Da fera multidão, fazendo extremos, Dirás, Hóspede, tu, que aqui jazemos Vêde quaes com mais glória ficarião, Se aquelles que morrerão por o Estado, S'estes a quem mulheres injurião? Mas tu, claro Miguel, que ja acordado Deste sonho tão breve, estás naquella Tôrre do ceo, seguro e repousado; Onde, com Deos unida a forte e bella Co'os pés o crystallino ceo medindo, ELEGIA XI. Se quando contemplamos as secretas Que hum ponto só não mingua, nem s'augmenta; Da lua na mudança tão constante, Dos ceos, que tão conformes e contrarios A que responde o tempo, que não mente, Se quando, emfim, revolve subtilmente Sagaz escrutadora e diligente; Bem vê, se da razão se não desvia, Sem fim e sem princípio, hum Ser contino; Esta potencia, emfù, que tudo manda, Esta Causa das causas, revestida Do amor e da justiça compellida, Por os erros da gente, em mãos da gente Ólha, animal humano, quanto vales, Ólha que o sol no Olympo s'escurece, Não vês que a grande máchina inquieta Não vês como se perde a Natureza? Não vês que cahe o monte, a terra treme? E que lá na remota e grande Athenas O docto Areopagita exclama e teme? Por mi, Senhor, no mundo reputado Eu, Senhor, sou ladrão, tu justo Rei. Eu servo sem valor, tu immenso preço, Eu por perder-te, e tu por me ganhares Te dás aos soltos homens, que te vendem, Só para os homens presos resgatares? A ti, que as almas séltas, a ti prendem? A ti summo Juiz, ante Juizes Te accusão por o error dos que te offendem? Que sobre elles virá: a gente dura, Aquelle corpo tenro e delicado, Sobre todos os Santos sacrosanto, A açoutes rigorosos desangrado; Despois coberto mal d'hum pobre manto, Que se pegava ás carnes magoadas Para dobrar-lhe as dores outro tanto. Magoavão-no as chagas não curadas, Hum tormento causando-lhe excessivo Ao despir por as mãos crueis e iradas. As venerandas barbas de Deos vivo De resplandor ornadas, s'arrancavão Para desempenhar a Adão captivo. Com cordas por as ruas o levavão, Levando sobre os hombros o trophéo Da victoria qu'as almas alcançavão. Ó tu, que passas, homem Cyrenêo, Ajuda hum pouco a est' Homem verdadeiro, Que agora, como humano, enfraqueceo. Ólha que o corpo afflicto do marteiro, E dos longos jejuns debilitado, Não póde ja co'o pêso do madeiro. Oh não enfraqueçais, Deos incarnado! Essas quédas, que tanto vos magôão, Supportae Cavalleiro sublimado. Aquellas altas vozes, que lá sôão, Dos Padres são, que o Limbo tee escuro, E ja de louro e palma vos corôão. Todos vos bradão que subais o muro Da cidade infernal, e que arvoreis Em cima essa bandeira mui seguro. Oh Santos Padres! não vos apresseis; |