Quebrando a lousa do feral jazigo, Portugal resurgiu, vingando a affronta, Einda hoje ao mundo sua gloria aponta Dos cantos de Camões no eterno brado; Mas do vate immortal as frias cinzas Esquecidas deixou na sepultura,
E o estrangeiro que passa em vão procura Seu tumulo ignorado.
Nenhuma pedra ou inscripção ligeira Recorda o grão cantor... porem calemos! Silencio! do immortal não profanemos Com tributos mortaes a alta memoria. Camões, grande Camões, foste poeta! Eu sei que tua sombra nos perdoa: Que valem mausoléus ante a coroa De tua eterna gloria?
Poesias por A. A. Soares de Passos. 1858-pag. 1.
Sumiu-se o Sol esplendido Nas vagas rumorosas! Em trevas o crepusculo Foi desfolhando as rosas! Pela ampla terra alarga-se Calada solidão!
Parece o mundo um tumulo Sob estrellado manto! Alabastrina lampada, Lá sóbe a Lua! Emtanto Gemidos d'aves lugubres Soando a espaços vão!
Hora dos melancolicos Saudosos devaneios!
Hora, que aos gostos intimos
Abres os castos seios!
Infunde em nossos animos:
Inspirações da Félk De noite, se um revérbero De Deus nos alumia, Distilla-se de lagrimas A prece, a prophecia! Alma enlevada em extasis Terrena já não é!
Antes que o somno tacito Olhos nos cerre, e os sonhos Nos tomem no seu vortice, Já rindo, e já medonhos, Hora dos Ceus, conversa-me No extincto e no porvir.. Onde os que amei? sumiram-se, Onde o que eu fui? deixou-me. Delles, só vans memorias; De mim só resta um nome, No abysmo do preterito Desfez-se choro e rir.
Desfez-se! e quantas lagrimas Brotaram de alegrias! Desfez-se! e quantos jubilos Nasceram de agonias! Teu curso, ó Providencia, Quem n'o previu jamais? Que horas d'est'hora tacita Me irão desabrochando? Quantos não fez cadaveres N'um leito o somno brando! Vir-me-hão co'a-aurora proxima... As saudações? os ais?
Se o penso, tremo, aterro-me. Porém, se ao Pae Supremo
Remonto o meu espirito,
Exulto; já não tremo,
A alma lhe dou; reclino-me
No somno sem pavor.
Chama-me? ascendo á patria;
Poupa-me? aspiro a ella.
Servir-te! ou vér-te, e amarmo-nos!
Que sorte, ó Deus, tão bella! Vem! cerra as minhas palpebras, Virgem do casto amor!u
Estrêas Poeticas-musicaes para o anno LIII. Por Antonio Feliciano de Castilho, Lisboa, 1853-pag. 24.
Que alvor?! que amar?! que musica, Nos Ceus, em mim, no ar,
A festa da existencia
Me vem resuscitar?!
Nasco a cantar com os passaros! Surjo a brilhar co'a luz!
Envolta em rosas candidas, Ledo retomo a cruz!
Fonte do Ser! Espirito!.
Mysterio! Creador!
Eis-me! saí d'um tumulo,
Como da terra a flor.
Eis-me! eu te escuto! emprega-me!
Senhor, que vou fazer?!
«Ama» bradou voz intima,
«Amar cifra o dever.»
No regaço do luxo, a opulencia Os cansaços do ocio maldiz; Entre as lidas, sorri a indigencia; Co'o pão negro se julga feliz.
Trabalhar, meus irmãos; que o trabalho É riqueza, é virtude, é vigor.
D'entre a orchestra da serra e do malho Brotam vida, cidades, amor.
Deus, impondo ao peccado, a fadiga, Té na pena sorriu paternal; O que vence a preguiça inimiga, Reconquista o Edén terreal.
Trabalhar, meus irmãos; etc.
Quem dá graças aos Ceus ao Sol posto? Quem lh'as dá vendo a aurora raiar? E o obreiro: o suor lhe enche o rosto; Mas seus dias não turva o pezar.
Trabalhar, meus irmãos; etc.
O que vive na inercia aborrida, Não sómente é d'irmãos roubador; É suicida; e mais vil que o suïcida É suicida a quem falta o valor.
Trabalhar meus irmãos; etc.
Cáia opprobrio no vil ocioso, Que desherda o presente, e o porvir! Só á noite compete o repouso; Só aos mortos o eterno dormir.
Trabalhar, meus irmãos; etc.
Mar e Terra, Ar e Céu, tudo lida; Deus a todos pôz luz e deu mãos; Lei suprema o trabalho é na vida; Trabalhar! trabalhar, meus irmãos !
Trabalhar, meus irmãos, que o trabalho É riqueza, é virtude, é vigor.
D'entre a orchestra da serra e do malho Brotam vida, cidades, amor.
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