grosso, e tem a boca tapada com uma tapadoura tão justa que se não enxerga a junta d'ella, a qual se não despega senão como a fruta que está dentro e de vez, que esta bola cahe no chão, a qual tem por dentro dez ou doze repartimentos, e em cada um uma fruta tamanha como uma castanha de Hespanha, ou mais comprida; as quaes castanhas são muito alvas e saborosas, assim assadas como cruas; e despegadas estas bolas das castanhas e bem limpas por dentro, servem de graes ao gentio, onde pizam o sal e a pimenta. Piquia é uma arvore de honesta grandura, tem a madeira amarella e boa de lavrar, a qual dá um fruto tamanho como marmelos que tem o nome da arvore; este fruto tem a casca dura e grossa como cabaço, de côr parda por fóra, e por dentro é todo cheio de um mel branco muito doce; e tem misturado umas pevides como de maçãs, o qual mel se lhe come em sorvos, e refresca muito no verão. Macugé é uma arvore comprida, delgada e muito quebradiça, e dá-se em arêas junto dos rios, perto do salgado, e pela terra dentro dez ou doze leguas. Quando cortam esta arvore, lança de si um leite muito alvo e pegajoso, que lhe corre em fio; a qual dá umas frutas do mesmo nome, redondas, com os pés compridos e côr verdoenga, e são tamanhas como maçãs pequenas; e quando são verdes travam muito, e são todas chejas de leite. Colhem-se inchadas para amadurecerem em casa, e como são maduras tomam a côr almecegada; comem-se todas como figos, cujo sabor é mui suave, e tal que lhe não ganha nenhuma fruta de Hespanha, nem de outra nenhuma parte; e tem muito bom cheiro. Genipapo é uma arvore que se dá ao longo do mar e pelo sertão, de cujo fruto aqui tratamos sómente. A sua folha é como de castanheiro,a flôr é branca,da qual lhe nasce muita fruta, de que toma cada anno muita quantidade; as quaes são tamanhas como limas, e da sua feição; são de còr verdoenga, e como são maduras se fazem de côr pardaça, e molles, e tem honesto sabor e muito que comer, com algumas pevides dentro, de que estas arvores nascem. Quando esta fruta é pequena, faz se d'ella conserva,e como é grande antes de amadurecer tinge o sumo d'ella muito, com a qual tinta se tinge toda a nação do gentio em lavores pelo corpo e quando põe esta tinta é branca como agua, e como se enxuga se faz preta como azeviche e quanto mais a lavam, mais preta se faz; e dura nove dias, no cabo dos quaes se 26 TOMO XIV vai tirando. Tem virtude esta tinta para fazer seccar as bustelas das boubas aos indios, e a quem se cura com ella. Pela terra dentro ha outra arvore, a que chamam guti que é de honesta grandura; dá uma fruta do mesmo nome, do tamanho e côr das peras pardas, cuja casca se lhe apara; mas tem grande caroço, e o que se lhe come se tira em talhadas, como ás peras, e é muito saboroso; e lançadas estas talhadas em vinho não tem preço. Faz-se d'esta fruta marmelada muito gostosa, a qual tem grande virtude para estancar cambras de sangue. Nas campinas ha outra arvore a que chamam ubucaba, cuja madeira é mole, e dá umas frutas pretas e miudas como murtinhos, que se comem, e tem sabor mui soffrivel. Mondururú é outra arvore que dá umas frutas pretas, tamanhas como avelãs, que se comem todas, lançando-lhes fóra umas pevides brancas que tem, a qual fruta é muito saborosa. Ha outra outra arvore como larangeira que se chama comicha, a qual carrega todos os annos de umas frutas vermelhas, tamanhas e de feição de murtinhos, que se comem todas lançando-lhes fóra uma pevide preta que tem, que é a semente d'estas arvores, a qual fruta é muito gostosa. Mandiba é uma arvore grande que dá fruto do mesmo nome tamanho como cerejas, de côr vermelha, e muito doce; come-se como sorva lançando-lhe o caroço fóra e uma pevide que tem dentro, que é a sua semente. Cambuy é uma arvore delgada de cuja madeira se não usa, a qual dá uma flôr branca, e o fruto