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Mas a vãa Senhoria, que se lembra, Que em casa do Deão sempre encontrára A mais benigna, a mais certa guarida; Que seo nome na bôca do lacaio, Do cusinheiro, da ama andava sempre ; A cabeça movendo descontente, Tres vezes escarrou, e a voz alçando, Desta sorte fallou ao gran Despóta : » Soberano Monarcha, , que tu queiras >> Premiar a quem te honra, empreza digna »He do téo coração: eu mesmo approvo, » E mil vezes dictára este conselho: » Mas que, para o fazer, hoje pretendas, » Que um Deão de crescente e curta vista » A dignidade abata, e a esperar sáia » N'uma porta de escada o seo Prelado; » Nem justo me parece, nem louvavel. >> Se tu queres honrar sua Excellencia, » Outras maneiras ha de conseguil-o : » Na mesma Igreja de Elvas e Cabido » Ha um Bastos, um Souza, dous Aporros » Que, juntos com os Pittas, podem todos » Inda á mesma commûa acompanhal-o, » Levantar-lhe a cortina do trazeiro, >> Lavar-lhe o nedio cù, e até beijar-lh'o. >> Estes e outros d'esta mesma estôffa, » De que o Bispado quasi todo abunda, » As costas vão buscar o gôrdo Bispo,

» Que, inda que um pouco pésa, vem seguro; Que são Cavallos mestres e possantes. »

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Mais queria dizer o vão Dynasta,

Quando do seo assento, esbravejando,
Se levanta impetuosa a Excellencia :

O furor, que lhe inflamma o grave aspecto,
As palavras lhe córta ; principia
Cem vezes o discurso, e logo pára:
Até que n'estas descompostas vozes
Finalmente atroou a grande sala:

» Como ! E he possivel, que baja quem se atrêva
» Neste Congresso a oppôr-se cara a cara
» Aos obsequios, que Tu, ó Nume, ordenas
» A uma Reverendissima Excellencia?

» Um Deão co'o seo Bispo comparado

» Um cominho não he? Se Tu, ó Name,
» O teo grande projecto não sustentas,
» Eu so... » E nisto bate o pé na casa.
Ao rijo som da bestial patada

Tremèo o régio solio e o pavimento:
Assentos e assistentes assustados
Cairão pela terra. Então o Genio

Alcando um pouco a voz : » Basta ( lhe disse )
» Eu disputas não quero em meo Conselho,
» Minha resolução está tomada;

» Eu a escrevi, eu mesmo em meo canhenho,
» Eo, que escrevo uma vêz, nunca mais bórro, ◄
(0 Hyssope Cant. I. F. 98. &c.)

IX. (Capit. XXI. Secç. 1. Art. 2. §. 4.)

Este, que era o mais grave na pessoa,
Desta arte para o Rei de longe brada:
Ótu, a cujos reinos e corôa

Grande parte do mundo está guardada;
Nós outros, cuja fama tanto vôa,
Cuja cerviz bem nunca foi domada,

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Te avisamos, que he tempo, que ja mandes
A receber de nós tributos grandes.
Eu sou o illustre Ganges, que na terra
Celeste tenho o berço verdadeiro :
Est'outro be o Indo Rei, que nesta serra
Que vês, seu nascimento tem primeiro.
Custar-te-hemos com tudo dura guerra;
Mas, insistindo tu, por derradeiro
Com não vistas victorias, sem receio,
A quantas gentes vès porás o freio.

(Lusiad. Cant. IV. Est. 73 e 74.)

X. (Capit. XXI. Secç. 1. Art. 2. §. 5.)

Chorárão-te, Thomé, o Gange e o Indo;
Chorou-te toda a terra, que pizaste;
Mais te chórào as almas, que vestindo
Se hião da sancta Fé, que lhe ensinaste :
Mas os Anjos do Ceo cantando, e rindo,

Te recebem na gloria, que ganhaste.
Pedimos-te, que a Deos ajuda peças,
Com que os teus Lusitanos favoreças.

(Lusiad. Cant. X. Est. 118.)

