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Que no novo Hemifpherio refplandece
Dando do fegundo axe certa prova;

Eis a noite.com nuvées fe efcurece;
Do ar fubitamente foge o dia

E todo o largo Oceano fe embravece.
A machina do Mundo parecia,
Que em tormentas fe vinha desfazendo1;
Em ferras todo o mar fe convertia.

Lutando Boreas fero, e Noto horrendo,
Sonoras tempeftades levantavam,
Dasinaos as velas concavas rompendo.
As cordas co o ruido affoviavam
Os marinheiros, já defefperados,
Com gritos para o Ceo o ar coalhavam.
Os raios por Vulcano fabricados

Vibrava o fero, e afpero Tonante,
Tremendo os Polos ambos de affombrados.
Amor alli, moftrando-fe poffante

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E que por algum medo rao fugia,
Mas quanto mais trabalho mais conftante;
Vendo a morte prefente, em mi dizia :
Se algum'hora, Senhora, vos lembraffe
Nada do que paffei me lembraria.

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Em fim, nunca houve coufa qize mudaffe
O firme amor intrinfeco de aquelle,
Em quem alguma vez de fifo entrafle.

Huma coufa, Senhor, por certa affelle,
Que nunca amor fe affina, nem fe apura,
Em quanto eftá prefente a caufa delle.

Defta arte me chegou minha ventura A efta defejada, e longa terra,

I

De

De todo pobre honrado fepultura.

Vi quanta vaidade em nós fe encerra

E nos proprios quao, pouca, contra quem
Foi logo neceffario termos guerra.

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Huma Ilha que o Rei de Porcá tem, obo. d E que o Rei da Pimenta lhe tomara, Fomos tomar-lha, e fuccedeo-nos: bem. Com huma grofla armada, que juntara O Vifo-Rei, de Goa nos partimos

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of muci Com toda a gente de armas que fe achára vero? E com pouco trabalho deftruimos

A gente no curvo arco exercitada joe

Com morte, com incendios os punimośzi sau 20
Era a Ilha com aguas alagada,n and
De modo que fe andava em alma dias
Em fim, outra Veneză trasladada.

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Nella nos detivemos fós dous dias,
Que foram para alguus os derradeiros,
Pois paffaram de Eftyge as ondas frias.
Que eftes fao os remedios verdadeiros
Que para a vida eftao apparelhados
Aos que a querem ter por cavalleiros.
Oh Lavradores bemaventutados!
Se conheceffem feu contentamento
Como vivem no campo focegados

Dá-lher a jufta terra o mantimento;
Dá-lhes a fonte clara da agua pura,
Mungem fuas ovelhas cento a cento.
Não vem o mar irado a noite efcura,
Por ir bufcar a pedra do Oriente;
Nao temem o fùror da guerra dura.

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Vive hum com fuas arvores contente
Sem lhe quebrar o fomno repoufado
A grão cobiça de ouro reluzente.

Se lhe falta o veftido perfumado,
E da formofa côr de Affyria tinto
E dos torçaes Attalicos lavrado:

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Senao tem as delicias de Corinto,
E fe de Pario os marmores lhe faltam
O pyropo, a esmeralda, e o jacinto :

Se fuas cafas, de ouro nao fe efmaltam,
Efmalta-fe-lhe o campo de mil flores
Onde os cabritos feus comendo faltam.

Alli lhe mostra o campo várias cores;
Vem-fe os ramos pender coo fructo ameno
Alli fe affina o canto dos Paftorés.

Alli cantara Tityro, e Sileno :
Em fim, por eftas partes caminhon".
A sáa juftiça para o Ceo fereno.^.
Ditofo feja aquelle que alcançou
Poder viver na doce companhia
Das manfas ovelhinhas que criou.
Efte, bem facilmente alcançaria
As caufas naturaes de toda coufa;
Como fe géra a chuva, e neve fria:
Os trabalhos do Sol, que nao repoufa;
E porque nos dá a Lua a luz alhèa,

Se tolher-nos de Phebo os raios oufa:
E como teó depreffa o Ceo rodêa;
E como hum fó os outros traz comfigo;
E fe he benigna ou dura Cytheréa.

Bem mal póde entender ifto que digo

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;

Quem

Quem ha de andar feguindo o fero Marte
Que fempre os olhos traz em feu perigo.
Porém feja, Senhor, de qualquer arte
Pois poftoque a fortuna poffa tanto,
Que tao longe de todo o bem me aparte;
Nao poderá apartar meu duro canto
Defta obrigação fua, em quanto a morte
Me nao entrega ao duro Radamanto;
Se para triftes ha tao léda forte.

A

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Quella que de amor defcomedido
Por o formelo moço fe perdeo

Que fó por fi de amores foi perdido:

Defpois que a deofa em pedra a converted, De feu humano gefto verdadeiro:

A ultima voz fó lhe concedeo...

Affi meu mal do proprio fer primeiro,
Outra coufa nenhuma me confente,
Que efte canto que efcrevo derradeiro.
E fe huma pouca vida eftando aufente
Me deixa amor, he porque o penfamento
Sinta a perda do bem de eftar prefente.

Senhor, fe vos efpanta o foffrimento
Que tenho em tanto mal para efcrevê-lo,
Furto efte breve espaço a meu tormento.
Porque quem tem poder para foffrê-lo,
Sem fe acabar a vida, co' o cuidado
Tambem terá poder para dizê-lo.

Nem eu efcrevo hum mal já acoftumado;

Mas na alma minha trifte, e fandofa
A faudade efcreve, e eu traslado.
Ando gastando a vida trabalhofa,
E efparzindo a contínua foidade
Ao longo de huma praia foidofa.
Vejo do mar a inftabilidade
Como com feu ruido impetuofo
Retumba na maior concavidade.

De furibundas ondas poderofo,
Na terra, a feu pezar, eftá tomando
Lugar em que fe eftenda cavernofo.

Ella, como mais fraca, the está dando
As concavas entranhas, onde efteja
Sempre com fom profundo fufpirando.

A todas eftas coufas tenho inveja Tamanha, que nao fei determinar-me, Por mais determinado que me veja.

Se quero em tanto mal defefperar-me, Nao poffo, porque amor, e faudade, Nem licença me dao para matar-me

i

A vezes cuido em mi, fe a novidade, E eftranheza das coufas, co' a mudança, Poderiam mudar huma vontade.

A

E com ifto figuro na lembrança
A nova terra, o novo trato humano,
A eftrangeira progenie, a estranha ufança.
Subo-me ao monte que Hercules Thebanor
Do altiffimo Calpe dividio,

Dando caminho ao mar Mediterrano.
De alli efbon tanteando, adonde vio.
O pomar das Hefperidas matando

f

A

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