INTERLOCUTORES. DO PROLOGO. O MORDOMO, OU DONO DA CASA. AMBROSIO, Escudeiro. DA COMEDI A. ELREI SELEUCO. A RAINHA ESTRATONICA. O PRINCIPE ANTIOCHO. LEOCADIO, Pagem do Principe Antiocho. FROLALTA, Criada da Rainha Estratonica. HUM PORTEIRO DA CANA. HUMA MOÇA DA CAMARA. HUM PHYSICO, ou MEDICO. SANCHO, Moço do Physico. ALEXANDRE DA FONSECA, hum dos Musicos. ELREI SELEUGO. COMEDIA. PROLOGO. Diz logo o Mordomo, ou Dono da Casa. Eis, Senhores, o Autor, por me honrar nesta festival noite, me quiz representar huma Farça; e diz, que por não se encontrar com outras ja feitas, buscou huns novos fundamentos para a quem tiver hum juizo assi arrazoado satisfazer. E diz que quem se della não contentar, querendo outros novos acontecimentos, que se vá aos soalheiros dos Escudeiros da Castanheira, ou de Alhos Vedros e Barreiro, ou converse na Rua Nova em casa do Boticario; e não lhe faltará que conte. Porém diz o Autor que usou nesta obra da maneira de Isopete. Ora quanto á obra, se não parecer bem a todos, o Autor diz que entende della menos que todos os que lha puderem emendar. Todavia, isto he para praguentos: aos quaes diz que responde com hum dito de hum Philosopho, que diz: Vós outros estudastes para praguejar, e eu para desprezar praguentos? Eu com tudo quero saber da Farça, em que ponto vai. Lançarote? Senhor. Moço. MORDOMO. São ja chegadas as figuras? Moço. Chegadas são ellas quasi ao fim de sua vida. Como assi? couce. MORDOMO. Moço. Porque foi a gente tanta, que não ficou capa com friza, nem talão de çapato, que não sahisse fóra do Ora vierão huns embuçadetes, e quizerão entrar por força; ei-lo arrancamento na mão: derão huma pedrada na cabeça ao Anjo, e rasgárão huma meia calça ao Ermitão; e agora diz o Anjo que não ha de entrar, até lhe não darem huma cabeça nova, nem o Ermitão até lhe não pôrem huma estopada na calça. Este pantufo se perdeo alli; mande-o v. m. Domingo apregoar nos pulpitos; que não quero nada do alheio. MORDOMO. Se elle föra outra peça de mais valia, tu botáras a consciencia pela porta fóra, para o metteres em tua casa. Moço. Oh! se o elle fôra, mais consciencia sería torná-lo a seu dono, quem o havia mister para si. MORDOMO. Ora vem cả: vai daqui a casa de Martim Chinchorro, e dize-lhe que temos cá Auto com grande fogueira; que se venha sua mercê para cá, e que traga comsigo o Senhor Romão d'Alvarenga, para que sôbre o Canto-chão botemos nosso contraponto de zombaria. Ouves, Lançarote? ir-lhe-has abrir a porta do quintal, porque mudemos o vinte aos que cuidão de entrar por força. Indo-se o Moço diz: Chichelo de Judeo, assi como foste pantufo, que te custava ser huma bolsa com hum par de reales, que são bons para Escudeiro hypocrita; que são pouco, e valem muito ? MORDOMO. Moço. Senhor, estou tardando, e porém estou cuidando que se agora fòra aquelle tempo, em que corrião as moedas dos sambarcos, sempre deste tiraria para humas palmilhas. Mas ja que assi he, diga-me v. m. que farei deste? MORDOMO. Oh fideputa bargante! esperae, que est'outro vo-lo dira. que lhe atira com outro pantufo; vai-se o Moço, diz Mordomo: Não ha mais mao conselho, que ter hum villão destes mimoso, porque logo passão o pé além da mão, e zombão assi da gravidade de seu amo. Mas tornando ao que importa; vossas mercês he necessario que se cheguem huns para os outros, para darem lugar aos outros Senhores que hão de vir; que de outra maneira, se todo o corro se ha de gastar em Canões III, 17 palanques, será bom mandar fazer outro alvalade; e mais, que me hão de fazer mercê, que se hão de desembuçar, porque eu não sei quem me quer bem, nem quem me quer mal: este só desgôsto tee hum Auto, que he como officio de Alcaide; ou haveis deixar entrar a todos, ou vos hão de ter por villão ruim. Entra Martim Chinchorro, fallando com o Escudeiro Ambrosio, e diz: Entre v. m. MARTIM. AMBROSIO. Dias ha, Senhor, que ando de quebras com cortezias; e por isso vou diante. Beijo as mãos a v. m. A verdade he esta, passear em casa juncada, fogueira com castanhas, mesa posta com alcatifa e cartas; além disto Auto para esgaravatar os dentes: esta he a vida, de que se ha de fazer consciencia. MORDOMO. Senhor, o descanso dizem lá, que se ha de ter em quanto homem puder, porque os trabalhos, sem os chamarem, de seu se vem por seu pé, que seu nome he. MARTIM. Ora pois, Senhor, o Auto que tal dizem que he? Porque hum Auto enfadonho traz mais somno comsigo que huma prégação comprida. MORDOMO. Senhor, por bom mo vendêrão, e eu o tomei á cala de sua boa fama. E se tal he, eu acho que, por outra parte, não ha tal vida, como ouvir hum villão, que arranca a falla da garganta, mais sem sabor que |