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NOTICIA BIOGRAPHICA

NOTICIA BIOGRAPHICA

DO

Coronel Ignacio Accioli de Cerqueira e Silva

ESCRIPTA PELO SR. HYPOLITO CASSIANO DE MIRANDA NO FRONTESPICIO DA 2a EDIÇÃO DO

1.o VOLUME DESTAS MEMORIAS

A vida é um sonho que veloz se apaga,
Como a nuvem do céo;

Encanta os olhos porque doura ás vezes
De luz um falso véo.

Dr. João SILVEIRA DE SOUZA (Minhas canções, São
Paulo, 1849).

Descrever a vida politica e mencionar os relevantissimos serviços prestados ao Brazil, quer na paz, quer na guerra, pelo homem, cujo nome encima estas linhas, não cabe nos estreitos limites de uma ligeira noticia, não só por serem escassos os apontamentos conhecidos sobre a sua vida, como tambem por não dispormos, o que é mais essencial, de cabedal litterario sufficiente para desempenhar tão ardua tarefa.

Todavia, como homenagem d'além-tumulo, darei um simples esboço de sua vida e de seus serviços.

Ignacio Accioli de Cerqueira e Silva, filho legitimo do desembargador Miguel Joaquim de Cerqueira e Silva, nasceo em 1808, em Coimbra (1), onde seo pae casou, sendo estudante na Universidade.

Muito creança ainda veio para o Brazil com seo pae, o qual foi nomeado 1o. juiz de fóra da Villa Nova de Marajó (Pará), creada pelo Alvará de 8 de Maio de 1811 e erecta a 30 de Dezembro do anno seguinte, e occupou depois o cargo de ouvidor da comarca do rio S. Francisco.

Ignacio Accioli foi, como acertadamente disse o Dr. Joaquim Manoel de Macedo, "Brazileiro pela infancia, pela educação, pelos

(1)-José Alvares do Amaral (Resumo chronologico e noticioso da provincia da Bahia desde o seu descobrimento em 1500, Bahia, 1881, pag. 155) e Eduardo Carigé (Geographia physica e politica da provincia da Bahia, Bahia, 1882, pag. 63) dizem que Ignacio Accioli era natural da Bahia, mas esta asserção é destituida de fundamento.

costumes, pelo amor, ainda antes de sel-o pela nacionalidade independente" (2).

Embora tivesse frequentado as aulas de humanidades na Bahia, todavia não se formou, dedicando-se, porém, ao exercicio da advocacia, por isso que, tendo quasi todo o curso de direito, era proficiente na legislação, fez diversas excursões pelo interior de algumas provincias, percorrendo centenares de leguas, e principalmente pelo valle do S. Francisco, onde se demorou cerca de quatro annos, afim de estudar aquellas localidades, colhendo nessa peregrinação importantes notas de maximo interesse publico para os seos trabalhos historicos, aos quaes com o maior desinteresse se entregava, não ambicionando outra gloria senão a de diffundir pela nossa população o estudo da historia do Brazil, que adoptou por sua patria, depois das luctas da Independencia (1822-1823), e pela qual estremecia.

Tomou parte nos movimentos politicos havidos na provincia (hoje Estado) do Pará em 1821, sendo elle e seo pae dois dos 277 cidadãos que a 14 de Abril de 1823 proclamarão ahí a Independencia, por cujo crime soffrerão indiziveis trabalhos e perseguições do prepotente Governador das armas, brigadeiro José Maria de Moura, "despota terrivel, e ante o qual, se póde sem erro affirmar, ser o general Madeira (3) um homem de virtudes" (4), sendo juntamente com aquelles remettido preso para Lisboa, d'onde elle e seo pae voltarão em 1824 para Pernambuco e d'ahi ao Pará, onde já se achavão a 17 de Maio deste ultimo anno (5), sendo ambos mais felizes do que 77 dos seos companheiros de exilio, 14 dos quaes, durante a viagem, morrerão á fome, sêde e miseria e 63 depois de chegarem á Lisboa.

