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Meu caro Sñr. Menezes.

Amigo do coração, não tenho escripto a V. S. porque por mim o faria Antonio Carlos; agora porém que na sua de 26 de Agosto parece inculparme de falta de confiança e amizade, é justo que sáia eu da santa mandrieira, e que me defenda da sua injusta accusação.

Não foi por desamor, ou por não fazer conceito no seu zelo e conhecimentos, que eu me dirigi a Borges de Barros, para me informar do estado das sciencias naturaes presentemente em França; mas sim, parte por politica e parte porque tendo elle seguido esta carreira em Coimbra e em Paris, poderia satisfazer a minha commissão, que não era o enviar-me um catalogo de autores. Aqui tens a verdade nua.

Passemos a outras coisas; e quanto ao retrato, no Rio de Janeiro deixei 2 meus, um feito em Lisboa, que está arruinado no busto, mas não nas feições, outro que fez o Silva do Rio, e o 3.o, quasi acabado, que pára em mão de Madama Touloi, que o tirou; quanto ás traducções approvo ambas... pelo que diz respeito á de Botanica, póde servir... a de seu Mano dos Elementos de Botanica, impressa em Paris em 2 volumes de Oitavo pelo B...... e tambem da sua obra de Physiologia vegetal, impressa em Lisboa ou Coimbra, que ha de parar na Livraria Publica de Paris.-Eu cá não tenho alguma ; porém se quizer mandar-me o Mss. o emendarei, como me for possivel. Lembro-lhe que seria util traduzir a minha carta-Doutor da roça, e a de João Claro, com notas illustrativas, e imprimil-as em Londres.

Rogo-lhe que saiba se já ha nomeações de Deputados nas Provincias do Sul, principalmente de S. Paulo, e quaes são; e como tambem creio que meu irmão Antonio já terá escripto ao bom amigo Rocha, ou a V. S.* sobre a carta anonyma que me veiu dirigida, ameaçando-nos que não vamos ao Brazil, porque somos detestados por todos os partidos, e porque seremos assassinados em qualquer parte onde desembarcarmos; (a qual carta tenho motivos ponderosos para crer que sahiu da Fabrica do Borges de Barros. Rogo a V. S. e ao dito Sr. Rocha, queiram com muita dexteridade saccar isto a limpo. Queira comprar-me a obra de D'Aubuisson, Traité de Geognosie,

B. X.

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2 vol., 8.o; a parte do Bulletin universel des sciences et de l'industrie, que trata das sciencias naturaes, que faz 3 volumes e custa 22 fr.; emfim os Elements de Minéralogie de Beudant, que estão a sahir da imprensa. Eu satisfarei isto do modo que me quererá indicar.

Adeus, meu bom amigo e companheiro de malheur; aceite o coração do seu

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Meus bons amigos, esta carta vai commum de dous; e começando pelo Sñr. Rocha direi : Ill.mo, Vossa Senhoria é como os oraculos do Paganismo, que emudeceram com a vinda de Christo; assim V. S. com a sua ida a Paris, ou Deus sabe se com os seus novos conhecimentos utriusque sexus. Quando vou as vezes á Bordéos, que não são muitas, pergunto sempre : Escreveu o amigo Rocha? - Não senhor, é o que se me responde. Ora pois, é preciso que um preguiçoso como eu vá esperar outro. Muito folguei saber que o nosso Innocencio já está por essses mares de Christo; e espero a sua feliz viagem lhe seja proficua, a elle, a V. S. e tambem a mim, pois creio que só por sua actividade e zelo poderei cobrar alguma coisa da nossa pensão. Como agora circulam em segredo por aqui noticias ominosas do Brazil, é facil em 'Paris saber o que ha na materia; e portanto rogo que se communique quanto antes para meu governo. Passemos ao Sñr. Menezes.- Ill., eu lhe agradeço muito a remessa dos livros, e tinha mais outra encommendinha a fazer-lhe ; mas antes d'isto cumpre que me diga o que importa a primeira e a quem devo entregar o dinheiro; demais convem que tambem calcule com a minha bolsa tisica. V. S. tem sido muito injusto em accusar os amigos de fraquezas da carne, quando por cá sôa que lá se gasta com cominhos ou confeitos de Endoenças. Item quanto ao que me diz sobre a carta anonyma; ainda persisto nas minhas suspeitas; pois a lettra, bem que disfarçada, é a mesma do sujeito em que fallei; e muito me peza que ella se trasmalhasse, porque lh'a remetteria a cotejar.

Quanto á minha nomeação para senador, confesso que me fez algum bem ao coração ver que os Bahianos não se esqueceram de todo de um homem, que tanto gritou e forcejou para que fossem soccorridos contra os vandalos de Portugal; mas, como o que por ora ambiciono é ir acabar os meus cansados dias em um cantinho bem escuro e solitario da minha bestial Provincia; e portanto rogo a Deus que S. M. Imperial me queira preterir na escolha.

