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Na viscera patente; e em radiosas
Lettras lhe soletrei - Amor da patria.

<< Da maravilha como por incanto,
Sem receio, ou terror a contemplava,
Quasi de tal prodigio infeitiçado;

Quando estes sons, entre aspero e suave,
Mas solemnes ouvi : — « Joven ousado,
Grande empresa te coube*,- acerba glória,
De que não gozarás. Desgraças cruas
Fadam teus dias... Mas a glória ao cabo.
A patria, que foi minha, que amei sempre,
Que amo inda agora, gran' serviço aguarda
De ti. Um monumento mais duravel

Do que as moles do Egypto, erguer-lhe deves.
Pyramide será, per onde os seculos

Hão de passar de longe, e respeitosos.
Galardão, não o esperes. - Enganado
Por tredo aconselhar, ingrato hei sido,
E a quem! Maiores de meu sangue ainda
Ingratos nascerão. Tu serve a patria :
É teu destino celebrar seu nome,

Os homens não são dignos nem d'as queixas
Escutar do infeliz. Segue ao Oriente,
Salva do esquecimento essas ruinas,
Que ja meus netos de amontoar começam
Nos
campos, nos alcaçares de glória,

Compor o poema dos Lusiadas.

Preço de tanto sangue, e mais virtudes.

Um dia... - Emivão perante o excelso throno
Do Eterno me hei prostrado; irrevogavel

A sentença fatal tem de cumprir-se. -
Um dia inda virá, que envilecido,
Esquecido na terra, envergonhado

de crimes!

- Opprobrio, mágoa,

tábua unica

O nome portuguez...
Dura pena
Lhe darás tu para salvar-lhe a fama
Do naufragio. Tu so dirás aos seculos,
Aos povos, ás nações: Alli foi Lysia.
Como o encerado rolo sobre as aguas
Unico leva á praia o nome e a fama
Do perdido baixel. - -Parte. Salvá-lo!
Salvá-lo, em quanto é tempo!-Extincto... Infamia!
Extincto Portugal... Oh dor!... »-Rompeu-lhe
O derradeiro accento d'éstas vozes

Em som de pena tal, e tam tremendo,
De tam profunda mágoa, que inda agora
Nos cortados ouvidos me rimbomba.
Estremeci, olhei ; ja nada vejo :

Ou acordei, ou a visão se fóra.

<< Dir-vos-ei que serena a mente e placida,
Que as ideias distinctas conservava,
Não como é d'uso ao despertar d'um sonho?
Fe me não prestareis: mas em minha alma
Tam claramente li como um reflexo

De inspiração maior

que

humana cousa,

Que sem hesitar mais, sem um momento
De incerto duvidar, assentei firme

No

presuposto de seguir meu fado, E ás descubertas plagas do Oriente Ir demandar essa escondida sorte, Esse feito, essa glória promettida De engrandecer o ninho meu paterno. Uma so cousa. - Confessá-lo é força, dizê-lo peje que

Mas

acobardava

A tenção resoluta. Ir mar em fóra

A terras la tam longes, e deixá-la,

Deixá-la... e sem esp'ranças, nem aomenos
De inda a tornar a ver!... Sabeis quem digo;
Poupae-me a dor de proferir seu nome.
Dura, e ferida n'alma se travavam
Batalha amor, e patria. Amor vencia
Quasi... Não triumphou... »

-

<< Com pensamentos taes sahi do templo: Escondia-se o sol d'alêm dos montes

Da outra margem do Tejo : alva e sem lume Parecia no azul dos ceos serenos

Infante a lua, como um arco eburneo,

Que ao numen, que n'esse astro afiguraram,
Deram antigos vates. Mais sereno,

Mais bello pôr de sol jamais o hei visto
Nos desvairados climas decorridos

Em minha incerta vida. Ao longo vinha
Da solitaria praia respirando

A fresca viração, que mal das aguas
Leve encrespava a superficie apenas :
Uma voz me chamou, voz que em meu peito
Ouve inda o coração-voz doce e meiga,
Que nunca mais... Oh! nunca mais na terra
Escutarei dos vivos... - volvo o rosto.
De baixa gelosia me acenava

Com um candido veo mais nivea e candida,
Formosa e breve mão. Fluctuando ao vento
O veo cahiu, e a dextra desparece.
Ergui-o palpitando: um nó o atava,
E verde fio de ligeira seda *

Fecha um bilhete; abri-o, li: - «<Roubado
Foi este instante a barbaros tutores.
Insensatos! vigia mais do que elles
Amor, que póde tudo. A minha glória,
Pu-la em teu coração; minha ventura,
Minha vida, o meu ser de ti confio.
Parte é força partir... - Ausencia dura,
Separação cruel so póde unir-nos.

Sai a frota ámanhan: vai alistar-te :
Campo no Oriente a grandes feitos se abre.
Volta com nome tal, que tudo vença.
Eu vivirei de lagrymas... - Embora.
Matar-me-hão saudades... - Não, não hão-de.
Ver-me-ás ainda; um anjo hontem m'o disse

* Era esse o modo de fechar as cartas n'aquelle tempo.

N'um sonho tam feliz! - Era eu vestida
De riquissimas galas; e alva c'roa
De rosas me toucava : tu a um lado,
Triste não sei porquê: outros de lucto;
Não me admirou, que nosso amor não querem.
E o anjo assim me disse. E mais, que um dia
Tamanho se fará teu nome e glória,

Que encha o universo.-Vai: adeus!... Terrivel,
Amargo adeus é este... Não importa.
Parte... e jamais te esqueças... >>

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-

Uma lagryma

quente ainda

A senti no papel... Mudo e sem vida
Horas longas fiquei parado, estatico,
No coração a carta, os olhos fitos
Na avara gelosia. Alta ia a noute;
Agua acima passava uma falua:
Bradei, accodem, a Lisboa volto,
E ao outro dia, na maré da tarde,
Da poppa d'um galeão via fugindo
O Tejo, as suas ribas deliciosas,
Depois a terra; - alfim o ceo e as aguas
Sos com minhas tristezas me ficáram.

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« Annos sette vaguei de terra em terra, Ora vendo essas ilhas, onde aquece Eterno fogo desusada fòrça,

* Molucas.

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