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Os hollandezes, ao retirar-se, abandonaram nas praias do Camossi as reliquias dos seus indios auxiliares; mas estes vingaram-se cruelmente deste indigno tractamento, surprehendendo diversos presidios do Ceará e entregando-os ás forças portuguezas, depois de passarem á espada as respectivas guarnições. Assim terminou o dominio hollandez no Maranhão, como havia começado-por um acto de má fé e de perfidia e depois de haver durado mais de vinte sete mezes, dezesete dos quaes se haviam passado em uma guerra incessante e implacavel.1

no Maranhão. E' impossivel pois que ficassem mil e quinbentos mortos, e ainda se fossem embora trezentos ou perto de quinhentos.

1 Veja-se nota A no fim do volume.

LIVRO IV.

PARALLELO DAS INVASÕES FRANCEZA E HOLLANDEZA.

Á quem estuda a historia do Maranhão, e compara as duas invasões estrangeiras, que logo nos seus começos se succederam uma á outra com tam pequeno intervallo, não é possivel que escape o pronunciado antagonismo do caracter, fins, meios e resultados de ambas ellas.

A physionomia da invasão hollandeza é toda militar; a guerra com todo o seu cortejo de horrores, aggravados pelas paixões ruins dos conquistadores, eis ahi o unico quadro que temos a observar nesse periodo fatal de vinte sete mezes que vae de 25 de novembro de 1642 a 28 de fevereiro de 1644.

Em plena paz, e abusando da fraqueza de um povo imbelle e desarmado, não menos que das irresoluções de um velho septuagenario, esses soldados-merca

Jornal de Timon-N 6-7-8-9--10.

dores, por um acto de perfidia sem igual, surprehendem a nascente cidade de S. Luiz, e logo assignalam a sua presença, pelas profanações e sacrilegios, pelos saques e contribuições forçadas, pelos attentados e ultrages emfim á honra e liberdade dos pacificos e descuidados habitantes. E mal paga ainda desses actos de violencia que infelizmente deshonravam então a maior parte das guerras, já de si odiosas e crueis, a sua cobiça infrene e insaciavel decreta a desapropriação dos engenhos de assucar, e juntando ao roubo a humilhação e o escarneo, transforma os proprietarios despojados em feitores, e os obriga a cultivar em proveito alheio, uma terra que haviam desbastado com suas mãos, e regado com o suor de seu rosto.

Quando mais tarde o excesso da oppressão, exasperando os animos, produziu a sublevação; as devastações, incendios, matanças e supplicios são o unico espectaculo que offerece a historia da occupação hollandeza.

As tentativas dos francezes para se estabelecerem quer no Rio de Janeiro, quer no Maranhão, se mallograram successivamente, já pela debilidade dos meios que empregava a metropole, já pelos azares da guerra e incapacidade dos chefes; ou já finalmente pelas divisões e discordias que entre elles rebentavam, e valeram a Villegaignon o cognome odioso de Cain do Novo-Mundo. Os seus estabelecimentos nunca chegaram a criar raizes, e nem passaram

jámais de alguns fortes com meia duzia de casas derredor. Os hollandezes, muito ao revez disto, invadiram o Brasil com esquadras formidaveis, e muitos mil homens de desembarque, e senhorearam mais de trezentas leguas de costa desde Pernambuco até o Maranhão, perdurando o seu dominio cerca de um quarto de seculo. E não obstante foram expulsos do paiz, pelos proprios récursos dos colonos seus habitadores, a quem em geral a metropole ou abandonou de todo, ou ajudou mui frouxamente.

Suspeitam muitos que os escriptores portuguezes, obcecados pelo seu odio contra estrangeiros, calumniaram os hollandezes. Não duvidamos que exagerassem, e carregassem as côres do quadro, mas o certo é que tanto Berredo que narra as atrocidades da segunda invasão, como sobretudo Diogo de Campos que combateu em pessoa contra os francezes, tractam a estes com singular benevolencia. Donde se hade concluir, á vista do resultado que acabamos de assignalar, que as mais das arguições feitas aos hollandezes são veridicas, no essencial, nem é possivel explicar o grandioso esforço dos colonos que sacodiram o seu jugo, a não ser pela pressão de um governo iniquo e insupportavel,

De resto, não são os escriptores portuguezes somente, mas os mesmos estranhos que formam este conceito dos hollandezes; e senão, ouçamos a Fernão Denis, que segue elle mesmo a Pedro Moreau, testemunha ocular do que narra na sua-Relução verda

deira do que aconteceu na guerra feita no Brasil entre os portuguezes o hollandezes.

-«Elevado D. João IV ao throno em 1640, (escreve «Fernão Deniz) e restaurada a nacionalidade portu«gueza, ficou entre ambas as potencias assentado que «desde então partilhariam ellas em boa paz o immenso «territorio do Brasil. Mas para que este acordo po«desse vingar, fôra preciso mudar as idéas religiosas «dos dous povos, não menos que o seu caracter na«cional; porquanto talvez nunca houvesse duas nações «mais avessas em costumes e sympathias, que os por<tuguezes e hollandezes. Cada dia suscitava um novo «motivo de odio; hoje procuravam os conquistadores cinsinuar no espirito dos escravos e dos indigenas as «doutrinas do lutheranismo, e proporcionavam aos «judeus uma opulencia, insultante para a miseria dos «christãos; amanhã obstavam a que o pastor catholico «desempenhasse as funcções do seu sagrado ministe«rio, e o forçavam, para esse fim, a acolher-se aos «<bosques, onde nem sempre podiam acompanha-lo «as suas ovelhas da cidade. Eram continuas as extor«ções e pilhagens nas habitações indefesas e isola«das, e não muito raras, sanguinolentas orgias, em «<que os conquistadores calcavam aos pés todas as cidéas de honra e religião, tam poderosas entre os «portuguezes. O luxo insolente dos novos habitantes «do Recife, contrastava da maneira mais odiosa com «a simplicidade dos primeiros colonos. «Em todos «esses signaes (diz uma testemunha ocular, que traça

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