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melhor obreiro monumento.

para The levantar mais perduravel e acabado

A certeza porém de que este nosso trabalho poderia offerecer algum interesse pela novidade de alguns documentos até hoje occultos, e a lembrança de que fariamos algum serviço á litteratura portugueza se com elles aclarassemos algumas particularidades da vida do Poeta, nos deu afouteza para o publicar, aproveitando ao mesmo tempo este ensejo para darmos tambem o nosso contingente de conjecturas, de que tem de compor-se em parte as biographias do Poeta.

E na verdade muito para lastimar que a maior parte dos seus contemporaneos, e entre estes especialmente Manuel Correia e Diogo do Couto, guardem um tão reprehensivel e ingrato silencio sobre o illustre Poeta seu contemporaneo. Os Commentarios do primeiro nem preenchem litterariamente a expectação do que se esperava do correspondente de Justo Lipsio, nem satisfazem a curiosidade publica pelas noticias que havia direito a exigir de um homem que tratou de tão perto o nosso Poeta, e a quem elle mesmo havia instigado a imprimir o seu Commentario. O Tasso foi mais feliz com o seu Manso, pois não se póde ser mais laconico com as noticias que o commentador portuguez deixou do seu amigo, podendo-as subministrar interessantissimas, especialmente da publicação dos seus Lusiadas e dos últimos tempos da sua vida, pois era Cura na mesma freguezia onde residiam seus paes. Ainda assim aquellas poucas que nos deixou as reputámos interessantes, e as aproveitámos para desembrulhar as confusas asserções sobre a perseguição que dizem que o Poeta experimentou na India, e que tão confusamente têem tratado quasi todos os biographos.

Diogo do Couto foi, como elle diz, o companheiro, mata

1 Não posso explicar o laconismo de Diogo do Couto relativamente a Camões, senão porque se dispunha a dar-nos a biographia completa do Poeta nos Commentarios que escreveu aos Lusiadas; eis tudo quanto nos diz na Decada VIII sobre o Poeta :

Em Moçambique achamos aquelle Principe dos Poetas do seu tempo, meo matalote e amigo Luis de Camões, tão pobre que comia de amigos, e para se embarcar para o Reino lhe ajuntamos os amigos toda a roupa que houve mister, e não faltou quem lhe desse de comer, e aquelle inverno que esteve em Moçambique acabou de aperfeiçoar as suas Lusiadas para as imprimir, e foy

lote e amigo de Camões na India; comtudo, sendo ás vezes tão minucioso em narrar as acções de homens vulgares, nada nos diz nas suas Decadas dos feitos militares praticados pelo Poeta nos dezeseis annos que militou na Asia, dando-nos apenas informação, na Decada vin, do estado de miseria e abandono em que o foi encontrar em Moçambique, do seu regresso para o reino, e da perda do seu Parnaso, reservando-se sem duvida para nos dar noticias mais circumstanciadas nos Commentarios que escreveu sobre os seus Lusiadas.

Pedro de Mariz, Guarda-mór da Bibliotheca da Universidade de Coimbra, escreveu as noticias que precedem o Commento do Licenciado Manuel Correia, que saíu a publico no anno de 1613, em demasia escassas comtudo para quem escrevia tão proximo do tempo em que floresceu o Poeta, de quem devia ser ainda contemporaneo, pois quatorze annos depois da sua morte, isto é, no de 1594, já publicava pela imprensa os seus Dialogos de Varia Historia. Este escriptor, em rasão da sua naturalidade e relações, era o mais apto para nos dar conta do tempo da frequencia do Poeta na Universidade. de Coimbra, onde não só, em rasão do emprego que exercia, poderia extractar a certidão da sua matricula e formatura, mas ainda haver outras noticias de seu proprio pae Antonio de Mariz, que na mesma Universidade exercitava o officio de impressor. Estes documentos biographicos se procuraram a pedido nosso em Coimbra, mas não se poderam já en

contrar.

