«Vindo caminhando acharam em um prado mui lhano, umas casas mui bem lavradas, e dentro uma donzella formosa de perfeitas feições, e mui certa no que fallava, o entendimento que já conhecia seu officio, não lh'o perguntou, mas d'ella alli alcançou o ponto, linea (sic) e superficie, e os modos de triangulos, equilatero, escarneron (sic) gradado e agudo, e mais a triangula, quadrangula, pentagona, asagona, (sic) figuras, até Vico e cedion (sic) que são de muitos angulos e cantos, e muitas superficies, viu o circulo em movimento dos corpos esphericos, quadrados, colunares, e piramidates (sic), e a ligeireza e tardança em seu movimento; e tudo com provas infalibles demonstrativas; soube seu principio e seus primeiros inventores, e o artificio de medir no alto, no lhano, e profundo; logo a donzella o metteu em uma camara, onde lhe mostrou a sua filha perspectiva, em que viu o entendimento a maneira de ver, e a arte dos Espelhos e oculos para grande distancia, e por que causa nas Pinturas se representa uma cousa longe e outra perto, sendo que estão iguaes á vista, e depois de visto bem tudo se partiu mui alegre d'este logar. Este manuscripto tem 349 paginas em 8.o, e termina por estas palavras : «Escripto por mi B. Godines, em Amsterdam no anno da creação 5450. A segunda parte tem o seguinte titulo: «Floresta de Vygylantes, em que reverdese o Triumfo da moralidade Espelho das Artes e Imperio das Sciencias. >> Nesta segunda parte discorre o author servindo-se por vezes de allegorias, ácerca das virtudes. III parte.-Doutrinados de Deus. Falla das sciencias e artes. N'esta parte tracta amplamente da chronologia judaica, e tem passagens interessantissimas, que sinto bem não ter tempo para transcrever. Traz tambem uma pauta dos tempos em que se ha de receber Sabat no discurso do anno, feito por o computo dos mezes solares em Amsterdam : Termina o volume com um desenvolvido kalendario judaico. Está encadernado n'este volume manuscripto um opusculo impresso, o qual julgo completamente desconhecido começando pelas seguintes palavras : Amado Filho: O muito que vos estimo, e o quanto desejo vosso bem; são os motivos de fazer-vos este Catalogo de virtudes; Antidoto do bem desta vida; E seguro para gozardeis (sic) a gloria; E assy vos pesso que estimeis e observeis as advertencias que nesta vos relato: com o que, dando honra ao Senhor Deos, vós fareis bem a vós mesmo, e me causareis contento, n'esta e na outra vida.» E termina assim: «Amsterdam a 10 de Elul. 5447.- Vosso Pay Ischak de M. Aboab.» São vinte e seis os conselhos moraes que apparecem n'este volume. «Discurso Apologetico e Compendio historico das insolencias da Companhia Anglicana em Bombaim, contra o direito irrefragavel da real corôa de Portugal no Estado da India accrescentado com outra resposta aos novos fundamentos da Companhia Anglicana apresentadas pelos seus directores ao enviado do Serenissimo Rey de Portugal. » Este manuscripto, a meu ver, é importantissimo para a Historia da introducção dos Inglezes na India, e da usurpação que a pouco e pouco foram fazendo dos territorios, que nos pertenciam. Seu auctor começa pela seguinte forma: «Escreverei summariamente os mayores insultos, a que se podia arrojar a ousadia de quatro mercadores inglezes da Companhia Oriental, os quaes acastelados na sua Ilha de Bombaim, n'ella parece intentam fabricar a metropoli de toda a costa maritima do norte: empenhando-se com particulares demonstrações de uma insolente temeridade, a atropellar todo o direito, e conquistar todo o dominio, que pertence á corôa de Portugal n'aquella marinha. Ha muitos annos se começaram a descobrir as ideias d'esta machina, com effeitos escandalosos: os quaes foram sempre crescendo á medida da nossa dissimulação, outros dizem, da nossa cobardia: porque antepôr as attenções de uma magestade extrangeira ao respeito, que devem todos os vassallos ao seu natural soberano, se não é traição manifesta, só pode ser pusilanimidade notoria. Eu não quero