amarello do mesmo nome; do tamanho, feição e côr das maçãs d'anafega. Esta fruta é mui saborosa, e tem ponta de azedo; lança-se-lhe fóra um carocinho que tem dentro como coentro. Dá-se no mato perto do mar e afastado d'elle uma fruta que se chama curuanhas, cuja arvore é como vides, e trepa por outra arvore qualquer, a qual tem pouca folha; o fruto que dá é de uns oito dedos de comprido e de tres a quatro de largo, de feição da fava, o qual se parte peio meio como fava e fica em duas metades, que tem dentro tres e quatro caroços, da feição das colas de Guiné, da mesma côr e sabor, os quaes caroços tem virtude para o figado. Estas metades tem a casquinha muito delgada como maçãs, e o mais que se come é da grossura de uma casca de laranja; tem estremado sabor; comendo-se esta fruta crua, sabe e cheira a camoezas, e assada tem o mesmo sabor d'ellas as sadas; faz-se d'esta fruta marmelada muito boa, a qual por sua natureza envolta no assucar cheira a almiscar, e tem o sabor de perada almiscarada; e quem a não conhece entende e affirma que é perada. Os aracazeiros são outras arvores que pela maior parte se dão em terra fraca na visinhança do mar, as quaes são como macieiras na grandura, na côr da casca, no cheiro da folha e na côr e feição d'ella. A flôr é branca, da feição da de murta, e cheira muito bem. Ao fruto chamam aracazes, que são da feição das nesperas, mas alguns muito maiores. Quando são verdes tem a cor verde, e como são maduros tem a côr das peras ; tem o olho como nesperas, e por dentro caroços como ellas, mas muito mais pequenos. Esta fruta se come toda, e tem ponta de azedo mui saboroso, da qual se faz marmelada, que é muito boa e melhor para os doentes de cambras. Perto do salgado ha outra casta de araçazeiros, cujas arvores são grandes, e o fruto como laranja, mas mui saboroso, ao qual aparam a casca por ser muito grossa. Araticú é uma arvore do tamanho de uma amoreira, cuja folha é muito verde escura, da feição da da larangeira mas maior; a casca da arvore é como de loureiro, a madeira é muito molle, a flor é fresca, grossa e pouco vistosa, mas o fruto é tamanho como uma pinha, e em verde é lavrado como pinha, mas o lavor é lizo e branco. Como este fruto é maduro, arregoa todo pelos lavores que ficam então brancos, e o pomo é muito molle e cheira muito bem, e tamanho é o seu cheiro que, estando em cima da arvore, se conhece debaixo que está maduro pelo cheiro. Este fruto por natureza é frio e sadio; para se comer corta se em quartos, lançando-lhe fóra umas pevides que tem amarellas e compridas, como de cabaços, das quaes nascem estas arvores; e aparam-lhe a casca de fóra que é muito delgada, e todo mais se come. que tem muito bom sabor com ponta de azedo, a qual fruta é para a calma mui desenfastiada. Pino é uma arvore comprida, delgada, esfarrapa da da folha, a qual é do tamanho e feição da folha da parra. O seu fruto nasce em ouriço cheio de espinhos como os das castanhas, e tirado este ouriço fóra fica uma cousa do tamanho de uma noz, e da mesma côr, feição e dureza, o qual lhe quebram, e tiram-lhe de dentro deż ou doze pevides do tamanho de amêndoas sem casca, mas mais delgadas, ás quaes tiram uma camisa parda que tem como as amendoas, e fica-lhe o miolo alvissimo,que tem o sabor como as amendoas; de que se fazem todas as frutas doces que se costumam fazer das amendoas, os quaes pinos, lançados em agua fria, incham e ficam muito desenfastiados para comer, e são bons para dor de cabeça, de que se fazem amendoados. Dão se estas arvores em ladeira sobre o mar e á vista d'e le, em terras dependuradas. Abajerú é uma arvore baixa como carrasco, natural donde lhe chega o rocio do mar, pelo que se não dão estas arvores senão ao longo das praias, cuja folha é aspera, e dá uma flor branca e pequena. O fruto é do mesmo nome e da feição e tamanho