Mas tu porque tão cedo desesperas, Deixando dos teus labios, inda ardentes Amargura correr?
Tu, mimoso cantor das Primaveras, Do Livro Negro as paginas descrentes Porque foste escrever?
Ah! não vás, meu poeta dos amores, Manchar a c'rôa á virgem da poesia, Que tão pura te amou!
Não te illudam do Goethe os esplendores, Que esse deus da sublime zombaria O coração matou !
Inspira-te do céo da patria tua
Ante o qual ninguem ha que não se incline Pela manhã gentil;
Canta a aurora ao nascer, à noite a lua, E assim darás tambem um Lamartine Ás musas do Brazil!
Poeta ! Crê no amor das almas puras, Canta a patria, o futuro, a liberdade, O puro amor e Deus!
Eu te antevejo a aurora das venturas, E o teu Brazil, com as palmas da amizade C'roando os cantos teus!
...Ver o pobre mancebo Em quem a seiva reluz, No sonho candido e puro, Nas glorias do seu futuro, Dourando a vida de luz, De crenças, de amor, de fè, Vel-o finar-se tão cedo, Como as vozes d'um segredo... E' dor de mais-pois não é?!..
Aquella pallida fronte,
Ardente como um vulcão,
Em que um brilhante horisonte Sorria de inspiração;
Cuja musa, em meigos cantos, Sorrindo ou vertendo prantos, Sempre cantando, encantava; -Pallida agora, mas fria, Não mais desprende a harmonia Que no seu antro encerrava!
Que é d'elle, o joven cantor, Astro brazileo a surgir,
Que entre os seus cantos de amor
Fazia amores sentir?...
Que é d'elle, o joven amante,
Que do seu berço distante, No verdor da mocidade,
Vendo outro céo, outras flôres, Não lhes achava primores Por ter da patria saudade ?...
Viram-no as margens do Tejo Murmurar hymnos de amor, Á patria mandando um beijo Com dedicado fervor! Que puro amor terno e santo Revela aquelle seu canto A sua mãe, relembrando A falta d'essas caricias, Que eram as suas delicias No patrio ninho habitando!...
Tambem as margens do Douro Viram-no triste, a gemer, Dizendo na lyra d'ouro: «Brazileiro hei de morrer. »> Só vendo ao longe a belleza, Primores da natureza,
Encantos a mil e mil,
Que em longas, remotas eras Quiz marcar nas-Primaveras Eternas no seu Brazil.
Quem é que ao pranto resiste, Seja poeta ou não seja, Ouvindo-Minh'alma e triste; Que o Livro Negro reveja?... Parece que o soffrimento, Funesto presentimento
D'amargor the enchia o peito!... Cantava...mas que cantar! Era um bardo a suspirar, Sempre em lagrimas desfeito!
Era a canção do exilado, Que tristes mágoas encerra, Soltando um ecco abafado Que sôa de serra em serra! Elle era o nauta nos mares, Procurando os patrios lares Cos torvos olhos saudosos; E ao rouco gemer do vento Unindo um triste lamento Entre suspiros queixosos!...
Que terno amor! que poesia Na mente lhe borbulhava Quando a saudade e harmonia Do sabiá recordava!... D'esse cantor das palmeiras, Que nas matas brazileiras Modula os ternos queixumes. Que fogo de amor intenso, Cantando o Brazil immenso, Cercado de mil perfumes!...
Que coração de poeta (Livre das loucas orgias), Que em musa casta e discreta, Batia, ao som de harmonias!... Que brandas, sentidas queixas Ao som de ternas endeixas Revelando os seus amores!.... Que bella esp'rança perdida, N'esse futuro da vida
Do outomno, com seus primores!...
E tudo tombou—cahiu
Da praça ao tufão medonho, Que no sepulchro sumiu Tão bello arbusto risonho!... Esse tufão, que tão cedo A Dutra, Amaro e Azevedo Na primavera cortou, Sedento de atroz furor, Ao fluminense cantor Na terra em furia lançou.
E quatro lustros sómente, Cheios de vida e fulgor, Perderam seu brilho ardente Na campa, em gelido horror!... Que verde esp'rança murchada! Que flôr tão bella, esmagada, Hoje sem brilho e sem côr!... Que galardão tão subido, Que de futuro perdido Nesse brazileo cantor!...
Só d'elle resta a lembrança, Que mudamente suspira Accorde, mas sem esp'rança, Nos tristes eccos da lyra! Chora a familia saudosa, Chora a musa lacrimosa, Chora o Brazil, que o perdeu, Chorará quem n'outras eras Lêr com mágoa as Primaveras De-Casimiro de Abreu.
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