discutir esta questão, como alheia do meu assumpto, que só é relatar o facto dos inglezes de Bombaym, e manifestar summariamente o direito e justiça de Portugal. N'este manifesto só allegarei documentos autenticos; n'aquella relação procederei com summa verdade; como testemunha de vista de todos os successos proximos, e plenamente inteirado de todas as antecedencias mais analogas. Eis o começo (no qual tomei a liberdade de fazer algumas alterações em quanto á orthographia) d'uma obra manuscripta que me parece não dever saír do paiz. «Sou portuguez, diz ainda o auctor, e sou vassallo: como portuguez zélo as conveniencias da minha nação: como vassallo, e fiel vassallo, desejo todo o lustre á corôa do meu Rei.» «Quem escreve historias dos seculos antigos, em muitas cousas tem licença para mentir com certo privilegio, de que nenhum auctor o poderá convencer; eu não escrevo a divisão das terras, confusão de Babel, nem as viagens de Ulysses, depois da conquista de Troya, ou outros acontecimentos mais antigos, de que não haja memoria nos homens. Muito modernos são os successos d'este compendio, e tão frescos que ainda estão vertendo sangue; e por isso faço prato d'elles, nús e crús; ainda que pareçam indigestos, e sem autra tempera mais que o summo da verdade: que sempre foi muito amargosa.» Para discorrer n'esta materia com distincção e clareza, representarei todo o empenho da Companhia Anglicana coarctado e resumido a dois pontos, que são a base de toda a controversia, e o principio de todas as desordens. O primeiro é o dominio, e senhorio de todos os rios que cercam a Ilha de Bombaim, e dividem das terras fronteiras do Serenissimo Rey de Portugal; de cuja entradas e sahidas se tem apoderado os inglezes, com tanto desafogo, que não permittem passar embarcação alguma das nossas aldeas, sem chegar aos seus reductos e baluartes; pagando n'elles certa quantia, pela liberdade da passagem, ainda quando não levam outra carga, que demande novos direitos. E talvez tenham praticado a mesma violencia com alguma embarcação de guerra, menos possante, ultrajando o credito da nação e armas portuguezas. «O segundo ponto é a posse intrusa, com que se tem apode rado da Ilha de Mahzm, e da sua alfandega, o que na phrase da India chamamos vulgarmente Manduzm, cobrando n'ella por seus ministros e rendeiros os direitos de tudo, quanto produz a terra, ou vem de fóra, para a mesma Ilha.»... Este manuscripto, em magnifico estado de conservação, consta de 119 folhas não paginadas, as quaes abrangem quinze, capitulos e-Apendix necessaria (sic) No qual se responde aos novos fundamentos da Companhia Anglicana representados pelos seus directores ao enviado do Serenissimo Rey de Portugal.» Manuscriptos, como este, devem até mesmo ver a luz da publicidade quanto antes; qualquer desastre os póde consummir, e a perda é irreparavel quando não fique uma cópia fidedigna! Lembrem-se do que se tem dito contra a nacionalidade do Amadis de Gaula. Ter-se-ia proferido o mesmo, se houvesse cuidado em tirar uma cópia do codice que o terremoto de 1755 destruiu? Adagios Selectos Portuguezes, moralisados em hum soneto a cada Adagio, por Miguel do Couto Guerreiro. 2 volumes in4.-1.° 505 pag., 2.o 504 pag., encadernados em pergaminho. (A licença para a impressão tem a data de 27 de setembro de de 1790.) CENTURIA I-ADAGIO V Gato escaldado de agua fria ha medo MORALIDADE Quando o gato te furta a iguaria, Mas gato de dois pés não se desvia Frustra todo o intento quem procura O certo he na primeira, em que se apanha, Obrigallo a largar a pelle dura; Que só largando a pelle, larga a manha. ADAGIO VIII Sempre o rabo é mau de esfolar MORALIDADE Sempre os fins de trabalhos são mais cheios; Peor he, se depois de mil rodeios Este rabo digo eu, que na verdade Sujeito, que sem merito devido ADAGIO XIII Muito póde o gallo no seu poleiro MORALIDADE Ministros de justiça nas terrinhas Com pobres, que por fracos são gallinhas. Bons gallos, se elles vão lançando as linhas, |