhe escrever, dê-lhe vivas saudades minhas.

Quantas risadas, porém, dei com a minha pronuncia e a dos meus companheiros, deportados pelo governo, ou fugidos para escaparem ás violencias do mesmo! Pronunciados por escriptores ou redactores, é cousa nova, porque suppõe uma lei que véde o escrever, e é ainda mais extraordinario, quando similhante pronuncia se estriba no debil testemunho de vozes vagas; todavia, quero suppôr que não somos pronunciados por escriptores, etc., mas sim por havermos professado em nossos escriptos, doutrinas defesas pela lei: neste caso havia um abuso de imprensa, e deviamos ser chamados perante os jurados, que tinham, á vista da nossa defeza, de absolver-nos ou condemnar-nos, e portanto a devassa é nulla; a ordem do infame Ministerio, a obediencia do vil Magistrado e sua pronuncia, são actos de accusação a mais legitima contra uma e outra autoridade em toda esta vergonhosa transacção; o que mais me horrorisa é ver o desgraçado Francisco Antonio tambem pronunciado; quero dizer, o espancado tido por criminoso, e o espancador livre e innocente.

Vi as patifarias e desaforos de José Fortunato; não sei de que mais me deva espantar, se da insolencia de um Mouro, se da abjecção e baixeza de um Brazileiro.

Entre os povos da Europa mais corrompidos, insultos d'esta natureza vingam-se com a morte; entre humildes christãos, quaes os Brazileiros, toleram-se e ás vezes agradecem-se: qual será a sorte futura de nossa patria? Desconfio, meu amigo, que não venha a ser o despotismo.

Passemos ao augmento das rendas da Alfandega no mez de Maio. Duzentos e quarenta e tantos contos são o rendimento dos direitos de importação e exportação naquelle mez; então não houve augmento algum, e pelo contrario, grande diminuição, filha das causas que sabemos, e das outras apontadas na carta de seu mano o Sñr. Luiz de Menezes; se, porém, um tal rendimento pertence exclusivamente á Alfandega, como supponho, esta apparencia de riqueza e prosperidade é uma anomalia á primeira vista, mas de facto é resultado necessario, bem que por pouco tempo, do estado miseravel em que se acha o Brazil. Passemos á explicação. Em todo o paiz que se reforma,

quando nelle apparece uma revolução em sentido retrogrado, isto é, contra a opinião publica, as riquezas deixam de circular, as classes activas e industriosas, como feridas de raio, suspendem seus trabalhos, e este estado de apathia prolonga-se e dura algum tempo, se ha esperanças de outra revolução mais feliz; tudo isto se viu no Rio depois da dissolução da Assembléa, segundo affirmam as gazetas inglezas no Rio; não ha governo, mas uma anarchia doce; o povo conserva-se tranquillo, mas descontente; o commercio está paralysado, o cambio está a 47, e espera-se que desça cada vez mais.

Se, porém, situação tão infeliz continúa sem visos de melhoramento, então apparece um momento de força e actividade em todas as classes da nação; é o começo da gangrena no corpo enfermo, que termina pela morte; o productor reduz suas producções a moeda, porque quer, ou escapar á tyrannia, ou adoçar seu oppressor; o commerciante nacional termina com o mesmo fito todas as suas transacções mercantis, e o estrangeiro procura apurar todos os seus fundos, para abandonar um paiz de calamidades; realiza-os em moeda, se esta não dá prejuizo no paiz para onde conta passal-a, ou em effeitos, quando perdem nella. Eis a causa do grande rendimento no mez de Maio, que talvez se estenderá ainda ao de Junho e Julho, só devido aos direitos de importação que pagaram as mercadorias existentes na Alfandega, então despachadas e vendidas, e aos de exportação dos generos que sahiram em pagamento das multas: semelhante prosperidade é ephemera, e só indica desgraças futuras e por longo tempo.

Se ajuntarmos a esta causa as seguintes que são obvias, como por exemplo, as muitas licenças dadas inda em meu tempo (nos mezes de Junho e Julho) para a sahida da prata hespanhola para a Africa, com o fito de promover o trafico de escravos, e augmentar as rendas do Consulado; este commercio ainda mais augmentado em consequencia do temor de sua prompta suppressão; a grande venda de vinhos, que haviam entrado depois do Decreto ultimo, e finalmente, a entrada forçada no porto do Rio de mercadorias destinadas para Pernambuco e outros portos das provincias do Norte, e impedidas de nellas entrarem por causa do bloqueio, temos explicado ou dado a razão de um tal augmento.

Quanto ao emprestimo, só posso dizer a respeito d'elle que os seus autores e agentes são todos dignos de uma forca.

O que eu tinha a dizer sobre os retratos, ja meu mano disse ao amigo Rocha; por isso nada accrescento.

a seus filhos.

Meu mano pede que acceite esta por sua, e eu peço o mesmo ao bom amigo Rocha; e envio saudosas lembranças, tanto a elle, como Adeus, meu bom e caro amigo; disponha da vontade do

Seu do C.

M. F. R. de ANDRADA.

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