Quanto ao retrato, condescenderia de boa mente aos seus desejos; mas não me é possivel por ora, não só porque habito no campo, mas principalmente porque a magra bolsa não consente bazofias.

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Saberão V. S.as ambas que a solidão do campo me tem trazido de novo a mania antiga de poeta, com que espanco lembranças afflictivas, que de quando em quando me assaltam. Traduzi a 1.a Ecloga de Virgilio, e estou com a 2.a entre mãos ; tambem me abalancei ao trabalho herculeo de traduzir a Ode das Olympicas de Pindaro, apezar das falhas e mazellas da lingua portugueza, e estou com a 1. das Pythicas do mesmo autor. Quero que os nossos compositores de Odes pseudo-pindaricas leiam o que são as Odes verdadeiras de Pindaro. Tenho feito muitas outras coisinhas, como Odes Saphicas e Anacreonticas; tenho revisto as minhas, antigas composições que destino para a impressão; e por fim, no mez passado, escrevi uma longa carta em verso a um sonhado amigo do Rio, que não me desagrada pelos rasgos de poesia e philosophia que encerra, e pela pintura da nossa viagem deportatoria. Logo que a tiver copiado em limpo, lhes enviarei com a promessa porém antecedente, de que não ha de sahir das suas mãos por ora, pois assim me convem.

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Recebi com muito gosto a sua carta tambem commum de dois de 6 do corrente, porque nella me dá V. S. esperanças de que bem cedo terei o gosto de abraçal-o nesta vinhosa cidade, ourinol do mundo; e para então guardo mostrar-lhe as minhas novas poesias, e principalmente a Epistola a

Lucindo; pois, além de as não ter ainda posto a limpo, não julgo prudente confial-as ao correio, de quem muito desconfio, segundo o que me avisa a este respeito. Se estivera em Paris, e com a bolsa menos magra, já as teria impresso, antes que levassem todas o mesmo caminho que já por tres vezes tiveram as outras. Aqui a impressão é mais cara; todavia, se receber algum dinheiro do Brazil, de certo farei imprimir duzentos exemplares para repartir com alguns amigos; que para los otros me cago io, como diria o castelhano com os santos que tinha mettido na monteira. Vamos aos livros: aqui darei ao Balguerie os 46, francos para que lh'os remetta; e, como não devo abusar da sua generosidade para o privar do dinheiro, que muito lhe será preciso em um paiz em que elle tanto vale, apezar da precisão da edição de Pindaro por Heine, V. S. o não compre, porque é assaz caro por 36 fr. As obras de Virgilio de Voss, em que me falla, será a traducção da Eneida, que não tem notas nem o texto ao lado; as outras obras são poesias de..... que tenho no Rio. Ora diga-me: como quer por ora que cuide da historia da Revolução do Brazil, cujus pars magna fui, nas actuaes circumstancias, sem documentos originaes, nem sequer Gazetas e impressos do tempo? Ainda peior é ler as mentiras do Annuaire historique e não podel-as confutar. O que me diz a respeito da infame aprehensão das cartas para o Brazil, tambem cada vez mais me convence da parte que teve na copia e remessa da carta anonyma; mas cumpre dissimular por ora. Como estou certo que os Bahianos me nomearão Deputado, apezar das ameaças da dita carta, estou resolvido a ir ao Brazil; e lá verei se devo ficar em tal Paiz, ou vender os meus tarecos e abalar para Colombia, paiz quente e proprio para um velho rheumatico, e sobre tudo paiz Americano e Livre. Sinto muito que tenha soffrido muito dos olhos; e, para os não fatigar com as minhas rabiscas, serei mais breve do que talvez seria nesta carta. Tornando outra vez á remessa de livros, rogo-lhe que assigne e me remetta a parte do Bulletin des sciences historiques, antiquités, philologie, etc., e veja entre os Livreiros de livros allemàes, se tem a obra de Mohs-Grundriss der Mineralogie - Fundamentos de Mineralogia, dois volumes em 8.o, caso estejam já completos neste anno.

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Como ainda ha muito papel em branco, que deve pagar ao correio, apezar dos seus olhos, vou copiar-lhe aqui a Dedicatoria, que hei de pôr ás Poesias avulsas de Americo Elysio.

Brazileiros-Costumavam os Gregos e Romanos do bom tempo antigo dedicar suas obras a seus naturaes e amigos; porque a adulação e o interesse não aviltavam então as letras e as sciencias. Os valídos da fortuna, a cujas abas se acoitam hoje os peralvilhos litterarios, se não tinham verdadeiro merito, não recebiam, nem pagavam louvores mentirosos. Mas, se no meio da corrupção moderna não pode obstar o escriptor que os escravos lisongeiros ou esfai

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