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87.

M

Manhaninha de S. João

ANHANINHA de S. João, pela manhan de alvo

rada,

Jesus Christo se passea ao redor da fonte clara ;
por sua boca dizia, por sua boca falava :
<< Esta agua fica benta e a fonte fica sagrada.»
Ouviu a filha de el rei d' altas torres donde estava,
vestiu suas meias de seda,
pegou em cantaro de ouro,
Lá no meo do caminho

calçou sapatos de prata,

á fonte foi buscar agua. com a Virgem se encontrava,

atreveu-se e perguntou-lhe se havia de ser casada.

<< Casadinha haveis de ser,
tres filhos haveis de ter,
um será bispo em Roma,
o mais novo deles todos

muito bem afortunada; todos de capa e espada ;

outro cardeal em Braga, servo da Virgem sagrada.»

Ditosa da donzelinha que á fonte foi buscar agua!

88.

D. PHILIPA DE LENCASTRE

Ao Bom Jesus

NAN

AM vos sirvo nem vos amo
mas desejo vos amar,
de sempre vossa me chamo
sem quem nam é repousar.
Ó vida e lume e luz,
infindo bem e inteiro,
meu Jesus, Deus verdadeiro,
por mim morto em a cruz.

Se mim mesma nam desamo
nam vos posso bem amar:
a me ajudar vos chamo
para saber repousar!

1437-1497

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C. 1470-1536

90. Trovas á morte de D. Inés de Castro

Q

UAL será o coraçam

tam cru e sem piedade
que lhe nam cause paixam
uma tam fera crueldade

e morte tam sem razam?
Triste de mim inocente,
que por ter muito fervente
lealdade, fe, amor

ao principe meu senhor,

me mataram cruamente.

A minha desaventura,
nam contente d'acabar-me,
por me dar maior tristura
me foi pôr em tanta altura
para d'alto derribar-me,
que se me matara alguem
antes de ter tanto bem
em tais chamas nam ardera,
pai, filhos nam conhecera,
nem me chorara ninguem.

Eu era moça menina,
por nome dona Inés

de Crasto, e de tal doutrina
que era dina

e vertudes

de meu mal ser ao revés.

Vivia sem me lembrar

que paixam podia dar

nem dâ-la ninguem a mim,

foi-m' o principe olhar

por seu nojo e minha fim.

Começou-m' a desejar, trabalhou por me servir, fortuna foi ordenar

dous corações conformar, a uma vontade vir. Conheceo-me, conheci-o, quis-me bem e eu a ele, perdeo-me, tambem perdi-o; nunca té morte foi frio o bem que triste pos nele.

Dei-lhe minha liberdade,
nam senti perda de fama,
pos nele minha verdade,
quis fazer sua vontade,
sendo mui fremosa dama.
Por m' estas obras pagar
nunca jamais quis casar,
polo qual aconselhado
foi el rei qu' era forçado
polo seu de me matar.

Estava muito acatada, como princesa servida, em meus paços mui honrada, de tudo mui abastada,

de meu senhor mui querida : estando mui de vagar, bem fora de tal cuidar, em Coimbra d' assessego, polos campos de Mondego cavaleiros vi asomar.

Como as cousas que ham de ser
logo dam no coraçam,
comecei entristecer

e comigo só dizer :
Estes omes onde irão?
E tanto que preguntei :
soube logo que era el rei.
Quando o vi tam apressado,
meu coraçam trespassado
que nunca mais falei.

foi

E quando vi que decia,
saí á porta da sala,
devinhando o que queria ;
com gram choro e cortesia
lhe fiz uma triste fala ;
meus filhos pos derredor
de mim com gram omildade,
mui cortada de temor,
lhe disse: Avei, senhor,
desta triste piedade.

Nam possa mais a paixam.
que o que deveis fazer,
metei nisso bem a mão,
que é de fraco coraçam
sem porque matar molher;
quanto mais a mim (que dam
culpa nam sendo razam)
por ser mãi dos inocentes
qu' ante vos estam presentes,
os quais vossos netos sam.

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