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SONETOS.

Vendo do forte Heitor a desditosa
Esposa, como Troia em fogo ardia,
De que per toda parte reluzia
A greciana espada victoriosa;

Um filho so, que tinha, receiosa
Que tenra idade não lhe valeria,
No sepulcro do
pae o escondia,
Dizendo éstas palavras lastimosa :
«<Ó filho da minh' alma entristecida,
Primeiro que nas mãos imigas caias,
Te quero aventurar nas da ventura !
Ella ordenará (se larga vida
Promettido te tem) que d'aqui saias;
E se não, ja tens certa a sepultura. >>

Leandro em noite escura indo rompendo
As altas ondas, d'ellas rodeiado
No meio d'Hellesponto, ja cançado,
E o fogo ja na torre morto vendo;

E vendo cada vez ir mais crescendo
O bravo vento, e o mar mais levantado;
De suas forças ja desconfiado,

Os rogos quiz provar, não lhe valendo.

«Ai ondas! (suspirando começou: >>) Mas d'ellas, sem lhe mais alento dar, A falla contrastada, atrás tornou.

«<Ai ondas! (outra vez diz) vento, mar, Não me afogueis, vos rogo, em quanto vou; Afogae-me depois quando tornar. »

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BERNARDES.

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SONETOS.*

Todo animal da calma repousava,

So Liso o ardor d'ella não sentia;
Que o repouso do fogo, em que elle ardia,
Consistia na nympha que buscava.

Os montes parecia que

abalava

* A imaginação de Camões foi fertilissima em sonetos: é notavel e digna de admiração a quantidade dos excellentes e perfeitos, além dos muitos bons, que produziu. A maior parte d'elles são amorosos, cheios de graça e delicadeza, ou de uma viva paixão; outros exprimem uma profunda melancholia. Em geral, nenhum poeta soube melhor conhecer e desempenhar o character d'este pequeno poema; nenhum principalmente teve mais do que elle o dom de imprimir a sua sensibilidade nos versos que saíram de seu coração, e que ainda hoje movem profundamente em nós uma terna sympathia.

J. M. DE SOUZA, Vida de Camões.

O triste som das mágoas que

dizia;

Mas nada o duro peito commovia,
Que na vontade de outro pôsto estava.
Cançado ja de andar pela espessura,
No tronco de uma faia, por lembrança,
Escreve éstas palavras de tristeza :

-Nunca ponha ninguem sua esperança
Em peito feminil; que de natura
Somente em ser mudavel tem firmeza. —

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Alma minha gentil, que te partiste Tam cedo d'ésta vida descontente; Repousa la no ceo eternamente,

E viva eu ca na terra sempre triste.

Se la no assento ethereo, onde subiste, Memória d'ésta vida se consente, Não te esqueças d'aquelle amor ardente, Que ja nos olhos meus tam puro viste. E se vires que póde merecer-te Alguma cousa a dor que me ficou Da mágoa, sem remedio, de perder-te; Roga a Deus que teus annos encurtou, Que tam cedo de ca me leve a ver-te, Quam cedo de meus olhos te levou.

Está-se a primavera trasladando Em vossa vista deleitosa e honesta;

Nas bellas faces e na boca e testa,
Cecens, rosas e cravos debuxando.

De sorte, vosso gesto matizando,
Natura, quanto póde, manifesta;
Que o monte, o campo, o rio e a floresta
Se estão de vós, senhora, namorando.

Se agora não quereis que quem vos ama Possa colher o fructo d'éstas flores, Perderão toda a graça os vossos olhos : Porque pouco aproveita, linda dama, Que semeiasse o amor em vós amores, Se vossa condição produze abrolhos.

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Quando o sol encuberto vai mostrando
Ao mundo a luz quieta e duvidosa,
Ao longo d'uma praia deleitosa,
Vou na minha inimiga imaginando.
Aqui a vi os cabellos concertando ;
Alli co'a mão na face tam formosa;
Aqui fallando, alegre, alli cuidosa;
Agora estando quêda, agora andando.
Aqui steve sentada, alli me viu,
Erguendo aquelles olhos tam isentos;
Commovida aqui um pouco, alli segura.
Aqui se entristeceu, alli se riu;

E emfim n'estes cançados pensamentos
Passo ésta vida van, que sempre dura.

Ondados fios de ouro reluzente, Que agora da mão bella recolhidos, Agora sobre as rosas esparzidos Fazeis que a sua graça se accrescente: Olhos, que vos moveis tam docemente Em mil divinos raios incendidos, Se de ca me levais a alma e sentidos, Que fora, se eu de vós não fôra ausente! Honesto riso, que entre a mor fineza De perlas e coraes nasce e apparece; Oh quem seus doces echos ja lhe ouvisse! Se imaginando so tanta belleza,

De si, com nova glória, a alma se esquece, Que fará quando a vir? Ah quen a visse!

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No regaço da mãe Amor estava,
Dormindo tam formoso, que movia
O coração que mais isento o via,
E a sua propria mãe de amor matava.

Ella c'os olhos n'elle contemplava
A quanto estrago o mundo reduzia ;
Elle porém, sonhando, lhe dizia

Que todo aquelle mal ella o causava. » Soliso, que graduado em seus amores, De saber de ambos mais teve a ventura, Assi soltou a dúvida aos pastores :

«Se bem me ferem sempre sem ter cura Do menino os ardentes passadores,

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