XI. (Capit. XXI. Secç. 1.a Art. 2.o §. 8.)

Como da gente illustre Portugueza

Ha de haver, quem refuse o Patrio marte?
Como desta provincia, que princeza
Foi das gentes na guerra em toda parte,
Ha de sahir quem negue ter defeza,
Quem negue a fé, o amor, o esforço e arte
De Portuguez, e por nenhum respeito
O proprio reino queira ver sujeito ?
Como? Nào sôis vós inda os descendentes
Daquelles, que debaixo da bandeira
Do grande Henriques, féros e valentes
Vencerão esta gente tão guerreira?
Quando tantas bandeiras, tantas gentes
Puzerão em fugida, de maneira

Que séte illustres Condes lhe trouxeram
Presos, afora a presa, que tiveram ?
Com quem fôrào contino sopeados
Estes, de quem o estais agora vós,
Por Diniz e seu filho, sublimados,
Senão co'os vossos fortes pais e avós?
Pois se com seus descuidos, ou peccados
Fernando em tal fraqueza assi vos pôz,
Torne-vos vossas fôrças o Rei nôvo;
Se he certo, que co'o Rei se muda o pôvo.
Rei tendes tal, que se o valôr tiverdes
Igual ao Rei, que agora alevantastes,
Desbaratareis tudo o, que quizerdes,
Quanto mais a quem ja desbaratastes :
E se com isto em fim vos não moverdes
Do penetrante mêdo, que tomastes;
Atai as mãos a vosso vão receio ;
Que eu só resistirei ao jugo albeio :
Eu só com meus vassallos, e com esta
(E dizendo isto arranca meia espada )
Defenderei da fòrça dura e infesta
A terra, nunca de outrem subjugada :

Em virtude do Rei, da patria mesta,
Da lealdade ja por vós negada,
Vencerei, não so estes adversarios,

Mas quantos ao meu Rei forem contrarios.
(Lusiadas Cant. IV. Est. 15.... 19.)

XII. (Capit. XXI. Secç. 1. Art. 2. §. 8.)

Mas das potencias recobrando o uso,
Que o subito desgosto lhe embargára,
Escumando de raiva entre si disse:

» Pois não querem a paz haverá guerra.
» Vós, santos Ceos, e Tu, Astro brilhante,
» Que o dia trazes, e que o dia levas,

» E que eu nascer não vejo ha longos annos!
» Vós testemunhas sôis, se eu pretendia

» Mais, que em paz desfrutar minha Prebenda,
» Comer, jogar, dormir e divertir-me.
» Mas ja que tu, ó Bispo revoltoso,
» E Tu, infame, adulador Cabido,
» A mudar me obrigais com vis cabálas
» De tão santo proposito,

até onde
» Chegão dos Laras o valor e o brio
» Desta vez provareis.

(O Hyssope Cant. IV. v. 24 &c.)

XIII. (Capit. XXI. Secç. 3.* §. 1.)

Se ja nas brutas feras, cuja mente
Natura fêz cruel de nascimento;
E nas aves agrestes, que somente
Nas rapinas aerias tem o intento;
Con pequenas crianças vio a gente
Terem tão piedoso sentimento,

Como co'a mãi de Nino ja mostráram,
E co'os irmãos, que Roma edificáram :
Ó tu, que tens de humano o gesto e o prito
(Se de humano he matar huma donzella
Fraca e sem força, só por ter sujeito
O coração a quem soube vencêl-a) ;
A estas criancinhas tem respeito,
Pois o não tens á morte escura della :
Môva-te a piedade sua e minha,

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Pois te não move a culpa, que não tinha.
E se, vencendo a Maura resistencia,
A morte sabes dar com fogo e ferro;
Sabe tambem dar vida com clemencia

A quem, para perdél-a, não fèz êrro :
Mas, se to assi merece esta innocencia,
Poem-me em perpetuo e misero destêrro,
Na Scythia fria, ou lá na Libya ardente,
Onde em lagrimas viva eternamente :
Poem-me, onde se use toda a feridade
Entre leões e tigres, e verei,
Se nelles achar posso a piedade,
Que entre peitos humanos não achei :
Alli co'o amor intrinseco e vontade

Naquelle, por quem mouro, criarei
Estas reliquias suas, que aqui viste;
Que refrigerio sejam da mài triste.

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(Lusiad. Cant. 111. Est. 126... 129.)

XIV. Ibidem:

... E muitos outros cahîrão nesta cond'onde vierão a deixar as Cidades, e irse a suas quintas e lugares apartados, aonde cada hum andava communicando comsigo mesmo, pretendendo abalisar-se na Philosofia. E caso que buscassem sembras, ribeyras graciosas, valles amenos, altos álemos, sombrios freyxos, suaves cantos das aves, O saudoso tom dos quebrados das agoas, o rugido dos ventos, que zunião nas concavidades das altas rochas: tudo isto fazião, não somente pera seu gosto, mas tambem pera que estas cousas os excitassem ao sossêgo do animo e tranquillidade da vida. "

(Fr. Heytor Pinto, Imag. da Vida Christãa Part. II. Dialogo da Tranquillidade da Vida Cap. 16.)

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