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T21-198830

REDONDILHAS

Sobolos rios

que vão

Por Babylonia, me achei,
Onde sentado chorei

As lembranças de Sião,
E quanto nella passei.
Alli o rio corrente

De meus olhos foi manado;
E tudo bem comparado,
Babylonia ao mal presente,
Sião ao tempo passado.

Alli lembranças contentes
N'alma se representárão;
E minhas cousas ausentes
Se fizerão tão presentes,
Como se nunca passárão.
Alli, despois d'acordado,
Co'o rosto banhado em ágoa,
Deste sonho imaginado,
ᏙᎥ que todo o bem passado
Não he gosto, mas he mágoa.

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3

6V

E vi

que todos os danos

Se causavão das mudanças,
E as mudanças dos anos;
Onde vi quantos enganos
Faz o tempo ás esperanças.
Alli vi o maior bem

Quão pouco espaço que dura;
O mal quão depressa vem;
E quão triste estado tem
Quem se fia da ventura.

Vi aquillo que mais val
Qu'então s'entende melhor,
Quando mais perdido for;
Vi ao bem succeder mal,
E ao mal muito peor.
E vi com muito trabalho
Comprar arrependimento:
Vi nenhum contentamento;
E vejo-me a mi, qu'espalho
Tristes palavras ao vento.

Bem são rios estas ágoas
Com que banho este papel:
Bem parece ser cruel
Variedade de mágoas,
E confusão de Babel.

Como homem, que por exemplo
Dos trances em que se achou,
Despois que a guerra deixou,
Pelas paredes do templo
Suas armas pendurou:

Assi, despois qu'assentei
Que tudo o tempo gastava,
Da tristeza que tomei,
Nos salgueiros pendurei
Os orgãos com que cantava,
Aquelle instrumento ledo
Deixei da vida passada,
Dizendo: Musica amada,
Deixo-vos neste arvoredo
Á memoria consagrada.

Frauta minha, que tangendo
Os montes fazieis vir
Par'onde estaveis, correndo;
E as ágoas, que hião descendo,
Tornavão logo a subir;
Jamais vos não ouvirão
Os tigres, que s'amansavão;
E as ovelhas, que pastavão,
Das hervas se fartarão,
Que por vos ouvir deixavão.

Ja não fareis docemente
Em rosas tornar abrolhos

Na ribeira florecente;

Nem poreis freio á corrente,
E mais se for dos meus olhos.

Não movereis a espessura,

Nem podereis ja trazer
Atraz vós a fonte pura;
Pois não podestes mover
Desconcertos da ventura.

Ficareis offerecida

Á Fama, que sempre vela,
Frauta de mi tão querida;
Porque mudando-se a vida,
Se mudão os gostos della.
Acha a tenra mocidade
Prazeres accommodados;
E logo a maior idade
Ja sente por pouquidade
Aquelles gostos passados.

Hum gosto, que hoje s'alcança, Á manhãa ja o não vejo: Assi nos traz a mudança D'esperança em esperança, E de desejo em desejo. Mas em vida tão escassa Qu'esperança será forte? Fraqueza da humana sorte, Que quanto da vida passa Está recitando a morte!

Mas deixar nesta espessura
O canto da mocidade:
Não cuide a gente futura
Que será obra da idade
0 que he força da ventura.
Qu'idade, tempo, e espanto
De ver quão ligeiro passe,
Nunca em mi puderão tanto,
Que, postoque deixo o canto,
A causa delle deixasse.

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