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ANDRAGEO.

Asperissima Phylis, a meos danos,

De que eu, por aprazer-te, mais dezejo,
Não sei se isto he verdade, ou sam enganos,
Ouço dizer que hes branda, e não o vêjo.
Acrescenta-me, Phylis, a tristeza

Mudares para mim tua natureza.

PIERIO.

Formosissima Phylis, si eu tivera

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Do gran Tytiro a fama, a voz, e o canto,
A fraula, a voz, o canto a ti só dera,
Co' mesmo amor, com que ora a ti só canto.
Mas isto, Phylis, he pura verdade,

E muito mais te dá minha vontade.

ANDRAGEO.

Amo-te, Phylis, quanto amar-te posso, Vêjo que quanto podes te avorreço, Escondido lá tens o lume nosso, Sem elle nem me vêjo, nem conheço. Deixa-te, Phylis, vêr, ah! não te escondas, Só porque mal ao meo amor respondas.

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Canto-te, Phylis, quanto sei cantar-te, Sempre a teu canto dou tudo o que entendo, A meos versos não busco estilo, ou arte, Pois nunca ham de chegar ao que pertendo. Disto ha, Phylis, em mim continua queixa, Mas assim como sei cantar-te deixa.

ANDRAGEO.

Inda, Phylis, que n'alma, com que te amo, Sempre te tenho, si não posso vêr-te, Dos olhos tristes lagrimas derramo,

Que a abrandar-te não bastam, nem mover-te. Mas si a lagrimas, Phylis, não te abrandas, Não tens as condições, como ouço, brandas.

PIERIO.

Inda, Phylis, que sempre a alma te canta, Si á voz teo canto ás vezes se me estrova, Se cobre o esprito de tristeza tanta, Que se enche de huma dôr aspera, e nova, E não se gasta, Phylis, esta pena

The que outra vez ao canto a voz se ordena.

ANDRAGEO.

Todo hum anno não he, Phylis, tão grande Quanto a mim, sem te vêr, hum breve espaço, Nem ha quem minha grave dôr me abrande, Sem a vista, em que só me satisfaço. Dam teus olhos á pena, Phylis, termo, Sem elles quanto vêjo he escuro, e ermo.

PIERIO.

Não he, Phylis, tão grande hua triste vida, Quanto a mim, sem cantar-te, espaço breve, De mi só a voz, que de ti canta, he ouvida, Só cantado he de mim quem de ti escreve. Enche teo nome, Phylis, meos ouvidos, Tenho todos os outros esquecidos.

ANDRAGEO.

Phylis, não he tão aspero, e tão duro
O bravo Boreas na maior tormenta,
Nem he o triste Inverno tão escuro
Quando a sua mór furia representa,
Quanto a mim, Phylis, he danoso, e forte
Vêr de ti despresada a minha sorte.

PIERIQ.

Phylis, não he tão doce, nem tão brando Zephyro, quando mais brando o sentimos, Nem tão alegre, e claro o Verão quando Mais formoso, mais claro, e alegre o vimos, Quanto, Phylis, a todo o peso grave, Tua branda voz sempre he doce, e suave.

ANDRAGEO.

Minhas tristezas, Phylis, graves sejam
Quando não vêjo os teos olhos formosos,
Outra vez alegria nova vêjam

Os meos do que em ti viam saudosos,
A dôr com elles, Phylis, se desterra,
E sem elles a paz se muda em guerra.

PIERIO.

De Flores seja o campo, Phylis, cheio,
De côres ria, o bosque, o prado, e o valle,
Meta-se o duro tempo logo em meio,
Tudo seque, destrua, mova, e aballe,

Si te vás, Phylis, flôr, e côr perece,
Si tornas logo tudo reverdece.

ANDRAGEO.

Por mil Arvores vou, Phylis, formosa,
Contando quanto te amo, e me desamas,
Verás nellas a pena rigorosa,

Que este peito me accende em vivas chamas,
Porque, quando a voz Phylis, me falesça,
Nellas este amor, e odio se conheça.

PIERIO.

Por mil arvores, Phylis, o teo nome
Tenho, como em meu peito está, esculpido,
Nellas digo, que não ha quem assome
Ao louvor, que de todos te he devido;
Porque quando eu cantar-te já não possa,
De mim se ouça inda o bem da edade nossa.

Estas Cantigas me parecem no verdadeiro estylo pastoril, singellas, mas elegantes na expressão, sem que com tudo excedam o alcance da intelligencia dos Zagaes, a quem sam atribuidas.

