Pagina-afbeeldingen
PDF
ePub

E nas selvas, que o cedro escurece,
Ouvir bcijos, de nunca fartar!

Inda agora, nas noites caladas,
Quanto tudo é socego e mudez;
Cuida a gente escutar as passadas,
As ligeiras passadas de Ignez!

Quando tudo na terra é socego;
Quando brilha na selva o luar;
No saudoso correr do Mondego
Cuidam todos ouvir suspirar!

Inda agora nas tardes saudosas
Que só duram no meu Portugal;
Cuida o povo, nas aguas formosas,
Vêr o rosto de Ignez no crystal!

Eu quizera ter lyra afinada,
Pelas harpas dos anjos do ceu ;
Que na corda de amor magoada,
Descantára de Ignez o tropheu.

VII.

Oh! descança-te em paz lyra sentida ;
Mais lagrimas não tens. Verteste todas
Pela terra que foi outr'ora grande,
E do mundo ás nações hoje só lembra
Nos cantos de um poeta. E que poeta!
O teu nome, Camões, salva da affronta
A honra portugueza. Perdoa-me
Se este feudo de amor juntei aos cantos,
Aonde a linda Ignez vivêra eterna,
Se, para eterna ser, lhe não bastára
Aquelle fino amor, que, exemplo a amores
Consagrado ficou. Lagrimas tristes
Não sabem escolher olhos felizes,
Por onde, manso e manso burbulhando,
Gravem fundo nas faces um só nome,
E tão fundo! e tão triste! o da saudade !

6

Formosa linda Ignez, se o canto é pobre,
Se inexperto cantor, ousei sem medo
De ten sentido amor cantar extremos;
Vós, ó concavos valles que podestes
A vos extrema ouvir da bocca fria'
Da mãe que se finava. Vós, ó valles,
Repetindo-lhe as queixas, os suspiros,
Eternisaes sem qu'rer sua memoria.
Morreste linda Ignez, mas foi-te a morte
Como a do cysne a gorgear ternuras;
Como a da pomba que em sentido arrulho
A vida perde; roxeando em sangue
Do casto peito as nevadas plumas!
O teu cantor o disse: Foi-te a morte,
'Assim como á bonina
que cortada
'Antes de tempo foi.' Ignez formosa,
Hoje o meu canto escuta-me se podes.
E do pallido rosto as seccas rosas

[ocr errors]

Do rubor da modestia accende a ouvi-lo!

VIII.

Amor que aos outros dá vida,

A ti, Ignez, o que deu ?

Uma lagrima vertida

Nessa hora em que nasceu ;

Uma fonte fresca .pura,

Que nas queixas que murmura,

Diz a tua sem ventura,

Diz o fim que amor te deu!

Das, lagrimas, se chama a fonte,
Onde os teus olhos, Ignez,
Para que a bocca o não conte
Dizem de amor o revez!
Até no pranto amorosa,
Com elle dás a vida á rosa,
Que na campina orgulhosa.
Bebe os teus prantos, Ignez!

Na selva vagos queixumes
Traduzem o teu amor;
Nas veigas arde em ciumes
Da selva o gentil cantor!
E os ciumes e as queixas.
São variadas endeixas,
Que ao morrer á terra deixas
Festejando o teu amor!

De tristezas e saudades,
Este meu canto compuz:
Acabam aqui vaidades,
De amor o fogo reluz;
As lyras dos trovadores
Se inspiram dos teus amores!
Foi delles, colhendo as flores,
Que este meu canto compuz.

Pedi um canto á minh'alma,
Que fosse teu, é só teu;
Das trovas nasce esta palma
Que a lyra chorando deu!
Pela saudade pedida,
Foi em lagrimas nascida;
Se vae do peito sentida,
É que o canto é todo teu !

O SEU TUMULO.

Deux jours n'attendant plus, mais appelant encore, Il redira sa plainte et la troisiême aurore, Laissant tomber son aile, il mourra de douleur.

MILLEVOYE.

O seu tumulo singelo,

Não tem pedra nem letreiro;
Só tem uma cruz erguida
Debaixo daquelle olmeiro.

Mas aquella cruz erguida
Diz mais que tudo na terra:
Diz que Julia ali repousa,
Que as cinzas ali lhe encerra.

Os ventos que á noite zunem
Nas comas dos arvoredos.
Sabem sim, mas não revelam
Daquella campa os segredos !

Como a rosa desfolhada,
Sobre a relva da campina;
A ter a sorte da rosa
Foi na terra a sua sina.

Seus olhos, que me inspiravam,
Fallavam meigos amores;
Como as aves a trinarem,
Dos bosques entre os verdores

Mos pouco gosou a triste
Dessa vida de donzella;
Tão pura, tão socegada,
Tão meiga, sentida e bella.

Aos anjos que andam na terra
Dá-lhes Deus bem curta vida;
Que não quiz Deus que a virtude
Aos crimes andasse unida.

Os ventos que á noite zunem
Nas comas dos arvoredos,
Sabem sim, mas não revellam,
Daquella campa os segredos!

[ocr errors]
« VorigeDoorgaan »