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Quando a grande abondança foi no Egypto1.
O preso e santo moço era estimado

Tão pouco, como o pão era no Egypto.
Mas como persuadiu, por Deos guiado,
Com tempo pera a fome ainda futura,
Que fosse o mais do pão encelleirado:
Ao sonho de Pharaó deu boa soltura,

E a si mesmo e aos seus deu honra e preço,
Deu ao faminto povo grão fartura.
Camões, bem te confesso, e bem conheço,
Que entre o joio infelice e ma zizania
De tanto mão costume, e em tempo avesso,
Engenhos nascem bons na Lusitania,

E ha copia delles, que é menoscabada
Dos mãos, e nomeada por insania.
Por isso, como preso em tua pousada,

Solta este sonho, e esperta o adormecido
Tempo com tua voz bem entoada;

Qual ella é, clara e pura, em som devido,
Decente, honesto e grave, ate que chegue
Áquelle affable e real ouvido3.

Farás que estime, que honre, e que a si chegue
Os que bebem na fonte Pegasea;

Que seu favor lhes mostre, e não lho negue:
Como o bom rei da patria da Sercia✦

Aquelle inclyto Affonso, que amou tanto
Os doutos e avisados d'alta veia.

Genesis, cap. xvI. (Nota do sr. Freitas.)

? A repetição da mesma palavra na rima faz suspeitar n'este verso algum erro de copista. No MS. do sr. Seabra lêem-se estes dois versos assim: =0 santo moço era inda estimado, E qual captivo servo era prescripto talvez erro de copia por proscripto. (Nota do Editor.)

3 Na copia do sr. Freitas ha um ponto marginal n'este verso, que indica ter elle julgado haver erro ou falta, que todavia não emendou. Suppre porventura esta falta o MS. do sr. Seabra, no qual se lê: Aquelle tão affable real ouvido. (Nota do Editor.)

Imitação de Garcilasso, Elegia a Boscan, verso 37. (Nota do sr. Freitas.)

Então teu celebrado e efficaz canto

Do estreito do mar Roxo ao nosso estreito
Aos estranhos será piedade e espanto 1,

Se a ti e aos teus não for honra e proveito.

1 No MS. do sr. Seabra lê-se: =Aos estranhos pasmo causará e espanto=; lição que nos parece melhor quanto ao sentido; e bem que assim fique o verso errado, poderia corrigir-se A estranhos ou apenas escrevendo nhos, etc. (Nota do Editor.)

=

Aos 'stra

SONETO

DE D. LUIZ DE ATHAIDE

A qual perigo o rosto sem escudo
Não porei eu por vós com rosto leve?
Como não seja neste a que se deve
Mais copia, mais engenho, e mais estudo.
Ante sugeito tal, por tosco, e rudo

Contar-se pode o espirito que se atreve:
Mas quem em seu favor o vosso teve,
Não faz muito por vós se não faz tudo.
Eu tudo farei ja, não por que possa,

Mas por que vos não possa dar escusa
De vosso, de obrigado, e de sujeito:
Mas digo-vos que a culpa he, minha e vossa,
Vossa, que a tal sugeito a minha Musa;
Minha, em ver vossa Musa em tal sugeito.

SONETO

DE DIOGO BERNARDES

Quem louvará Camões que elle não seja?

Quem não vê, que cansa, em vão, engenho e arte?
Elle se louva a si só, em toda parte,

E toda parte, elle só enche d'enveja.
Quem juntos n'hum sprito ver deseja
Quantos dões, entre mil Phebo reparte
(Quer elle d'amor cante, quer de Marte),
Por mais não desejar, elle só veja.
Honrou a patria em tudo; imiga sorte
A fez com elle só ser encolhida
Em premio d'estender della a memoria.
Mas se lhe foy fortuna escassa em vida,
Não lhe pode tirar depois da morte
Hum rico emparo de sua fama e gloria.

SONETO

DE D. JOÃO DE ALMEIDA

Nesta empresa felice, que tomaste
Alta pyramide a teu nome ergueste,
E a lyra com que os orbes suspendeste,
Em circulo d'estrellas a engastaste.
Déste louvor ao mundo a quem honraste,

A Hespanha, a quem cantando engrandeceste.
Mais rica ainda c' os versos que escreveste
Que co' as Orientaes Indias que cantaste.
Do illustre Gama os feitos celebrados
Tanto de espanto tem por ti escritos,
Como tem de terror por elle obrados.
Descobridores ambos inauditos,

Elle, de mares nunca navegados,
Tu, de conceitos nunca d'outrem ditos.

SONETO

DE DIOGO TABORDA LEITÃO

Spirito, que ao Empyreo ceo voaste,
Das Musas cá na terra tão chorado,
Quanto melhor terás já lá cantado,
Do muito que tão bem cá nos cantaste?
Partiste-te de nós, sós nos deixaste,
A ser lá d'outro lauro laureado,
Differente daquelle que te hão dado
Os que cá com teus versos tanto honraste.
Lá Hymnos, Odes, Cantos mais suaves
Podes cantar na Angelica Hierarchia,
Onde essa voz de Cisne mais se apura.
Nem te podem faltar materias graves,
Em que occupes melhor a fantasia,
Qu' em fim o de cá passa, o de lá dura.

SONETO

DO LICENCIADÓ GASPAR GOMES PONTINO

Aqui da grã Minerva se descobre

O thesouro qu' os homens mais sublima,
Que quantos Phebo mostra lá de cima,
E a may d'Antheo no seo avaro encobre.
Aqui pode tirar ouro do cobre

Quem de Pallas provar a sotil lima,
E no saber que Apollo mais estima
Por arte virá a ser rico, de pobre.
Aqui da illustre Musa, e heroyca vea
Do inclyto Poeta Lusitano

Que de louvor eterno a patria arrea,
Se pode ver bem claro hum desengano,
Qu' em quanto o sol abraça, e o mar rodea
Nunca subio mais alto engenho humano.

SONETO

DE FRANCISCO LOPES

Está o pintor famoso attento e mudo
Pintando, e recebendo mil louvores,
Pello que retratou de varias cores,
Com engenho sutil, vivo e agudo.
Quem he este que falla e pinta tudo,

O ceo, a terra, o mar, o campo, as flores,
Aves, e animais, Nymphas, pastores,
Co' divino pincel do grande estudo?

O Principe será do gran Parnasso,
Ou o Grego excelente, e soberano,

Ou Torcato tambem qu' em verso canta:

E se não he Virgilio, Homero ou Tasso
E he como parece Lusitano,

He Luis de Camões, qu' o mundo espanta.

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