Braço forte, de gente sublimada Não menos nos ingenhos que na espada.
Em tôrno o cérca o reino Neptunino; C'os muros naturaes per outra parte Pelo meio o divide o Apennino,
Que tam illustre fez o patrio Marte. Mas despois que o porteiro tem divino, Perdendo o esforço veio, e bellica arte: Pobre está ja da antigua potestade; Tanto Deus se contenta de humildade!
Gallia alli se verá, que nomeada C'os Cesareos triumphos foi no mundo, Que do Sequana e Rhodano é regada, E do Garumna frio e Rheno fundo : Logo os montes da nympha sepultada Pyrene se alevantam, que segundo Antiguidades contam, quando arderam, Rios de ouro e de prata então correram.
Eisaqui se descobre a nobre Hespanha, Como cabeça alli de Europa toda; Em cujo senhorio e glória estranha Muitas voltas tem dado a fatal roda: Mas nunca poderá com fôrça ou manha A fortuna inquieta pôr-lhe noda, Que lh'a não tire o esforço e ousadia Dos bellicosos peitos que em si cria,
Com Tingitania entesta, e alli parece Que quer fechar o mar Mediterrano, Onde o sabido estreito se ennobrece C'o extremo trabalho do Thebano. Com nações differentes se engrandece, Cercadas com as ondas do Oceano; Todas de tal nobreza e tal valor, Que qualquer d'ellas cuida que é melhor.
Tem o Tarragonez, que se fez claro Sujeitando Parthenope inquieta; O Navarro, as Asturias, que reparo Ja foram contra a gente Mahometa, Tem o Gallego cauto, e o grande e raro Castelhano, a quem fez o seu planeta Restituidor de Hespanha e senhor d'ella, Betis, Leão, Granada, com Castella.
Eisaqui, quasi cume da cabeça
De Europa toda, o reino Lusitano; Onde a terra se acaba e o mar começa, E onde Phebo repousa no Oceano. Este quiz o ceo justo que floreça Nas armas contra o torpe Mauritano, Deitando-o de si fóra; e la na ardente Africa estar quieto o não consente.
Ésta é a ditosa patria minha amada; Á qual se o ceo me dá que eu sem perigo
Torne com ésta empresa ja acabada, Acabe-se ésta luz alli comigo.
Ésta foi Lusitania derivada
De Luso, ou Lysa, que de Baccho antigo Filhos foram, parece, ou companheiros, E n'ella então os incolas primeiros.
་་་་་་་་་་་་་་་་་་་་་་་་་་་་ཨ་
Passada ésta tam próspera victoria, Tornado Afonso á Lusitana terra, A se lograr da paz com tanta glória, Quanta soube ganhar na dura guerra; O caso triste e digno de memoria, Que do sepulcro os homens desenterra, Aconteceu da misera e mesquinha, Que despois de ser morta foi rainha.
Tu so, tu, puro Amor, com força crua, Que os corações humanos tanto obriga, Déste causa á molesta morte sua, Como se fôra perfida inimiga.
Se dizem, fero Amor, que a sêde tua Nem com lagrymas tristes se mitiga, porque queres aspero e tyranno Tuas aras banhar em sangue humano.
Estavas, linda Ignez, posta em socêgo, De teus annos colhendo doce fruito, N'aquelle engano da alma, ledo e cego, Que a fortuna não deixa durar muito ;
Nos saúdosos campos do Mondego De teus formosos olhos nunca enxuito, Aos montes ensinando, e ás hervinhas O nome que no peito escripto tinhas.
Do teu principe alli te respondiam As lembranças que na alma lhe moravam, Que sempre ante seus olhos te traziam Quando dos teus formosos se apartavam; De noite em doces sonhos que mentiam De dia em pensamentos que voavam; E quanto emfim cuidava, e quanto via, Eram tudo memorias de alegria.
De outras bellas senhoras e princezas Os desejados thalamos engeita;
Que tudo emfim tu, puro amor, desprezas Quando um gesto suave te sujeita. Vendo éstas namoradas estranhezas O velho pae sesudo (que respeita O murmurar do povo) e a phantasia Do filho que casar-se não queria:
Tirar Ignez ao mundo determina, Por lhe tirar o filho que tem preso ; Crendo c'o sangue so da morte indina, Matar do firme amor o fogo acceso. Que furor consentiu que a espada fina, Que poude sustentar o grande pêso
« VorigeDoorgaan » |