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MUSEU DE ARTE CONTEMPORÂNEA

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ATA de 1911 a separação em dois Museus de Arte Antiga e de Arte Contemporânea - do velho espólio de primitivos e modernos, até ali apenas armazenados no palácio pombalino das Janelas Verdes.

O que desde então ficamos devendo aos dois homens a quem o Estado, num momento raro de lucidez, entregou a sua direcção, está-o dizendo o prestígio, já hoje europeu, pelo menos nos meios artísticos, da ordenação que José de Figueiredo imprimiu ao seu Museu, e a originalidade com que o Museu de Arte Contemporânea nos apareceu agora, transformado pelo gôsto de Columbano.

Numa colecção heterogénea, com tendências de escasso valor, dentro da exigüidade do espaço de velhas dependèncias conventuais, e com a miséria duma dotação insuficiente, o mestre fêz o milagre, tirando partido dos próprios obstáculos, de dar a cada obra o ambiente que melhor a valoriza, expondo-a, quando forte e segura, como o retrato dum Lupi, à clara iluminação das galerias, e recolhendo a arte mais discreta da aguarela e do pastel à intimidade de santuários de cripta, em que os artistas, aí mais tranqüilos e confiados, nos podem revelar as suas emoções.

Neste controvertido debate-se a direcção dum Museu compete aos críticos e historiadores de arte ou aos artistas profissionais Portugal pode dar o depoïmento interessante (e excepcionalmente feliz numa terra onde quási todos os homens estão fora do lugar que lhes compete) da solução mais judiciosa e lógica, porque confiando a Arte Antiga, que envolve problemas de crítica e cronologia, de filiação, expertise, ao seu mais eminente crítico e historiador, e a Arte Moderna ao mais alto artista do seu tempo, vê agora na obra admirável que ambos realizaram nos respectivos

Museus o mais grato fruto duma escolha inteligente e justa. O arranjo e a selecção duma colecção antiga ou moderna exigem acima de tudo uma qualidade essencial - que êstes dois homens excepcionalmente possuem-o gôsto; mas dentro das responsabilidades dum Museu Nacional, que já são grandes, as dificuldades a vencer são de ordem diversa. Na arté antiga, os problemas da identificação, da cópia e da parede surgem a cada momento, pondo a competência técnica, a erudição e a visão intuitiva do perito em jogo. Por outro lado, e pelo que respeita ao público, a perspectiva do tempo e a comunidade dos juízos criticos sôbre os velhos mestres, a magia da pátina, o encanto do passado e até o prestígio da sua valorização comercial, tudo auxilia e concorre, se não para a integral compreensão, pelo menos para a estima e admiração da arte antiga.

Com a arte contemporânea, se a sua selecção e crítica exigem menos cultura de arqueologia artística e uma competência técnica menos especial, o problema do gôsto é aqui mais delicado, exigindo um eclectismo mais largo e mais difícil, tolerante para a diversidade de concepções estéticas em conflito por vezes apaixonado, aberto a tôdas as inovações audaciosas e até às extravagâncias duma evolução em marcha. O artista que as julga, decide da sua aquisição e por fim as incorpora na história que o seu Museu tem de reflectir, há de vencer por certo relutâncias do próprio sentimento e gôsto, tanto mais fortes quanto mais caracterizada é a sua personalidade; perdoar insuficiências de métier para não omitir certo aspecto de sensibilidade e acatar os futurismos, cubismos, dadaismos, expressionismos, destrinçando o que por-ventura haja de perdurável no efémero das modas. Tem de possuir, em-fim, esta qualidade, rara entre os homens, de admirar os confrades seus contemporâneos o que tudo põe à prova, em plena gestação dolorosa da sua própria arte, a subtileza e a segurança do seu gôsto e até as próprias qualidades morais de abnegação e imparcialidade.

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É seguir e julgar da batalha em plena acção o que é, não digo mais difícil, mas pelo menos mais perigoso que criticá-la mais tarde à luz da história.

Posto isto, é oportuno preguntar talvez, agora que o nosso pri

meiro Museu de Arte Contemporânea vai reabrir, se os artistas do nosso tempo estão realmente ali representados conforme os seus méritos e por uma escolha de obras essenciais.

O direito de prioridade dos museus, nas aquisições das exposições, é uma legítima preferência de que os artistas devem ser os primeiros a louvar-se. A sua reputação duradoura basear-se há essencialmente na forma como os museus os revelarem ao público, que perde fàcilmente a memória das exposições anuais, desconhece as pequenas colecções privadas, mas guarda e revê através dos tempos o que dêles se fôr arquivando e patenteando nos museus do Estado.

' Está a arte dêstes três quartos de século a arte que abrange cêrca de quatro gerações — lisonjeira e suficientemente representada no nosso Museu Nacional?

¿ Traduz êle e revela ao amador, de dentro e fora do País, o carácter, a evolução e as tendências da arte portuguesa dos tempos modernos ?

Seria ousado afirmá-lo. E não é êste o momento próprio para desenvolver esta impressão.

Lupi, que Columbano tanto tem contribuído para valorizar, é talvez o único que o Museu vem verdadeiramente revelar com êsse assombroso retrato da mãe de Sousa Martins, obra-prima do mestre e da pintura do seu tempo, que da vizinhança dum busto de Soares dos Reis tira realce sem se ofuscar.

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Não desejaria que destas notas, essencialmente destinadas a saudar a reabertura do Museu de Arte Contemporânea e a obra do seu ilustre Director, ressaltasse a impressão de que, fazendo justiça ao artista, lhe atribuo responsabilidades na representação dos nossos artistas contemporâneos. ¿Como pensá-lo se Columbano é logo a primeira vítima dêste mal, — embora seja incapaz de dar por isto, absorvido como se acha na obra colectiva do Museu, e se a causa é a exigua dotação de que o Museu dispõe para as oportunidades que se lhe oferecem de aquisições mais valiosas? O mestre ainda há pouco nos confiava a sua mais recente desolação de ver perder-se para o Museu uma bela obra de Silva Pôrto, que a miséria duma dotação irrisória o obrigou a recusar.

A incultura geral torna difícil às entidades que repartem os dinheiros públicos compreenderem que o que atesta e fica da civilização dum povo é essencialmente a sua literatura e a sua arte e que

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