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Só o homem, vaidoso, a sepultura
Não sabe sem pavor inda encarar;
Mas eu na morte emfim acho doçura,
Folga o meu coração não sei chorar!

O que é a vida p'ra valer que a chorem,
Se em seguida ao prazer renasce a dor;
0 que é a vida p'ra valer que a adorem
Se no mundo á traição chamam amor!
Trabalhar e soffrer é nossa sina
Em quanto a noite eterna não chegar;
Embora longe da mansão divina
Folga o meu coração, não sei chorar !

Chore embora quem preza a vida sente
Aos olhos da mulher sua affeição,
Como a era que abraça docemente
As ruinas d'um portico pagão;

A mim, que nada no mundo me tem prezo, Que as minhas affeições vi desabar,

A vida e mais as lagrimas desprezo Folga o meu coração, não sei chorar!

Em tudo similhante a essas aves
Que desprezam dos campos o matiz,
E que só pelos canticos suaves
As conhecem os seus, no seu paiz.
A ellas similhante é o poeta
Que busca a solidão para cantar :

E que pode dizer á mente inquieta,
Folga o meu coração, não sei chorar!

Como o bronze sagrado do mosteiro,
Que alegria e prazer, que o riso e a dôr
Confunde n'um só canto derradeiro
Que manda ao throno excelso do Senhor :
Depurado de fel, o sentimento

Que no peito uma vez deixei entrar

Embora convertido em meu tormento: Folga o meu coração não sei chorar!

RECEIO.

Je veille, et nuit et jour mon front rève enflammé. VICTOR HUGO.

Quando eu só comtigo e pensativo
Entre as minhas aperto a tua mão,
Eu não sei que prazer, que lenitivo
Sente junto de ti, meu coração.

Esquecido do mundo as horas correm
Um ao outro jurando eterno amor:
E n'estas doces juras, que não morrem,
Me pintas tua fé, eu meu ardor!

Quando emfim, mais feliz, eu me recosto
Em teu colo; e te sinto o seio arfar;
Ou quando o meu joelho é teu encosto
E n'elle a linda fronte vens pousar.

Quando nos olhos teus os meus suspensos
Como a abelha nas folhas do jasmim,
Se os meus desejos sinto mais intensos
Tambem vago terror me vence a mim!

Quantas vezes, então, ai quantas, dize,
De repente me vês estremecer,
Até que ardente lagrima deslise
Pela face que em fogo eu sinto arder.

Em teus braços então vens estreitar-me; E as lagrimas tão sós que derramei, Quando anjo do céu vens abraçar-me Nos teus olhos depois as encontrei.

Com perguntas sem fim tu me interrogas,
De meus prantos indagas a razão,
E mentalmente a Deus pedes e rogas
Te revele o que tem meu coração.

Não me enterrogues mais. Escuta Elysa
A fundada razão da minha dôr:
E' que sei que mulher tem por divisa
Mentir nos prantos, traficar no amor.

A MADAME ANAIDE CASTELLAN.

Quem póde ouvir-te, Cantora,
Sem que dos olhos o pranto
Se vá juntar ao teu canto;
Ou sem que o peito rendido
A' tua voz que enamora,
N'um ai profundo e sentido
Não diga Já não duvido,
A crença nasceu-me agora!
Bem haja o poder divino
Que na tua voz, Cantora,
Manda á crença que descora,
Que reviva n'um teu hymno,
Como no suave trino
De funda melancolia,
Que o rouxinol amoroso
Dos bosques a Deus envia
N'um canto triste e saudoso !
Se pois de Ti é que nasce
O sacro fogo que alenta
A quem escuta o teu canto;
Se pois a fé se alimenta
A' tua voz; e no pranto
E' que o teu poder se ostenta :
Cessem os bravos, as palmas,
Que o tributo de quem sente
Só nos olhos se conhece,
So no pranto é que é ardente!

LIVRO II.

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