eleitores reconhecidos do país, dirá S. Ex.®; não conheço outros representantes da soberania organizada; mas o seu próprio argumento afirmará com invencível contradição que o espelho não reflecte a imagem. Se o Império do Brasil é uma associação política, livre e independente, o que pelo menos supõe o assentimento tácito dos associados; se todos os poderes são delegações da nação; se é no seu equilíbrio conservador dos direitos do cidadão que reside o mais seguro meio de tornar efectivas as garantias constitucionais; se pela Constituìção do Império é a massa dos cidadãos activos que deve nomear senadores e deputados para a assemblea geral; se para as reformas que alteram a constituição em sua parte essencial, é necessário procuração com especialidade de poderes; se a mesma dissolução, concedida pela lei fundamental, é a mais palpável demonstração de que a verdade e a presunção se distanciam; o nobre Presidente do Conselho há de distinguir a Nação, o eleitorado e os representantes da nação. Reduzir tôda a legitimidade do seu projecto ao voto do eleitorado, aliás indefinível na manifestação da vontade de seus eleitos, é dar ao mesmo censo uma significação cruelmente material, relembrando ao país estas palavras de um orador notável: «A lei que não reconhece o direito do cidadão senão por meio de um sinal monetário assemelha-se à fábula dos antigos que para dar entrada às almas no Elísio exigia que trouxessem um óbulo na boca.»> O recibo das colectorias pode dar entrada nos colégios eleitorais, mas não substitui a inteligência, a virtude, a capacidade e o trabalho. Suprimindo o direito de votar, a lei não suprime o direito de pensar, o direito de discutir, o direito de falar na imprensa, em uma palavra, o direito de ser o representante das massas activas da nação brasileira, quando se não é o candidato aceito pelo eleitorado censatário da lei. Nos anais parlamentares de certos povos ficou célebre a distinção entre o país real e o país legal. 10 nobre Presidente do Conselho dentro ou fora do Império, a ninguêm convencerá que 145.000 eleitores valem a Nação brasileira! (Do mesmo discurso). 1871 e 1885 (8) ... Se tudo falhasse, se neste recinto augusto, tabernáculo sagrado da inteligência, da virtude e dos talentos, não houvesse um recanto oculto para agasalhar a desgraça, como os templos antigos agasalhavam o próprio crime; se os encantamentos das alturas supremas só pudessem encontrar um éco gemebundo fora das fronteiras do Império; ainda assim, no meio de uma nação católica, como nos dias em que o princípio cristão começava a avassalar a barbaria do mundo velho, proclamando a igualdade humana; os escravos do novo Império poderiam dirigir ao governo as mesmas palavras que um jovem mártir da escravidão antiga, dirigia ao prefeito que lhe lançava em rosto sua mísera condição: «Eu sou escravo de (8) 1871 (28 de Setembro de): lei do ventre livre; 1885: projecto de libertação dos escravos sexagenários. César, e admitido por seu benefício e sua graça na comunidade da esperança de todos aqueles que vós vêdes presentes.>> As constituições são os moldes das sociedades políticas, mas teem antes de si os organismos vivos, cuja alma procura, através dos penosos trabalhos de uma gestação imensa, as alturas absolutas da justiça e da beleza eternas, como a agulha, a-pesar dos seus desvios, o polo magnético que a atrai. Este organismo prêso outrora às capitanias do velho regime, municípios e províncias de hoje, proclama ao Sr. Presidente do Conselho pelas associações, pela imprensa, pelos territórios livres dentro do Império, e até pela contrafeita resignação dos que o seguem, que o recibo do imposto não é carta de alforria e que os títulos de 5% não passam de documentos monstruosos do cativeiro de umas províncias, em proveito das outras. Se há, como pretendem os publicistas, alguma cousa que paira acima dos acontecimentos, como o profeta via o espírito de Deus acima das ondas, o nobre Presidente do Conselho há de ouvir a voz misteriosa do espírito do tempo, estendendo seus braços - incomensuráveis, como os braços gigantescos de uma cruz entre a sepultura de um morto e a glorificação de um vivo. São duas épocas que convêm aproximar — o ano de 1871 e o ano de 1885; lá entre os nevoeiros semi-transparentes do passado, o chefe conservador, salvando o berço de crianças inocentes, no meio da revolta de seus próprios amigos; aqui, o chefe liberal mandando guardar, como prisões de estado, as sepulturas abertas da liberdade sonhada. Recolher os ecos amortecidos de tanta voz que não fala para engrossar de súbito como pavoroso contraste, os hinos guerreiros dos novos batalhões da Beócia, que mudaram de uniforme, é quási um dever, ao menos para que o projecto do governo saia com a marca da origem e com o sêlo da verdade. Em 1871, depois de uma nobre tentativa frustrada em uma emenda do Senado, um chefe conservador levanta a bandeira da emancipação dos escravos no parlamento, luta instante por instante para fazê-la triunfar, rompe com os seus próprios amigos, sofre mesmo a injustiça dos seus adversários; mas leva como principal artigo de sua |