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mais um objecto por meio de outro, com o qual é confrontado. Pelo que ha neste segundo genero de Pinturas a ventagem de que a imaginação, propondo-se-lhe um objecto simiThante ao que particularmente se lhe intenta pintar, figura-se muitos pontos de vista importantes, que se não poderião exprimir por meio do simples uso das palavras. Um exemplo desta especie de Pinturas se lê nos Lusiadas Cant. III. Est. 40, que é o seguinte :

Qual diante do algôz o condemnado,
Que ja na vida a morte tem bebido,
Poem no cêpo a garganta, e ja entregado
Espera pelo golpe tão temido:

Tal diante do Principe indignado
Egas estava a tudo offerecido:

Mas o Rei, vendo a extrema lealdade,
Mais pôde em fim, que a ira, a piedade.

(Vide tambem no mesmo Canto Est. 111 e 112, e Est. 131 e 132 (*). )

§. 2. A regra principal, que deve observar o Orador nas Pinturas por Similhanças, é pôr um particular cuidado em que a cousa, de que tira a Similhança, não seja escura, nem desconhecida, antes sim familiar aos seus ouvintes; porque aquillo que se traz para aclarar outra cousa, deve ser mais claro, do que esta a que dá luz sendo todavia mais desculpavel essa tal ou qual obscuridade em Poesia, do que na Oratoria.

:

(*) Vide no fim do Vol. Exemplo III.

ARTIGO III.

Das Parábolas.

8. 1. O terceiro genero de Pinturas, denominado Parábola, só differe da Similhança, como ficou ja notado ácerca das mesmas consideradas como especies de Provas, (Cap. XII. §. 4.) em ser esta tirada de cousas familiares, e da mesma especie; e aquella procurar de mais longe, e em cousas de especie, e ainda de natureza diversa, os objectos de comparação; sendo na Parábola até uma belleza essa mesma distancia, donde se vai buscar o objecto de confrontação, pela novidade, e imprevisão, que a accompanhão. No citado Poema dos Lusiadas encontra-se, entre muitos outros, o seguinte exemplo de uma Parábola ( Canto II. Est. 23).

Quaes para a cova as próvidas formigas,
Levando o pezo grande accommodado,
As forças exercitão, de inimigas
Do inimigo inverno congelado;
Ali são seus trabalhos, e fadigas,
Ali mostrão vigor nunca esperado:
Taes andavão as nymphas estorvan do
A gente Portugueza o fim nefando.

Outro bello exemplo desta especie de Pinturas se lê em Sousa (Vida do Arcebispo, Liv. III. Cap. 4.): "Nenhuma abelha se vio mais sollicita em jardim cheio de flôres para colher de todas, com que perfeiçoar G

artificio de seus favos; do que o Arcebispo andava em todas as cousas de sua obrigação, e em cada huma, como se nenhuma outra estivera á sua conta : tão miûda e particularmente as tratava. "

§. 2. É de notar, que tanto nas Similhanças, como nas Parábolas, em ambas as quaes ha confrontação entre o objecto similhante, e o assimilhado, ja aquelle se põe primeiro, e este depois; ja ao contrario, e com a competente applicação; ja em fim o similhante vai sem applicação manifesta. Nos exemplos transcriptos assim neste Artigo, como no antecedente, o objecto similhante precede ao assimilhado : Exemplo de Similhança posta depois do objecto assimilhado offerece Camões no Canto II. Est. 43 do seu immortal Poema:

E co' o seu apertando o rosto amado,
Que os soluços e lagrimas augmenta;
Como menino da ama castigado,

Que, quem no affaga, o chôro lhe accrescenta.

Exemplo de Parábola, sem della fazer-se applicação manifesta ao objecto assimilhado, se lê em Fr. Heitor Pinto (Imag. da Vida Christaa, Part. II. Dialog. I. Cap. 25.), o qual é como se segue: Não ha grandes valles, senão aonde ha grandes montes; não ha grandes funduras de humildade, senão aonde ha grandes alturas de virtudes. »

ARTIGO IV.

Das Imagens.

8. 1. As Imagens, quarto genero de Pinturas, são umas Similhanças, ou Parábolas breves Bem como ellas, as Imagens pintão um objecto por meio da sua confrontação feita com outro; porèm as duas primeiras pintão com extensão, e miudamente, caracterizando os pontos de analogia, que entre elles existem; ao passo que as segundas abrevião a pintura, apontando só o objecto similhante, e deixando á consideração dos ouvintes ou leitores o perceber a analogia, e fazer a confrontação: É pois a Imagem um retoque de similhança vigoroso, mas passageiro; ou, para assim dizer, uma pincelada escapada mais por acaso, do que apresentada de proposito. Tal é a de Jacinto Freire (Vida de Castro, Liv. II.): no discurso de Coge Çofar: « Pôz-me os olhos, e levantou-me como vapor da terra, antepondo-me estranho e peregrino aos que lhe nascêrão em casa » : Ou a elegantissima dos Lusiadas, Canto II. Est. 41.

E nisto de mimosa

O rosto banha em lagrimas ardentes,
Como co' o orvalho fica a fresca rosa.

ARTIGO V.

Dos Bosquejos.

§. 1. Os Bosquejos, quinto genero de Pinturas, apresentão os objectos diante dos olhos não só com clareza, mas ainda com concisão, e rapidez: Chamão-se Bosquejos, nome derivado da arte da Pintura, como querendo dizer, primeiras linhas, e borrões principiados, mas não acabados, dos grandes Mestres da Eloquencia.

Todo o

cuidado do Orador no emprego dos Bosquejos deve consistir pois em dar a ver aos seus ouvintes, ou leitores por alguns toques vivos aquelles pontos de vista, que não cáhem sôbre os sentidos do commum dos homens, ou de que não podem inteirar-se com bastante delicadeza, e força; deixando-lhes o gosto de imaginar tudo o mais, que se não exprime. Tal é o logar de Vieira (Serm. Part. IV. pag. 137) Mas quando vião o gigante de tão desmedida estatura, e as armas iguaes aos membros, com que parecia uma torre de ferro, todos desmayavão, e tremjão » E o do Autor dos Lusiadas, pintando concisa e rapidamente o ar sobranceiro e alegre do Tritão, que conduzia a Venus sobre seus hombros (Canto II. Est. 21).

Não sente, quem a leva, o doce peso,
De soberbo com carga tão formosa;

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