uma das primeiras e essenciaes liberdades dos antigos Lusitanos era a discussão e approvação dos negocios publicos nas suas assembléas geraes, que depois denominamos, côrtes. Amor a liberdade foi o caracter dos Portuguezes. E' verdade (diz F. de Carvalho) que com as conquistas Romanas perdemos este nosso antigo direito politico; mas vendo os senhores do mundo que o povo Lusitano não largava as armas, e antes queria morrer livre do que ser escravo de Roma, procuraram a final captivar-nos com esses mesmos dons da liberdade, pela qual nunca tinhamos cessado de pelejar. Sim, captivaram-nos com essas honras e privilegios, que a sagacidade Romana sempre tinha de reserva quando lhe falhavam as armas, isto é, com os fóros de colonia e municipio; fóros, que nos faziam quasi tocar o nome de cidadãos Romanos, e ao que o mundo désse tempo dava a maior estimação. Por esta maneira conseguiram pela liberdade um dominio que nunca tinham podido conseguir pelas armas ; e assim tambem deixaram a todos os governantes futuros do brioso povo Lusitano a grande e luminosa lição, que um tal povo póde sim por annos ser privado de suas liberdades, mas não póde ser eternamente escravo de ninguem; porque cêdo ou tarde toma a heroica resolução de as recobrar. Origem das assembléas provinciaes. Na conquista (diz F. de Carvalho) dos Godose Wisigodos, tanto que ella se tornou solida e pacifica, fômos pouco a pouco voltando a nossos antigos costumes nacionaes, que mui analogos eram aos dos nossos conquistadores. Nessa época já vêmos serem os reis Godos conduzidos ao throno pelos votos das ordens distinctas do estado, e com approvação geral; e pouco depois logo achamos, que os negocios publicos entraram a ser discutidos pelas mesmas ordens distinctas do estado nessas assembléas mixtas, denominadas «< concilios nacionaes ou provinciaes. Vendo os reis Godos que nada era mais capaz de segurar os seus interesses que as decisões dos concilios, e que estes deviam ser, por consequencia, as suas cortes ou estados geraes, tiveram sempre o maior cuidado em os convocar, já de toda a nação, já de alguma provincia. Nelles confessam tanto os bispos como os reis que o motivo destas convocações, é muitas vezes, além dos interesses da igreja, o dos interesses do estado. E com effeito, isto mesmo provam os factos muito mais efficazmente que as palavras; porque ali se prescreviam as leis fundamentaes para a successão do throño, e regimento dos que a elle deviam subir; ali se confirmavam de facto as disposições e enthronisações dos reis, o se defendiam sua vida e interesses; ali se ordenava ou reformava a legislação e ali finalmente se conhecia dos crimes mais graves, e dos negocios que influiam tanto direito publico como particular. Em uma palavra, nestas assembléas mixtas assistiam tanto os bispos como os grandes da côrte (1), a quem os reis (1) Desde o concilio Tarraconense por diante, em 516, em todos os concilios, ainda provinciaes, entraram a assistir sempre alguns leigos de cada diocese. Não se deve comtudo entender que este fosse o primeiro naquella cidade. No canon 13 deste concilio é que se decidio isto, e não é provavel que a elle assistissem bispos Portuguezes. O primeiro concilio em que assistiram senhores Portuguezes parece ser o 3.o de Toledo em maio de 589, ao qual tambem foram os nossos bispos. tambem se dirigiam em suas fallas; e por fim subsereviam os decretos. se Na entrada dos Arabes muitas destas liberdades se perderam, como sempre acontece na época das conquistas ; mas apezar d'isso não morreram de todo, nem de todo se esqueceram. Nas montanhas das Asturias se salvou a arca santa da nossa alliança politica; e com o tempo della tornaram a sahir as taboas da lei, que haviam escapado ao alfange Mahometano. O mesmo já citado autor, o Snr. Antonio Caetano do Amaral, diz positivamente, na sua quarta memoria sobre o Estado da Lusitania neste ultimo periodo até ao estabelecimento da monarchia Portugueza, que a fórma do governo na monarchia dos reis das Asturias e de Leão era como se segue: « Continuam congregar para a determinação dos negocios graves congressos dos prelados e magnates, convocados, e ordinariamente presididos pelos reis (1). » Logo de tudo o que rapidamente deixamos apontado podemos por conseg uinte afoitamente concluir, que as bases do nosso direito publico e politico, desde os primeiros e primitivos tempos da nossa organisação social, foram sempre constituciona es, e nunca filhas de uma autoridade absoluta. E sendo isto assim, que Portuguez brioso haverá que possa consentir em que impunemente se lhe roube tão preciosa herança, ou que seja capaz de a trocar por uma voluntaria, e sempre abjecta servidão? Portugal independente da Hospanha e sob scus reis. Invadia a Peninsula, os adoradores do alcorão, e Hen (1) Vejam-se Memorias de Litteratura Portugueza, tom. VII, pag. 135; e o Campeão Portuguez em Londres, n. 14, pag. 35 e seguintes. rique de Borgonha (1) bisneto de Hugo Capeto, rei de França, á frente dos cavalheiros francezes, veio ajudar á Affonso IV de Castella, a defender a fé da Redempção. Affonso reconhecendo tão bondadoso serviço, assentou pagar-lhe casando-o com Thereza, filha do seu amor (1095), accrescentando ao dote tudo o que sobre a Hespanha possuissem os infieis. Portugal (Porto calo) era então occupado pelos discipulos de Mahomet, e depois de 17 victorias, que a elles ganhou Henrique de Borgonha, os expellio para longe apossou-se do territorio e se reconheceo conde de Portugal, titulo mais honorifico, naquellas éras, que o de duque. Os altos e incomprehensiveis decretos da Providencia pozeram termo ao viver de Henrique (1.o de Novembro de 1112, na idade de 77 annos), e os seus amplos projectos desceram com elle para o tumulo; porém ficandolhe um filho digno de o succeder, não tardou muito que os negocios de Portugal mudassem de face. Um rei por nome Affonso, foi na Hespanha, (1) Trinta e um tem sido o numero dos reis de Portugal que successivamente occuparam o throno: dos quaes nove pertencem á casa de Borgonha: oito ao ramo da casa de Aviz; tres foram reis de Hespanha: e onze inclusive duas senhoras que pertencem á casa de Bragança. A primeira casa começou em 1139 e acabou em 1383: a segunda acabou em 1580: a terceira em 1640: e a quarta ainda governa na pessoa da Snr. D. Pedro V. E c'um amor intrinseco accendidos Destes Henrique, dizem que segundo ; Este depois que contra o descendente (Camões). Affonso Henrique (o conquistador) 1.o rei. Affonso Henrique, herdeiro das virtudes e bravuras de seu pai, bem que sob a tutella de Thereza, achando-se em idade principiou a augmentar seus estados, e em guerra com Castella, vio-se forçado a fazer a paz, intervindo o delegado pontificio. Os sentimentos de seu pai nunca os deixava, e por isso em continuadas guerras com os in |