E a causa de seu bem reconheceram,
Causa em si grande, e grande no que manda;
Foram para fallar, emmudeceram ;
Ella os olhou, e seu tormento abranda, E como ja remedio lhes deseja, Parte a buscá-lo porque cedo o veja.
E como o caso compaixão lhe inspira, Sobr'outra natural que n'ella mora, Ao pae e rei, que os braços ja lhe abríra, Éstas palavras diz, e entre ellas chora: Se mimosa de vós me não sentíra, Não ousára tentar se o sou agora Alcançando, senhor, por magoada, Perdão para ésta gente condemnada.
que n'um tempo que ameaça Pelos mesmos Christãos guerra tam crua, É perigo que a todos embaraça
Terdes contra os de paz espada nua ; Que se a fortuna próspera os abraça, A vossa crueldade aviva a sua, E dais a imigo vencedor motivo Para a ferro metter quanto achar vivo.
Portanto, se algum mimo vos mereço, Com ésta petição a salvo saia, E se ha difficuldade, que eu conheço, A culpa sôbre mim de tudo caia.
-O pae que, inda que fôra de mor preço, (Segundo de affeição todo desmaia ) Lhe concedêra a cousa que lhe pede, Para todos perdão logo concede.
QUEVEDO, Afonso Africano.
Elle, que ja de longe larga conta D'um successo tam novo dar deseja, Assi começa em voz formada e prompta, Para que alli notorio a todos seja : Despois que da tormenta a brava affronta Passámos, quando ja falta quem reja, (Que vence a tempestade a sciencia e arte,) Démos acaso n'uma estranha parte.
Sentimos, que inda a vista estes extremos Não julga, as naus romperem pela areia, E nosso último fim quasi tememos, Fingindo alguma praia aspera e feia : Quando a cerração cega abrir-se vemos, E o vento bravo o sôpro irado enfreia; Descobre-se uma praia fresca e leda, E n'ella toda armada emproada e queda.
Eu , que não conheci a estranha terra, Dos mais practicos mestres informado
Perguntei que parage o sítio encerra, E de que gente póde ser pizado: E n'isto cadaqual se engana, e erra O que se tem por mais exprimentado; E porque a praia alegre nos convida, N'ella desembarcar ninguem duvida.
Pedro, que o mal de nossas almas cura, A quem o mor segredo descubrimos, Ou seja acaso, ou elle assi o Na poppa em alto somno ficar vimos : Nós entretanto ao longo d'agua pura, Pizando a branca areia alegres imos, Buscando um prado que assomava perto Pela cor e fragrancia descuberto.
Artificio parece da natura
A cerca que o resguarda em tudo airosa Onde pendendo a branca rosa pura Está co'a bella pudibunda rosa, Outra inda no botão cerrada dura, Para sahir a tempo mais fermosa, No qual a falta supra da vizinha, Que murcha cai entre a pungente espinha
Aqui nos detevemos por espaço, Colhendo cadaqual a que lhe agrada A custo da melhor parte do braço, Que do furto sahia lastimada:
Logo saltámos dentro; e no regaço Da floresta de verde tapisada Diversidade vimos de mil flores, No fino olor estranhas, e nas côres.
Em flor se mostra alli, por si perdido O fermoso Narciso incautamente, E por ter o castigo merecido Juncto nasce da líquida corrente; Em flor tambem Hyacinto convertido Sua historia nas folhas tem presente Amaranto em bellissima bonina, E Adonis, pena eterna da Erycina.
Dispostos per canteiros ordenados Os bellos cravos a fragrancia spiram, Todos vermelhos uns, outros mesclados, Quaes encarnados, quaes brancos se viram, As violas da côr de enamorados Quando por seu amor d'alma suspiram, A franceza hortelan, a salva verde, A cecem que tocada o cheiro perde.
Ésta fermosa e linda praderia, A quem jamais nenhuma se igualava Das que celebra Assyria, e a India cria, E o rio Hydaspes brandamente lava, Per dilatado espaço se estendia, Que n'outra gentil cêrca se acabava
« VorigeDoorgaan » |