das ameixas de cá, e de côr roxa; come se como ameixas, mas tem maior caroço; o sabor é doce e saboroso. Amaytim é uma arvore muito direita, comprida e delgada; tem a folha como figueira, dá uns cachos maiores que os das uvas ferraes; tem os bagos redondos, tamanhos como os das uvas mouriscas, e muito esfarrapados, cuja côr é roxa, e cobertos de um pello tão macio como velludo; mettem-se estes bagos na boca e tiram-lhe fóra um caroço como de cereja, e a pelle que tem o pello, entre a qual e o caroço tem um doce mui saboroso como o sumo das boas uvas. Apé é uma arvore do tamanho e feição das oliveiras, mas tem a madeira aspera e espinhosa como romeira, a folha é da feição de pecegueiro e da mesma côr. Esta arvore dá um fruto do mesmo nome,da feição das amoras, mas nunca são pretas, e tem a cor brancacenta; come-se como as amoras; tem bom sabor, com ponta de azedo, mui appetititoso para quem tem fastio; as quaes arvores se dão ao longo do mar e à vista d'elle. Murici é uma arvore pequena, muito secca da casca e da folha, cuja madeira não serve para nada; dá umas frutas amarellas, mais pequenas que cerejas, que nascem em pinhas como ellas, com os pés compridos; a qual fruta é molle e come-se toda; cheira e sabe a queijo do Alemtejo que requeima. Estas arvores se dão nas campinas perto do mar em terras fracas. Copiuba é uma arvore da feição do loureiro, assim na côr da casca do tronco como na folha, a qual carrega por todos os ramos de uma fruta preta do mesmo nome, maior que murtinhos e toma tantos crdinariamente que negrejam ao longe. Esta fruta se come como uvas, e tem o sabor d'ellas quando as vendimam, que estão muito maduras, e tem uma pevide preta que se lhe lança fóra. Dão se estas arvores ao longo do mar e dos rios por onde entra a maré. Macarandiba é uma arvore real de cuja madeira se dirá ao diante. Só lhe cabe aqui dizer do seu fruto, que é da côr dos medronhos e do seu tamanho, cuja casca é teza e tem duas pevides dentro, que se lhe lançam fòra com a casca; o mais se lhe come, que é doce e muito saboroso; e quem come muita d'esta fruta que se chama como a arvore, pegam-se-lhe os bigodes com o sumo d'ella, que é muito doce e pegajoso e para os indios lhe colherem esta fruta cortam as arvores pelo pé como fazem a todas que são altas. Estas se dão ao longo do mar ou á vista d'elle. Mocury é uma arvore grande que se dá perto do mar, a qual da umas frutas amarellas, tamanhas como abricoques, que cheiram mnito bem, e tem grande caroço; o que se lhe come é de maravilhoso sabor, e aparam-lhe a casca de fóra. Cambucá é outra arvore de honesta grandura, que dá umas frutas amarellas do mesmo nome, tamanhas como abricoques, mas tem maior caroço e pouco que comer; é muito doce e de honesto sabor. CAPITULO LV. Em que se contêm muitas castas de palmeiras que dão fruto pela terra da Bahia no sertão e algumas junto do mar. Como ha tanta diversidade de palmeiras que dão fruto na terra da Bahia, convém que as arrumemos todas n'este capitulo, começando logo em umas a que os indios chamam pindoba, que são muito altas e grossas, que dão flôr como as tamareiras, e o fruto em cachos grandes como os coqueiros, cada um dos quaes é tamanho que não póde um negro mais fazer que leval-o ás costas; em os quaes cachos tem os cocos tamanhos como peras pardas grandes, e tem a casca de fóra como coco, e outra dentro de um dedo de grosso, muito dura, e dentro d'ella um miolo massico com esta casca, d'onde se tira com trabalho, o qual é tamanho como uma bolota, e mui alvo e duro para quem tem ruins dentes; e se não é de vez, é muito tenro e saboroso; e de uma maneira e outra é bom mantimento para o gentio quando não tem mandioca, o qual faz d'estes cocos azeite para suas mesinhas. Do olho d'estas palmeiras se tiram palmitos façanhosos de cinco a seis palmos de comprido, e tão |