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B73 Vil

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Em uma edição dos Lusiadas, impressa no Porto em 1869, dizia o benemerito editor: «Accrescentamos á nossa edição, intencionalmente feita para o povo, uma biographia de Camões, contendo puramente tudo quanto ha de historico na vida do poeta. O snr. Theophilo Braga extrahiu de um seu livro inedito sobre a Vida de Camões, trabalho pelo systema de Taschereau pa Vida de Molière e de Cesar Balbo na Vida de Dante, um prospecto chronologico, que ajuda á intelligencia de todas as conciliações de datas que se discutem. » (Op. cit., p. VI.) Só passado tres annos nos é possivel entregar á publicidade esse livro aí promettido, e com o qual fechamos a-Historia litteraria de Portugal no seculo XVI.

É de uma difficuldade incalculavel o escrever a vida de Camões; a necessidade de dar aos factos uma exacção historica, de explicar todos os pequenos successos que têm relação com esta grande individualidade, fez

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com que os biographos de Camões se esquecessem do individuo moral e quasi revelassem incapacidade para conhecel-o. Além d'isto, o vulto de Camões anda envolvido em um nimbo de tradições sobre as quaes inconscientemente se formou um ideal, que fascina e se impõe ao historiador, que em vez de descrever um profundo espirito da Renascença, recorta com sinceridade um typo de convenção. A quem estudar a vida de Camões, importa ter sempre em vista, que elle não foi homem de posturas esculpturaes, como nol-o pintam todos os dias os poemas, as gravuras, as estatuas e as divagações litterarias que lhe consagram. Quem o quizer vêr com ares de artista em tres quartos, falsifica este vulto, grande sómente pela sua verdade; era simples de trato, brigão, temerario, desinteressado, como portuguez bilioso-melancholico. Camões teve até nossos dias a felicidade de haver escapado ás interpretações theoricas; esmagado sob os Commentarios do seculo XVII, aformosentado pelas patrioticas phantasias do seculo XIX, é necessario um grande esforço para tornarmos a achar a natureza.

Estudamol-o aqui como elle foi, consubstanciando em um livro tudo quanto ha de positivo sobre Camões; não temos pretenções a descobertas, mas a tirar dos textos uma nova luz. Os trabalhos fundamentaes em

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quanto a documentos pertencem a Manoel de Faria e Sousa, e ao snr. Visconde de Juromenha; sem a dedicação d'estes dois solicitos investigadores pouco se poderia affirmar como indubitavel. Faltava ainda determinar a acção de Camões na Historia litteraria de Portugal; é o que agora se cumpre.

Emquanto trabalhavamos n'este corpo da Historia da Litteratura portugueza, o accidente fortuito da nossa nomeação de Professor do Curso Superior de Letras, fez rebentar secretas invejas, algumas d'ellas abafadas até áquelle dia com simulacros de amisade. Não houve phrase injuriosa que me não atirassem, iniquidade de que se não servissem; armaram o seu reducto nos esgotos da baixa imprensa, até aonde a authoridade administrativa de motu proprio teve de descer para pôr cobro a tamanha impudencia. Tempestuavam esses impotentes accéssos, e no remanso do estudo vinha surprehender-nos a adhesão ao nosso trabalho da parte de M. Gaston Paris, auctor da Histoire poétique de Charles Magne, a verdadeira introducção ás litteraturas da edade media; tambem o auctor da Historia de la Literatura española, o sabio D. José Amador de los Rios vinha pessoalmente visitar-nos, dizendo com a auctoridade dos seus annos diante dos nossos continuados esforços: Macte, generose puer! Da coragem com que

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nós e mais alguns poucos trabalhadores temos entrado n'esta lucta de renovação litteraria, escrevia Littré: « Continuez, prosperez, travaillez; que le Portugal apporte sa quote part dans l'histoire et la critique. Ce n'est pas trop des efforts de tout le monde pour faire face aux besoins de la transition intellectuelle et morale.» Imitando aquelle que diante do sophista que negava o movimento, se pôz a andar, respondemos tambem a essa geração nulla-trabalhando sempre.

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