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na Coroa d'estes Reinos e Senhorios, houvemos por mui necessario entender sobre o governo da Justiça, que não menos que as Armas faz vencer, pela concordia e assocego, que se d'ella segue: polo qual vendo Nós, que depois da recopilação dos cinco Livros das Ordenações, que ElRei Dom Manoel, meu Senhor e Avô, de gloriosa memoria, mandou fazer, se fizeram novamente outras muitas Leis pelos Senhores Reis nossos antecessores e per Nós, as quaes andavam de fóra dos dictos cinco Livros espalhadas, em modo que os Julgadores não tinham d'ellas noticia, do que se seguia ás partes grande prejuizo, e em algumas havia diversos entendimentos, e per outras não era provído a muitos casos, que occorriam: Querendo a isso prover, determinamos com pessoas do nosso Conselho e Desembargo reformar as ditas Ordenações, e fazer nova recopilação, de maneira que de todos, assi dos Letrados, como dos que o não são se possam bem entender: a qual obra bem examinada e emendada, reduzida em cinco Livros, mandámos imprimir e publicar e a approvamos e confirmamos, e queremos que em todos nossos Reinos e Senhorios se guardem e practiquem, e valham para sempre, e per as ditas Leis se julguem e decidam todos os casos, que occorrerem: para o que revogamos e annullamos quaesquer outras Ordenações e Leis, postoque fossem stabelecidas e ordenadas em Cortes, que atéqui forem feitas, que fóra d'esta recopilação se acharem, salvo as que andarem scriptas em um livro, que stará na Casa da Supplicação, que por serem sobre cousas, que se podem revogar e mudar pelos tempos, mandámos que se não incorporassem nestes cinco Livros das Ordenações, as quaes Leis separadas queremos que se guardem, como se nellas contém; e resalvando outrosi as Ordenações da nossa Fazenda, e dos Artigos das Sisas, que andam fóra dos cinco Livros, porque as taes Ordenações se guardarão inteiramente. Dada em Madrid a cinco dias do mez de Junho. Thomé de Andrada a fez, anno do Nascimento de nosso Senhor Jesu CHRISTO de mil e quinhentos e noventa e cinco.

REI.

PRIMEIRO LIVRO

DAS

ORDENACÕES

TITULO I

Do Regedor da Casa da Supplicação

Como a Casa da Supplicação seja o maior Tribunal da Justiça de nossos Reinos, e em que as causas de maior importancia se vem a apurar e decidir, deve o Regedor della ter as qualidades, que para cargo de tanta confiança e auctoridade se requerem. Pelo que se deve sempre procurar, que seja homem Fidalgo, de limpo sangue, de sãa consciencia, prudente, e de muita auctoridade, e letrado, se for possivel: e sobre tudo tão inteiro, que sem respeito de amor, odio, ou perturbação outra do animo possa a todos guardar justiça igualmente. E assi deve ser abastado de bens temporaes, que sua particular necessidade não seja causa de em alguma cousa perverter a inteireza e constancia, com que nos deve servir. Isso mesmo deve o Regedor ser nosso natural, para que como bom e leal deseje o serviço de nossa pessoa e stado. E assi deve temperar a severidade, que seu cargo pede, com paciencia e brandura no ouvir as partes, que os homens de baxo stado, e pessoas miseraveis achem nelle facil e gracioso acolhimento, com que sem pejo o vejam, e lhe requeiram sua justiça, para que suas causas se não percam ao desamparo, mas hajam bom e breve despacho. E para que o Regedor, que hora he, e qualquer que pelo tempo for, possa melhor cumprir com sua obrigação e nosso serviço,

deve ter sempre ante os olhos nossas Ordenações, e especialmente este seu Regimento, e sempre viva a lembrança do grande cargo, que delle confiamos, para assi ser mais attento e sollicito no que deve fazer, e desencarregar nossa consciencia e a sua, e com seu exemplo incitar aos outros Officiaes a nos bem servirem.

1 Tanto que o Regedor for provido do Officio, antes que comece servir, ou faça cousa alguma, que a elle pertença, lhe será dado juramento pelo Chanceller Mór em nossa presença, naquella fórma que se contém no livro da Relação, em que stá scripto, e ao pé do juramento assinará o Regedor com os que se acharem presentes, como testemunhas do tal acto.

2 O Regedor, todos os dias que não forem feriados, pela manhãa virá á Relação, e fará vir os Desembargadores cedo, por quanto o desembargo das feitos ha de durar quatro horas inteiras ao menos, passadas pelo relogio de area, que será posto na mesa, onde c Regedor stá: O qual tempo se não gastará em practicas, ou occupações outras, não necessarias ao acto, em que stão.

3 0 Regedor elegerá hum Sacerdote, que todos os dias pela manhã diga Missa no Oratorio da Relação, antes de se começar o despacho. 4 Acabada a Missa, os Desembargadores entrarão logo em despacho; e tanto que entrarem, não consentirá o Regedor, que se levantem das mesas, em que stiverem, para outra alguma parte, salvo por tal necessidade, que se não possa excusar. A qual sendo passada, se tornarão logo a seus assentos e desembargos, de maneira que se não possa perder tempo algum.

5 Tanto que os Desembargadores começarem de entrar em despacho, o Regedor não consentirá que algum dos Scrivñes, Guarda Mór da Relação, Porteiros, ou outros quaesquer Officiaes entrem nella, salvo quando forem chamados per campainha. E tanto que lhes for dito o para que foram chamados, se saira, e não se chegarão ás mesas, onde os Desembargadores stiverem despachando. E os Porteiros starão sempre á porta da banda de fóra, para acudirem á campainha. Nem isso mesma consentirá, que Fidalgos, ou outras pessoas, venham á Relação, salvo quando forem chamados.

