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uma ou outra corda, porque no fim de tantas harmorias as cordas não comportam tensão tanto tempo prolongada e lá vem descendo alguma, e certo é o desafinar.

O cantor que nos faz ouvir harmonias melodiosas e arrebatadoras por muito tempo, lå lhe vae por fim falseando uma ou outra nota e acaba por enrouquecer, ainda que seja Duprez, Ronconi e Taquinardi, traduzindo as melodias arrebatadoras de Porpora, Paesiello, ou Cimarrosa. Em summa, o soffrer intimo tem arcanos impenetraveis. Respeito aos segredos d'um coração que se estorce em dôres intimas. Silencio sobre o Livro Negro.

O poeta, emfim, póde fazer calar aos curisos e maldizentes com aquelles bellos versos do suavissimo Castilho

«Ao sem ventura, que entender meu canto,
«Meu canto e minhas lagrimas envio.>>

Macahé-15 de Setembão de 1860.

J. M. VELHO DA SILVA.

DOUS GENIOS E UM SÓ DESTINO

ALVARES DE AZEVEDO E CASIMIRO DE ABREU

I

O viajor que contempla a queda dos imperios tendo diante de seus olhos as ruinas d'essas mesmas nacionalidades, não póde entristecer-se mais do que o 'espirito humano folheando as paginas de livros, que são outros tantos legados que deixam á posteridade, vultos cujos nomes são immortaes padrões de gloria.

O Brazil, paiz novo e cujos passos na carreira das letras são ainda muito lentos, já tem comtudo visto perecer muitos filhos illustres, uns chorando no exilio a familia de que para sempre se achavam separados, outros exhalando no seio d'ella seus ultimos suspiros, tornando talvez mais acerba a sua đôr, e outros que se não morrem physicamente perdem a existencia moral, descrendo d'uma sociedade que caminha cegamente para o abysmo das ambições e interesses. D'entre esses vultos envolvidos hoje nas lages do sepulchro, dous ha que desejamos, ainda que momentaneamente, fitar em suas frontes augustas, nossos olhos timidos e escurecidos pela descrença. São elles, Alvares d'Azevedo e Casimiro d'Abreu.

II

O primeiro, é o cysne da poesia byronica personificada n'um homem fraco e em cujo peito a paixão devorava uma alma pura. Amou no idealismo, o que na realidade não achou quem lhe recompensasse. O enthusiasmo de sua intelligencial subia ao palacio para descer å taverna mais insignificante. Percorreu todo o mundo feminino, e não encontrou um só peito que entendesse o seu; era que elle não nascera para a terra! Só encontrou beijos vendidos da messalina das ruas,

ou peitos frios de mulheres que não o comprehendiam. Então foi poeta; escreveu, e escreveu em dous volumes, o que muitos talentos não escreveriam em vinte. Cantou essa Noite na Taverna, tão cheia de poesia, e onde o espirito do leitor recua de horror em cada pagina que lê. Seu espirito percorria o mundo inteiro; via as mulheres mais bellas da Italia em torno de si, em quanto sua penna percorria com velocidade o papel, onde escrevia não tudo, porém parte de seus sublimes pensamentos.

Leu muito, e quando em Byron apreciava essa melancholia e descrença do cantor do Child-Harold, regosijava-se de achar um peito igual ao seu.

Depois d'esta lucta entre a paixão e o indifferentismo que encontrava, descreu; e a dôr d'esta terrivel molestia em breve o sepultou nas frias lages do tumulo onde repousa tranquillo das lides da vida humana. Repousa, oh poeta ! que foi longo o teu soffrer sobre a terra!

III

Agora, uma vista d'olhos sobre o cantor das Primaveras. Cheio de crença e possuidor d'um verdadeiro talento, Casimiro d'Abreu foi um d'estes genios que parecem ter nascido poetas. Espirito de melancholica tristeza, porém forte e altivo, conservou-se puro até o instante de fechar os olhos. Nunca penetrou n'esses lodaçaes, que pervertem a mocidade, e sua alma virgem, só tinha sanctas ambições. Apaixonado e cheio de fé, julgou sempre que o mundo o comprehendera e nunca o beijo immundo do scepticismo lhe manchou a fronte. Entretanto, elle soffria e muito, e quem quizer certificar-se leia o seu Livro Negro, que faz parte de suas bellas Primaveras, e ahi verão os suspiros tristes e melancholicos do poeta sertanejo. Entretanto, a descarnada e negra mão da morte ceifou para sempre de nós esse genio, cuja morte tantas lagrimas arrancou áquelles que o conheceram ! E porque, meu Deus, não haverá uma lei da natureza que immortalise a existencia na terra d'esses genios tão bellos? Necessariamente porque a terra não os merece, e elles vão no seio do Senhor fruir uma existencia a que tem jus!

IV

E eis ahi dous filhos illustres que o Brazil hoje chora, cu

os corpos ennegrecidos pelo pó da tumba, apenas se reconhecem como cadaveres! E eis dous vultos que se somem do campo da intelligencia, porque a mão da morte esgotou o sangue do enthusiasmo, que lhes circulava nas veias, porque absorveu as lavas da intelligencia, que seus craneos expandiam, porque apertou seus peitos debeis com seus braços de ferro, e no auge de seu furor arrancou a vida de dous genios illustres, riscando seus nomes immortaes da lista dos viventes!...

Rio de Janeiro-10 de janeiro de 1861.

W.

E

CASIMIRO DE ABREU

Da republica das letras desappareceu um tão joven quanto denodado combatente.

A perda foi por demais sensivel!

Não lamentam seus companheiros sómente o passamento d'um irmão d'armas, tambem sentem a perda d'um amigo fiel e dedicado.

Por isso o chefe da republica, d'accordo com os membros do conselho superior das letras, expediu as precisas ordens para que o nome e os feitos do companheiro que pranteiam, ficassem gravados na memoria da geração presente e na dos vindouros, e que, para se pagar uma divida de gratidão, lhe fosse erguido um monumento.

O nome d'esse guerreiro?

Casimiro d'Abreu.

Seus feitos?

As producções em prosa e em verso impressas separadamente, e As flores das suas Primaveras reunidas n'um volume de poesias.

Qual será o monumento?

As suas composições ineditas offerecidas a um amigo, a biographia do finado cantor e todas as noticias sobre o seu passamento.

Ainda bem que cedo se pretende solver tão magnanimo compromisso!

Rendemos hoje um tributo de veneração aos manes de Casimiro d'Abreu. Esse tributo não é só em remuneração ROS serviços que ás letras prestou o fallecido cantor das Primaveras, mas tambem pelo espirito de classe, pois que elle sobejamente illustrou a corporação commercial á qual perten

cera.

Pertencendo os fundadores e sustentadores d'este jornal em sua quasi totalidade ao commercio, e desejando desenvol

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