Manuel Severim de Faria, pouco tempo depois, no anno de 1624, publicou uma nova biographia, escripta com melhor critica; mas é forçoso notar-lhe a mesma pouca diligencia

escrevendo muito em hum livro que hia fasendo que intitulava Parnasso de Luis de Camões, livro de muita erudição, doutrina e filosofia, o qual lhe furtarão, e nunca pude saber no Reino delle, por muito que o inqueri, e foi furto notavel, e em Portugal morreo este excellente Poeta em pura pobreza. »

2 Consta-nos que no Archivo da Universidade de Coimbra existem matriculas muito antigas que vão ao tempo da trasladação e registos das formaturas; porém tendo-se ali procurado a do nosso Poeta não se encontrou: parece-me que a publicação d'estes, por ordem chronologica, seriam documentos preciosos para a Bio-bibliographia Nacional. Devem tambem existir no mesmo Archivo theses impressas antigas, pois umas tivemos nas mãos relativas ao anno de 1549: tambem a sua publicação seria bastante interessante para a historia litteraria da Universidade.

nas investigações, em tempo ainda para se fazerem tão opportuno. O seu principal merecimento consiste em ter-se aproveitado das poesias de Camões para derivar a sua biographia, e addiciona-la com alguns novos factos e melhor critica. Podia, principalmente sobre o melhoramento da sepultura, dizer-nos mais alguma çousa, quando estava ainda viva na lembrança de todos a memoria do pequeno tributo de amisade que ás cinzas do amigo consagrára D. Gonçalo Coutinho; porém nem ao menos a visitou, e por isso, fiando-se em Pedro de Mariz, errou o epitaphio, que na edição das Rythmas do anno de 1614, um anno posterior ao Commentario do Licenciado Manuel Correia, saíu correcto, seguindo comtudo o primeiro erro todos os biographos do Poeta. Admira mesmo como um escriptor estimavel, como sem duvida é Manuel Severim de Faria, e que bastante explorou as noticias patrias, se contentou com tão pouco. Poucas esperanças se podem conceber, aindaque appareçam as notas que tinha escripto sobre os Lusiadas, que estas revelem mais alguma cousa, porquanto não foram desconhecidas a Faria e Sousa, que d'ellas se teria aproveitado. Do mesmo auctor existem uns tres tomos de documentos genealogicos, extrahidos da antiga Torre do Tombo antes da sua trasladação; mas infelizmente, vindo ali apontada a familia do Poeta, as paginas onde devia tratar d'elle se encontram em branco.

Manuel de Faria e Sousa quiz preencher a lacuna que deixaram os seus antecessores, e ás suas curiosas investigações devemos muito do que sabemos da vida e escriptos do Poeta. Elle foi, conforme o juizo de um sabio portuguez, muito sagaz nas suas conjecturas, aindaque um pouco preguiçoso em desatar as difficuldades que se lhe offereciam. Ás suas indagações na Casa da India se deve o saber-se ao certo o anno do nascimento de Camose e a epocha em que se alistou para o serviço da India, e á descoberta da Egloga xv o nome da amante. Se tivesse porém solicitado da repartição competente de Goa3 a fé de officio do Poeta, documento que

3 Se os biographos que me precederam tivessem recorrido a este meio, teriamos desembrulhada à parte mais interessante da vida do Poeta, o que me parece que estava ao seu alcance, pois tenho lembrança de ver uma fé de officio

hoje não existe ou pelo menos não apparece, teriamos a descripção official de toda a sua vida militar na Asia.

E de todos sem duvida este commentador o mais interessante para se consultar, não só porque traz o que os outros já escreveram, mas pelo assiduo trabalho a que se deu em colligir noticias, tanto escriptas como tradicionaes, de pessoas que conheceram o Poeta: deve-se comtudo examinar com summa cautela, principalmente quando se enthusiasma pelo seu mestre, ou se agasta contra aquelles que reputou seus zoilos e inimigos.

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Poucos annos depois, a instancias do Conde da Vidigueira, Embaixador portuguez na côrte de París, verteu novamente para latim os Lusiadas o celebre Fr. Francisco de Santo Agostinho de Macedo, e lhe addicionou uma biographia em portuguez, que não, acrescenta novidade ao anteriormente já escripto.