6 Para despacho dos feitos, o Regedor répartirá os Desembarga dores per todas as mesas dos Officios ordenados, dando a cada mesa os que lhe bem parecer, segundo a qualidade e numero dos feitos: dando porém nos feitos crimes, em que alguma pessoa seja accusada por caso, que provado mereça morte natural, cinco Desembargadores, para com o Juiz do feito serem seis, e não menos. E não sendo os

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quatro delles conformes em condenar, ou absolver, metterá mais Desembargadores em numero igual, de modo que nunca se vença o condemnar, ou absolver, ou remetter as ordens, ou outro qualquer caso, em que se houver de por no feito sentença deffinitiva, ou interlocutoria, que tenha força de difinitiva, senão per mais dous votos. ao menos. E como quatro Desembargadores forem concordes, logo se porá desembargo, e se assinará, e dará à execução. E para mais breve despacho, havemos por bem, que parecendo ao Juiz do feito pelo allegado e provado nelle, que o réo stá em absolvição, ou em condenação, que não exceda cinco annos de degredo, possa pôr o feito com dous Desembargadores, para com elle serem tres. E sendo todos tres conformes em absolvição, ou em pena, que não passe de cinco annos de degredo, se porá sentença. E sendo differentes, dará o Regedor outro Desembargador, ou Desembargadores, em modo que sejam tres em um acordo, e conforme a elle se porá a sentença.

7 E mandamos, que nos outros feitos, que em Relação se houverem de despachar, sempre faça por dar os Desembargadores em numero desigual, assi como tres, cinco, sete. E nos feitos crimes, onde não se mereceria morte, posto que provados fossem, o Juiz do feito o poderá despachar com outro Desembargador, para com elle serem dous; e sendo ambos conformes, sé porá a sentença, e não o sendo, o Regedor dará outro Desembargador, ou Desembargadores, e como forem dous conformes, se porá a sentença, e se dará a execução.

8 E quando seis Desembargadores forem em algum feito de morte, e quatro delles forem em voto de condenar, posto que differentes nas condenações, e dous em absolver, ponha-se a sentença conforme aos quatro votos, que forem em condenar, reduzindo a maior condenação á menor, sem o feito ir a mais Desembargadores. E a mesma ordem se guardară, sendo todos os seis em voto de condenar, posto que differentes has condenações, reduzindo os quatro votos da maior condenação á menor dos ditos quatro votos. E a mesma concordia se terá nos votos dos outros feitos, que per menos Desembargadores houverem de ser despachados.

9 E sendo caso que os Desembargadores das mesas sejam de votos differentes, de tal maneira que se não possa pôr desembargo, o Regedor fará ajunctar com elles outros, que vejam o feito, sobre que for a differença e o que a maior parte delles juntos acordar, se cumpra. E quando em algum feito, visto per todos os Desembargadores, que presentes forem. as vozes forem iguaes, o Regedor dará sua voz, e a parte, a que se acostar, prevalecerá, e segundo ella se porá a sen

tença, e assinarão, sem postilla, nem outra declaração, per que se possa saber quaes foram em outro parecer; o que não haverá lugar nos feitos, que se despacharem per tenções scriptas nelles, porque nas taes sentenças assinarão sómente os que forem no parecer, per que a sentença foi vencida, e não os outros; porém poderão pôr junto aos seus sinaes: PRO VOTO, se em suas tenções não forem em todo conformes à sentença, mas sómente em alguma parte.

10 E se o Regedor vir alguns feitos arduos, assi civeis, como crimes, que em Relação se houverem de despachar, e sentir que ha nelles algumas taes dúvidas, que lhe pareça bem ajuntar mais Desembargadores, que os ordenados ao despacho dos taes feitos, fará ajuntar aquelles, que suspeitos não forem, e lhe parecerem necessarios, e com elles se desembarguem os ditos feitos, e isto fará, cada vez que necessario lhe parecer. Porém se o despacho do feito pender sobre embargos a algum desembargo, ou sentença, não metterá outros Desembargadores no despacho, senão os que foram no primeiro desembargo, ou sentença. E se lhe parecer que alguns dos ditos Desembargadores são suspeitos de tal suspeição, que a parte a não possa provar, ou por outra razão, que o mova a nol-o fazer saber, então fará sobrestar no despacho, e nos informará da razão, por que lhe pareceu que se devem metter mais Desembargadores no despacho dos ditos embargos, para Nós nisso provermos como nos bem parecer.

11 E quando no despacho de alguns feitos, que perante Nós se despacharem em Relação, forem alguns Desembargadores do Paço, e as partes vierem com embargos à sentença, ou despacho, o Regedor dará em lugar d'elles outros Desembargadores da Casa, que dos ditos embargos couheçam.

12 E não consentirá que feito algum dos que mandamos desembargar em Relação, seja despachado, ou visto pelas casas dos Desembargadores, ou fóra da Relação, mas sómente pelo Juiz que for do feito, o qual depois de o ter visto, o levará á Relação, para ahi o despachar segundo seu Regimento. E provando-se que foi despachado pelas casas, ou fóra da Relação, ainda que o despacho seja posto nella, a tal sentença, ou despacho seja nullo, e alem disso o Regedor lho stranhará segundo a qualidade do caso requerer. Porém sendo os feitos primeiro vistos em Relação, se algum Desembargador, por não star bastantemente instruido, os quizer levar para os ver em sua casa, podel-o-ha fazer com licença do Regedor. Os quaes tornará trazer á Relação em um breve termo, que lhe o Regedor assinará, e em outra maneira não.

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