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parthos, tendo sido para nós incomparavelmente mais pesada e casperrima a liberdade dos germanos que o poderío absoluto de «Arsace. Porque emfim, com que nos dá de rosto o Oriente,

não ser com a morte de Crasso, quando elle mesmo perdeu ⚫um de seus monarchas, e foi humilhado por Ventidio? Ao passo que a Germania, alem de Carbão, Scauro, Servilio Cæpião e Manlio, mortos ou rendidos, devorou cinco exercitos consu<lares ao povo romano, e Varo com tres legiões a Augusto; não «sendo por outra parte muito a salvo que conseguiram derrotar os seus bellicosos filhos, Mario na Italia, Julio Cesar nas Gallias, Druso, Nero e Germanico nos seus proprios lares. Mais «tarde, os formidaveis aprestos de Caio Cesar, dispararam em uma ridicula fanfarronada. Dahi por diante obtivemos algum socego,até que convidados os Barbaros pelas nossas discordias e guerras civis, e expugnados os quarteis das legiões, vieram. «acommetter as mesmas Gallias, donde foram expulsos, sendo «que nestes ultimos tempos, foi mais facil alardea-los triumphados, que vence-los devéras. »

Instituido este breve parallelo entre os selvagens antigos e modernos, façamos uma aproximação mais ligeira ainda, entre dous dos escriptores que narraram as suas guerras e costumes, Berredo e Tacito.

Tractando o primeiro das guerras, inveteradas e destruidoras, que uns com os outros traziam os indios, diz que esses odios funestos assentavam as mais das vezes em causas tam leves, que se deviam tractar como ridiculas, a não se attribuirem antes a um favor especial da Providencia, porque, unidas as tribus nestas regiões, seria certa a ruina da christandade.

Tacito pela sua parte escreveu o seguinte: «Aqui se achavam outr'ora os bruteros; mas hoje conta-se que os chamavos e os angrivarios, unidos com as demais nações, os expelliram e cacabaram de todo, ou movidos do odio da sua soberba, ou do amor da pilhagem, ou finalmente, de algum influxo e favor dos deuses, benignos para comnosco, os quaes nem ao menos nos

invejaram o espectaculo do combate, em que, sem intervir «com as nossas armas, podemos contemplar sessenta mil homens que se degolavam á nossa vista, e como para recrear«nos. Possa eternamente durar, em falta de affeição para com«nosco, este odio que as nações se consagram umas as outras!

Porque estranha coincidencia, os preceitos da charidade christã, e a moral da philosophia antiga, levaram o chronista catholico, e o grande historiador pagão, a formar os mesmos votos impios e sanguinarios contra os seus inimigos, buscando ambos palliar as proprias paixões e interesses com os suppostos mentidos designios da divindade? O' misera especie humana !

Nota F-pag. 247.

Foi nossa primeira intenção dar em uma nota a substancia das diversas leis promulgadas acerca de indios; mas depois resolvemos apresentar esse trabalho em livro distincto.

Nota G-pag. 406.

O P. João Daniel, no seu-Thesouro descoberto no maximo rio Amazonas-que publicou em diversos numeros da Revista do Instituto-Historico, assevera que o P. Alagridão converteu e domesticou os taes barbados. Domuit, non ferro, sed ligno.

Que este ou outros padres tractassem com indios ditos barbados, é cousa que não queremos pôr em duvida; mas o que está ainda por averiguar é se elles com effeito tinham barbas, e descendiam dos problematicos perós.

Dizemos problematicos, não sem algum fundamento. Conta-se

que no naufragio de Ayres da Cunha, entre alguns portuguezes que se salvaram na ilha do Medo, havia um de nome Pero, ferreiro de seu officio, o qual fabricando dos pregos e mais peças do navio alguma ferramenta, adquiriu certa influencia entre os naturaes do paiz, onde casou; estendendo-se dahi o nome que tinha não só aos seus descendentes, como a todos os brancos.