Pelo exordio da segunda se conhece, que o Poeta lîa Virgilio, e fazia deligencia por imita-lo nas suas pastoraes.

Inda te peço, Musa, hum favor grande,

Novo canto me dá, com que aos ouvidos
De Marilia amor de Franco mande.

De Marilia meos versos sejam lidos,
E d'huma branda voz, a Franco amiga,
Mil vezes a Marilia repetidos.

A' sorte do meo Franco dura, e imiga
Quem versos negará ? que ha quem a grave
Dôr sua em alta voz com dôr não diga?
Amor, e hum brando Zephyro, e suave
Seo amor aos ouvidos surdos leve,
Porque menos a pena a alma lhe agrave.
Franco, que ao Sol, á sombra, e frio, e neve
Nunca a Marilia mais, nem menos ama,
E que sempre a Marilia n'alma escreve.
Franco, que tristes lagrimas derrama,
E em suspiros do peito lansa fogo,
E a si por só Marilia se desama.

Move-se o Amor a seu queixume, e rogo,
Choram seo damno as mais incultas Feras,
Tem seo mal só Marilia em rizo, e jogo.
Ah Marilia cruel, que desesperas
Cada vez mais a Franco injustamente,
Porque a ira contra elle não temperas.

Que mal em Franco teo esprito sente,
Que cada hora em seo odio mais se accende,
E cada hora em seos damnos mais consente ?
Ah formosa Marilia, em que te offende
Quem só amar sabe tua formosura,

Teu só nome ouve, teo só Amor entende?

A imitação é livre; mas nella se deixa bem conhecer o

Extremum hunc, Arethusi, mihi concede laborem, Pouca meo Gallo, sed quæ legat ipsa Licoris, Carmina sunt dicenda, neget quis carmina Gallo?

da Ecloga X. do Poeta Montuano, e o

Daphni, tuum Panos etiam ingemuisse Leones
Interitum montesque feri, sylvæque loguuntur.

da Ecloga V.?

Destas quatro Eclogas, a que me parece peior é a terceira, que se reduz a um prolixo e fastidiosa encadeação de louvores exagerados de D. Duarte, e de suas irmãas, sem que ao menos a poesia do estylo tempere estes excessos adulatorios: isto poderia servir os intentos do Poeta, e torna-lo grato a seu amo, mas é intoleravel para o Leitor, especialmente quando a adulação se explica em versos como estes.

Maria, e Catharina, cada uma

Vence o Sol, vence a Lua, vence Estrellas,

Vence as trez Graças bellas, gentileza

Nellas tudo he, e belleza, e pensamento,

Alto, alto entendimento, quanto vêjo

Nellas, nada sobeja, nada falta.

É preciso confessar, que quando Virgilio lisongeia os seus protectores, é sempre em um estylo mais comedido, mais elegante, e sobre tudo em melhores versos. È probavel que os elogiados ficassem muito satisfeitos, ha paladares a quem o louvor recreia, por mais mal temperado que seja, mas o público nem sempre faz choro com os applausos dos salões.

As Odes de Caminha, posto que estejam ainda muito longe do que este Poema deve ser, me parecem, a pesar disto, superiores não só ás de Diogo Bernardes, mas até ás de Antonio Ferreira, pelo menos no que diz respeito á versificação, e córte das Estrophes. Parece-me, si não me engano, que de todos os Poetas daquelle tempo é Caminha quem atina mais vezes com o tom lyrico da Ode, e quem descahe menos no estylo da Canção; o que não obstante, lhe succedeu na Ode X. aos bons Espritos, composta de vinte e quatro Estrophes de nove versos, e escripta, em estylo languido, e descollorido. Tenho esta Ode pela peior de todas as que elle escreveu, porque além da demasiada extenção para o assumpto, elle ali repete até á saciedade duas, ou trez idéas, variando apenas a expressão.

Não acontece porém assim com a Ode VI., que se destingue pela brevidade nervosa, e pelo fogo da expressão, que se molda bem com um canto extemporaneo.

ODE.

Gloria á Patria, honra aos teos, prazer ás Musas,
Que com amor te olharam,

Esse teo claro engenho, esse de que usas
Em louvor teo, de que se tanto honraram.

Esse teo claro esprito, e peregrino
Estilo, e suave canto,

De milhor tempo, ou milhor Terra dino,
Que em bons engenhos cria justo espanto.

Será por meravilha nomeado,

Por tudo hirá vôando,

Teo nome com louvores levantado,

Que teo tão raro verso o hirá levando.

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