D. Vasco da Gama, com a sua pouco numerosa armada, largou do porto de Lisboa, a caminho da India, en 8 de julho de 1497. Dobrou o Cabo da Boa Esperança a 22 de novembro do mesmo anno. Chegou a Calecut a 20 de maio de 1498. Regressou a Lisboa, decorridos 25 mezes e 21 dias, em 29 de agosto de 1499. A primeira data não offerece duvida. As divergencias sobre a 'segunda e terceira datas, ainda erradas em alguns escriptos contemporaneos, parecem resolvidas pelo Roteiro da viagem de 1497, correcto e augmentado na sua segunda edição por Alexandre Herculano e o barão de Castello de Paiva (1). Quanto á quarta data está definitivamente averiguada por José da Silva Mendes Leal Junior (2). Assentes estes pontos cardinaes do grande facto historico, parece conviria descrever os innumeros incidentes de tão arrojada como trabalhosa viagem. Entro, porem, na duvida de que eu com isso realisasse trabalho util, ainda quando forças tivesse para arcar com tão alto commettimento. Haverá que dizer melhor, ou mesmo igual a quanto se tem escripto desde os Lusiadas do divi () Veja Alexandre Herculano. (*) Veja Mendes Leal Junior. no Camões, e o Gama e o Oriente, de José Agostinho de Macedo, até ao poema Camões do sublime Garrett? O que poderá ainda antepor-se aos chronistas e historiadores, que tem explorado tão precioso manancial? De que serviria por ultimo um confronto com posteriores e ainda recentes publicações de mimosos escriptores? Sob estas considerações, o trabalho que eu julgo dever realisar mais acceitavel, é publicar, em excerptos ou resumos, por mais não poder ser, producções alheias, já em portuguez, já em outros idiomas, algumas intimamente relacionadas com o grande facto commemorado, outras a elle allusivas. E, justificando o titulo da publicação, deliberei adornal a com algumas joias litterarias, nem sempre alheias ao assumpto principal d'ella, e que por seu merito e raridade muito dignas me parecem de vulgarisação. Para desviar a minima idéa de selecção ou precedencia, colleccionei os diversos escriptos em ordem alphabetica (até onde me foi possivel), por nomes de seus illustres authores, aos quaes desde já tenho a honra de ceder a palavra. Elogio de D. Vasco da Gama (1524) Emquanto durar a fama J. Rodrig. de Sá. Trov. das Geraç. D. Vasco da Gama, 1.° conde da Vidigueira, Descobridor, 6.° governador e 1.° vice-rei da India, e Almirante dos Mares do Oriente, por seu animo intrepido e singularissimo valor, merece lugar mui distincto entre os heroes Portuguezes. Era do melhor do reino por sangue, e bom serviço de seus maiores, como filho de Estevam da Gama, alcaide mór de Sines e Silves, commendador do Seixal, criado do Infante D. Fernando, pai d'El-Rei D. Manoel, e algum tempo veador da caza do Principe D. Affonso, filho d'El-Rei D. João I. Sua mãe se chamava D. Izabel Sodré, filha de João de Rezende, Provedor das Vallas de Santarem. Pelo pai era neto de Vasco da Gama, escudeiro da caza d'El-Rei D. João II, e bisneto d'Estevam Vaz da Gama, natural de Olivença, alcaide mór de Sines, e Gentilhomem da Camara d'El-rei D. Affonso V, o qual entendem alguns Genealogicos ser descendente de Alvaro Eannes, cavalleiro honrado, que no tempo d'El-Rei D. Affonso II serviu na conquista do Algarve, cujo filho João Alvaro, que viveu no reinado de D. Diniz, e se achou com El-Rei D. Affonso IV na batalha do Salado, foi o primeiro que tomou o appellido de Gama. Na idade de 28 annos o escolheu El-Rei D. Manoel para lhe commetter o descobrimento da India, que de longo tempo trazia occupados os animos dos Portuguezes, e tinha já custado muito trabalho e despeza; e mandando-o chamar a Estremoz o nomeou Capitão-mór da armada de quatro velas grossas, que com este intento mandára esquipar, lembrando-se que para esta empreza, o havia já destinado El Rei D. João II, e por ser, como refere Pedro de Mariz, curiosissimo da arte maritima e tão douto e diligente n'ella, que podia competir no entendimento, e cuidado de suas cousas, com os mais experimentados pilotos da Europa. Prestes as nãos, e recebidas as instrucções precisas, sahiu D. Vasco da Gama do porto de Belem em 8 de julho de 1497, acompanhado de seu irmão Paulo da Gama, e seguindo sua viagem, depois de varios e arriscados trances favorecendo a Providencia seus intentos, dobrou aquelle tormentoso Cabo, não tanto de boa, quanto de louca esperança, pelo pouco que corresponderam ás nossas fadigas os fructos das riquezas, que o Oriente promettia; e discorrendo pelo Reino de Moçambique, Mombaça, e Melinde, aportou em Calecut, cidade do Malabar, e a mais rica de toda a India, a 20 de maio de 1499, havendo onze mezes depois da sua partida. Passados mais de dois annos e quasi dois mezes chegou a Lisboa a 29 d'agosto, trazendo sómente cincoenta homens de cento e setenta, que levára |