A sua estada por espaço de 13 annos nessa ex-provincia foi em grande parte absorvida em colher informações e colligir documentos para escrever a Corographia Paraense, obra esta "de grande merecimento, considerado o tempo em que elle a escreveo, e o horisonte acanhado dos conhecimentos que então havia do Gram-Pará, que comprehendia a Provincia do Amazonas" (6), em cujo trabalho foi auxiliado pelo Arcypreste João Baptista Gonçalves Campos, que,

(2)- Supplemento do Anno Biographico Brasileiro, Rio de Janeiro, 1880, tomo 1o., pag. 493.

(3) Ignacio Luiz Madeira de Mello.

(4)—Memorias Historicas e Politicas da Provincia da Bahia, Bahia, 1836, tomo 3., pag. 27, nota (9).

(5)-Extracto de uma correspondencia publicada na Estrella Brazileira, Rio de Janeiro, n. 84, de 17 de Maio de 1824.

(6)—Supplemento do Anno Biographico, tomo citado, pag. 494.

conforme lhe pedira, remetteo para esta capital alguns esclarecimentos extrahidos dos respectivos archivos; por isso que, tendo Accioli se apresentado pessoalmente, no anno de 1825, a José de Araujo Rôzo, presidente da referida provincia do Pará, munido da munido da Portaria de 5 de Junho de 1824, pela qual ordenava-se-lhe que franqueasse ao portador os archivos da secretaria do governo e dos Tribunaes, afim d'elle extrahir os documentos que precisava para o seo trabalho, esse funccionario, desobedecendo áquella Ordem, contentou-se em dizer-lhe -que os officiaes da secretaria estavão occupados na cópia de eguaes memorias. (7)

Em 1818-1819 o Conde da Palma, Governador d'esta ex-provincia, concedeo o theatro S. João á companhia dramatica dirigida. pelo insigne actor João da Graça Gentil. Em 1823, depois da expulsão dos Portuguezes, pertenceo elle da mesma forma áquella companhia, continuando assim até 1829. Em 1830 foi concedido por empresa a Domingos Antonio Zuanny, que, depois de trabalhar por sua conta até o anno seguinte, conheceo a necessidade de associar-se á referida companhia, e assim continuou a trabalhar até o anno de 1836. A este tempo a Assembléa Provincial, tomando em consideração tão util esta belecimento, lhe consignou 8:000$000, e Ignacio Accioli foi nomeado administrou d'elle, cargo que occupou até 31 de Agosto de 1837. Seo gosto pelo theatro, alliado aos seos varios conhecimentos, puderão superar as grandes difficuldades que a cada passo encontrava para levar avante o seo melhoramento material e pessal. Todavia preencheo satisfactoriamente a sua missão, conseguindo que esse estabelecimento, cujo estado de decadencia era o peor possivel, attingisse ao gráo de brilhantismo compativel com as forças pecuniarias, não só refor mando-o mas augmentando-lhe innumeras vistas, e fazendo com que em todos os domingos houvesse espectaculos e se commemorassem esplendidamente os dias de festa nacional.

Eleito tenente-coronel commandante do 5o. batalhão de infanteria da guarda nacional d'este Estado, então provincia da Bahia (districtos das freguezias de S. Pedro e da Victoria), de conformidade com a' Lei geral de 18 de Agosto de 1831, prestou relevantissimos serviços nó referido corpo, principalmente durante a revolta de 7 de novembr de 1837, conhecida por-Sabinada, até a completa pacificação da cidade (18 de Março de 1838), e bem assim no serviço da guarnição, sem outra recompensa a não serem as honras de tenente-coronel dó exercito, que lhe forão conferidas pelo governo Imperial, e os elogios

(7)—Advertencia á Corographia Paraense etc.. Bahia, 1833, pag. 7.

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