Do mesmo descuido e negligencia devem ser taxados os editores e traductores coevos, ou que escreveram proximamente á morte do Poeta. O Bispo de Targa Fr. Thomé de Faria, da Ordem dos Carmelitas, que verteu os Lusiadas para latim, e publicou a traducção no anno de 1622, limitou-se a juntar ao seu trabalho algumas breves notas historicas e mythologicas; podendo comtudo ter-nos dado interessantes particularidades, porquanto tinha a provecta idade

de um militar antigo da India, tirada por um seu descendente no reinado de El-Rei D. Pedro II. A do nosso Poeta a fizemos ali procurar, de que se encarregou o Sr. Antonio Julio Taveira, que serviu na magistratura n'aquella possessão portugueza, e hoje fallecido, mas sem resultado. No Archivo da Torre do Tombo existe uma remessa feita do de Goa, mas começa no tempo dos Filippes: tenho idéa (cito de memoria) de ter lido em uma memoria escripta pelo Secretario que foi d'aquelle estado, Claudio Lagrange, que anteriormente a esta remessa tinha sido feita outra de papeis mais antigos, mas que havia a tradição que o navio em que vinham naufragára; seria bom o examinar se estarão em algum canto em alguma administração publica, e procurar com mais certeza que fim tiveram estes interessantes documentos para a historia da Asia. A sua perda nos faz sentir mais a dos Commentarios tambem perdidos de Diogo do Couto, pois sendo o fundador e Guarda-mór d'este Archivo, e tendo compulsado os seus documentos, nos daria noticia circumstanciada d'aquelles que se referiam á vida do Poeta seu amigo, e companheiro, e de cujo Poema era commentador.

O padre Fr. Francisco de Santo Agostinho de Macedo escreveu uma resumida biographia do Poeta em portuguez: pertenceu este manuscripto ao nosso bem conhecido escriptor Antonio Ribeiro dos Santos, e hoje se conserva na Bibliotheca Publica d'esta cidade. Não offerece novidade nem aponta factos novos.

de 82 annos quando publicou a sua traducção, e fôra contemporaneo e testemunha por muitos annos das acções do nosso Poeta, pois tinha nascido no anno de 1542.

Os dois traductores das versões castelhanas, que saíram ambas no anno da. morte de Camões (1580), seguiram o mesmo caminho.

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A perda de alguns Commentarios e criticas da mesma epocha e do seculo XVII se torna muito sensivel, pois dariam mais luminosa claridade a alguns factos obscuros da vida de Camões. Entre estes se podem contar os Commentarios de Diogo do Couto, que ainda no fim do seculo XVII se conservavam em Evora, os do Prior do Santo Milagre de Santarem, Luiz da Silva de Brito, os de Manuel do Valle de Moura, e as criticas de D. Francisco Rolin de Moura, Senhor da Azambuja, e de Manuel Pires de Almeida. Mas é mais que tudo para deplorar a falta da collecção das Cartas do nosso Poeta, que juntamente com as de Fernão Cardoso se conservavam na escolhida livraria do Conde de Vimieiro. que o fatal terremoto de 1755 reduziu a cinzas, collecção preciosa, e que julgo que, como as do Tasso, versavam sobre a analyse do seu Poema; parecendo incrivel que a Academia de Historia Portugueza se não apressasse a publicar pela imprensa um tão importante descobrimento litterario. Tive algumas esperanças de poder alcançar algumas d'estas Carías, por me dizer o Sr. Alexandre Herculano que na Bibliotheca Real da Ajuda existia uma collecção de Cartas d'este Fernão Cardoso; porém, indo ali, e tendo elle tido a bondade de me franquear o manuscripto, não pude encontrar nenhuma das do nosso Poeta, vindo aliás algumas de contemporaneos, como de Diogo Sigeo, pae das duas celebres senhoras Luiza e Angela Sigea. Manuel Severim de Faria as viu tambem, mas provavelmente depois da publicação da sua biographia, porque se as conhecêra antes, se teria aproveitado d'este auxilio para o seu trabalho. E possivel que tirasse copia d'ellas, que se conservaria na collecção dos seus manuscriptos; porém, como parte d'esta collecção se perdeu, poucas esperanças se podem conceber de virem a encontrar-se. Parece que estas Cartas não foram desconhecidas ao antigo traductor francez

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