Pagina-afbeeldingen
PDF
ePub

75.

Porque de Amor não tem medo,
Eis do guloso menino
Castiga o furto num dedo.
Chupando o tenro dedinho
Entra Cupido a chorar;
E ao collo da mãe voando
Do insecto se vai queixar.
Venus carinhosa, e bella,
Diz, amimando-o no peito :
«Desculpa o que te fizeram,
Recordando o que tens feito.
«O tenue ferrão da abelha
Dóe menos que teus farpões;
O que ella te fez no dedo
Fazes tu nos corações. »

THOMAS ANTONIO GONZAGA

O verdadeiro heroe
Lyra

ALEXANDRE, Marilia, qual o rio
Que engrossando no inverno tudo arrasa,
Na frente das cohortes

Cerca, vence, abrasa

As cidades mais fortes.

Foi na gloria das armas o primeiro;
Morreu na flor dos annos, e ja tinha
Vencido o mundo inteiro.

Mas este bom soldado, cujo nome
Não ha poder algum que não abata,

[ocr errors]

Foi, Marilia, sòmente
Um ditoso pirata,

Um salteador valente.

Se não tem uma fama baixa e escura,
Foi por se pôr ao lado da injustiça
A insolente ventura.

O grande Cesar, cujo nome voa,
Á sua mesma patria a fé quebranta:
Na mão a espada toma,
Opprime-lhe a garganta,

Dá senhores a Roma.

Consegue ser heroe por um delicto!
Se acaso não vencesse, então seria
Um vil traidor proscripto.

O ser heroe, Marilia, não consiste
Em queimar os imperios. Move a guerra,
Espalha o sangue humano
E despovoa a terra

Tambem o mau tyranno.

Consiste o ser heroe em viver justo,
E tanto pode ser heroe o pobre
Como o maior Augusto.

Aos barbaros injustos vencedores
Atormentam remorsos e cuidados;
Nem descansam segurós
Nos palacios, cercados

De tropa e de altos muros.

E a quantos nos não mostra a sabia historia
A quem mudou o fado em negro opprobrio
A mal ganhada gloria!

Eu vivo, minha bella, sim eu vivo
Nos braços do descanso e mais do gôsto:
Quando estou acordado,
Contemplo no teu rosto
De graças adornado.

Se durmo, logo sonho, e alli te vejo.
Ah! nem desperto nem dormindo sobe
A mais o meu desejo.

JOÃO-BAPTISTA DA SILVA LEITÃO, VISCONDE DE ALMEIDA-GARRETT

76.

Cascaes

ACABAVA alli a terra

Nos derradeiros rochedos...
A deserta arida serra
Por entre os negros penedos
Só deixa viver mesquinho
Triste pinheiro maninho.

E os ventos despregados
Sopravam rijos na rama;
E os céos turvos, annuviados,
O mar que incessante brama...
Tudo alli era braveza

De selvagem natureza.

Ahi, na quebra do monte,

Entre uns juncos mal-medrados,
Sêcco o rio, sêcca a fonte,
Hervas e matos queimados.

Ahi nessa bruta serra,
Ahi foi um céo na terra!

Alli sós no mundo, sós,
Santo Deus! como vivemos !
Como eramos tudo nós,
E de nada mais soubemos !
Como nos folgava a vida,
De tudo o mais esquecida !

Que longos beijos sem fim!
Que fallar dos olhos mudo!
Como ella vivia em mim,
Como eu tinha nella tudo:
Minha alma em sua razão,
Meu sangue em seu coração!

Os anjos aquelles dias
Contaram na eternidade.
Que essas horas fugidias,
Seculos na intensidade,
Por millenios marca Deus
Quando as dá aos que são seus.

Ai! 'Sim foi a tragos largos,
Longos, fundos que a bebi,
Do prazer a taça-amargos
Depois...depois os senti,
Os travos que ella deixou...
Mas como eu ninguem gozou.

Ninguem! Que é preciso amar Como eu amei-ser amado

77.

Como eu fui; dar, e tomar
Do outro ser a quem se ha dado,
Toda a razão, toda a vida
Que em nós se annulla perdida.

Ai, ai! que pesados annos
Tardios depois vieram !
Oh! que fataes desenganos
Ramo a ramo a desfizeram,
A minha choça na serra,
Lá onde se acaba a terra!

Se o visse...não quero vêl-o,
Aquelle sitio encantado;
Certo estou não conhecê-lo,
Tam outro estará mudado,
Mudado como eu, como ella,-
Que a vejo...sem conhecê-la!

Inda alli acaba a terra,
Mas ja o céo não começa;
Que aquella visão da serra
Sumiu-se na treva espessa,
E deixou nua a bruteza
D'essa agreste natureza.

Os Cinco Sentidos

SÃO bellas bem o sei, essas estrellas,
Mil côres-divinaes têem essas flôres;
Mas eu não tenho, amor, olhos para ellas:
Em toda a natureza

« VorigeDoorgaan »