Contra isto está o seguinte facto. A mesma denominação de Perós, applicada aos europeus, encontrou já Hans-Stade em 1550, entre os tupinambás de S. Vicente. Ora, é pelo menos pouco provavel que uma anedocta ou caso particular succedido no Maranhão em 1535 (epocha do naufragio de Ayres da Cunha) fosse occasião de generalisar-se um nome a tantos centos de leguas, apenas quinze annos mais tarde, seguindo daqui para S. Vicente, contra a torrente da emigração dos indigenas, que era então do sul para o norte. Accresce que os indigenas que aqui demoravam no tempo de Ayres da Cunha, eram de outra raça, diversa da tupica.

Fr. Domingos Teixeira, que na Vida de Gomes Freire de Andrada refere a mesma anecdota do naufragio, alliança dos portuguezes com os tapuyas, e descendencia dos barbados, diz que os naufragos se acolheram, não á ilha do Medo (em verdade inhabitavel) mas na ponta de terra fronteira, onde hoje se venera a Rainha dos Anjos, sob a invocação da Senhora da Guia, em uma ermida construida sobre cimentos de outra fabrica, de que ainda se mostram vestigios, com mais indicio que certeza de antiga fortificação. Para melhor intelligencia desta passagem, hade saber-se que o livro de Fr. Domingos Teixeira foi impresso em 1727; e que o general Gomes Freire de Andrada governou o Maranhão de 1685 a 1687.

Simão Estacio da Silveira, que veio ao Maranhão em 1618, isto é, logo depois de ser elle restaurado do dominio francez, escreve na sua-Relação Summaria-«que a gente que escapou da armada de Ayres da Cunha, depois de fazerem na ilha de

«S. Luiz, onde agora se chama boqueirão, uma fortaleza, de que <ainda ali estão alguns vestigios, em que se vêm pedras brancas das de Alcantara, os consumiu o tempo, ou alguma desordem com o gentio, na comarca de entre o rio Monim, e o rio Itapu«curú, que em tudo é differente do outro gentio da terra, porque <vivem em sobrados, comem pão de milho zaburre, não usam «da farinha da mandioca, nem de arco e frechas, e por divisa «criam barbas como os portuguezes, e por isso os circumvisi«nhos lhes chamam barbados........Tem umas espadas como chachas, e umas zagayas de remeço com que são temidos e valentes, e dizem que são descendentes de brancos, a que «elles chamam peros, parece por memoria de algum pero nota<vel, de que conservam aquelles nomes; é comtudo gentio tam barbaro ou mais que outro; e porém não quizeram nunca paz <nem tracto com os francezes, dizendo que elles não eram ver«dadeiros peros. E quando souberam que os portuguezes es<tavam no Maranhão, tractaram de os vir ver, e fazer pazes «com elles, e diziam que estes eram os seus peros desejados, de <que elles eram descendentes; e pelo menos, serão filhos das indias, e de alguns brancos, que os houveram antes de se consumirem nesta conquista.»

Vá que seja. Mas a phrase dubitativa com que Simão Estacio termina esta noticia, inclina a crer que elle nada viu dos taes barbados, e apenas refere o que tambem lhe referiram.

Estes taes barbados eram indios salteadores ferocissimos, a que os nossos antepassados, chamavam de corso. Muitas expedições se fizeram contra elles pelo Itapucurú acima; e até o presente nada temos achado, nem na chronica de Berredo, nem nos antigos registos do senado da camara, cousa alguma que indique essa origem commum, e menos ainda essa benevolencia que Simão Estacio attribue a semelhantes barbaros.

Das amazonas já sabem os leitores assaz o que pensar. Dos Pés-virados conta-se que os paes de pequenos lh'os affeiçoavam para traz. Quanto a gigantes, e pygmeus, devem de ser

exagerações provocadas ao aspecto de indios, cuja estatura sahia um pouco fóra das proporções communs, se não é puro invento de imaginações romanescas, ou de escriptores pouco escrupulosos.

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VOL. II.

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