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à minha chegada a esta ilha, me deu a parte seguinte:

Achão-se presos os officiaes do batalhão, o ajudante Pedro Aniceto Durão Padilha, o tenente João Portuguez, e o alferes aggredado Miguel Joaquim Prestes por sabirem pronunciados na devaça tirada pela traição perpetrada contra o commandante do batalhão».

E vendo eu esta parte, e que estavão prezos os que se propunhão cumplices da devaça, não tinha já logar o entrar em novas indagações.

a

No dia 17 de novembro mandou o dito major soltar aquelle ajudante do batalhão, sem que mo participasse, e chegando este facto a minha noticia, procurei saber delle a rasão, porque tendo-me antes dado parte, de que elle estava preso, como pronunciado naquella devaça agora o soltava, respondeu me: que estava preso por ordem sua, e que por isso o soltara, donde se segue ter-me dado huma parte falsa, por cuja rasão o mandei prender, e desta prisão já tenho dado parte a v. ex. em officio de 23 de novembro do anno proximo passado, depois do que o mandei soltar, e o adverti para que houvesse de entrar no conliecimento dos seus deveres, e no mesmo acto em que vinha agradecer me a soltura, se portou de forma, que se fazia merecedor de ser novamente preso, mas o meu genio docil, e pacifico fez, que eu me fizesse desentendido da sua altivez, ou loucura para ver se com esta brandura o podia ir reduzindo a huma pacifica harmonia. Mandei depois vir à minha presença as devaças que se havião tirado daquelle insulto, e convocando ao corregedor desta cidade, e os dois provedores da fazenda, e residuos para que votassem sobre o que eu devia praticar a respeito do tenente João Portuguez pronunciado, e do dito alferes Prestes não pronunciado, mas preso sem se lhe ter formado culpa; votou o dito corregedor devião ambos ser mettidos em conselho de guerra, e os dois provedores forão de parecer que devião soltar-se, cujos pareceres mandei escrever, e conformando-me com os destes, mandei soltar o alferes no dia anniversario 17 de dezembro por não estar pronunciado para o metter em conselho de guerra, logo que aqui chegasse o novo juiz de fora seu auditor; porem como S. A. R. o manda ir, e tambem seu irmão, que estava aqui em livramento por não ser militar, o mesmo sr. determinará delles o que bem lhe parecer.

Deus guarde a v. ex.a muitos annos. Angra 9 de maio de 1800.
Ill.mo e ex.mo sr. D. Rodrigo de Souza Coutinho.

(Liv. de Registo, fol. 99 v.o).

Conde de Almada.

Carta participativa dos imprudentes factos do juiz de fora da Graciosa, Agostinho Petra de Bettencourt, chamado, e demorado por este governo até S. A. R. deliberar; 15 de maio de 1800.

a

Ill.mo e ex.mo sr.-Ponho na presença de v. ex. as representações que me dirigiram o clero, e outras muitas pessoas, e depois destas a camara da Villa da Praia da Graciosa, sendo todas relativas aos. perniciosos. e escandalosos factos ali praticados pelo juiz de fora da mesma Ilha Graciosa Agostinho Petra de Bettencourt, e para socego daquelles povos mandei chainar este ministro detendo-o n'esta capital em quanto mandava indagar dos ditos factos, de que don conta a v. ex. remettendo o sumario a qúe mandei proceder.

He pois o que agora envio a v. ex.a para ser presente a S. A. R. o principe regente, nosso sr.; e posto que nelle não observo tanta energia, quanta me persuadirão aquellas representações em alguma materia das que ellas comprehendem, sempre com tudo me subministrão ideias bem tocantes para pensar mal da conducta daquelle ministro, e para persuadir-me que será muito util ao bom serviço de Deus, e de S. A. R. o removelo do emprego para que não acabe de contaminar aquelles habitantes, e que o mesmo sr.lhes despache outro mais serio, e mais cordato, que entre elles plante a paz, e a tranquilidade, e que administrando justiça imparcial, cohida sem paizão, (e segundo os dictames legaes) os delictos que ali acontecerem, visto que são estes os dignos objectos. em que todo o magestrado se deve empregar, e os justos fins, por que o mesmo sr. se propoem criallos.

E na esperança desta providencia, ou de qualquer deliberação, que S. A. R. for servido tomar à vista das provas resultantes do dito summario, continuo a demorar aqui o dito ministro para obviar maior perturbação naquella ilha, a onde elle tanto tem prevaricado no ponco tempo, que ali existio. e igualmente tambem para mais promptamente poder dar á execução as reaes ordens que por v. ex. me fo rem dirigidas sobre esta materia.

Deus guarde a v. ex.a, Angra 15 de maio de 1800.
Ill.mo e ex.mo sr. D. Rodrigo de Sousa Coutinho.

(Liv. de Registo, fol. 102).

a

Conde de Almada.

(Continua)

RESTAURAÇÃO DE 1640

NOS AÇORES

RELAÇÃO

do que aconteceu na Cidade de Angra da ilha Terceira, depois da feliz acclamação d’el-rei D. João IV, que Deus guarde, na restauração do Castello de S. João Baptista, do monte Brasil, até se embarcarem os castelhanos que o occupavam, composta pelo reverendo padre frei

DIOGO DAS CHAGAS,

da ordem dos frades menores do patriarcha S. Francisco,
da provincia dos Açores.(*)

Acclamação de D. João IV na Ilha Terceira

Prologo ao pio leitor

Se esta breve relação, pio leitor, te parecer muito breve e laudativa de alguns, não o sendo tanto de outros, e por isso te não for tão agradavel, lembro-te refresques a memoria com o que Christo Senhor Nosso disse a seus discipulos, quando os mandou á conquista do mundo e conversão das gentes d'elle, dizendo-lhes: Docete omnes gentes, annunciantes eis vitia et virtutes. pænem et gloriam cum brevitate sermonis, quia verbum abreviatum fecit dominus super terram. Acharás razão e fundamento de alliviar tua pena, vendo verdade com que tudo vae escripto, e por essa mesma razão breve e despida de todo o enfeite e ornato exterior, porque é tal a verdade, que só por si se orna e faz temer e respeitar, e conservar sem lesão alguma, como bem diz Lactancio: Nuda est veritas quia satis ornata per se est, ideo que ornamentis extrincicis fucata currumpitur; e melhor ainda S. Basilio: Nuda est veritas, et absque patrocinio ipsa se ipsam declarat. Por isso, pio

Inedito pela primeira vez publicado pelo fallecido José de Torres no T. XV (1858) do Panorama, pag. 140 e seguintes.

N.° 57-Vol. X-1889.

leitor, só tratei de fazer relação breve, e em tudo verdadeira, como podem testemunhar todos os que presentes se acharam, se à mão lhes chegar. O que mais me obrigou foi ver, que tudo o tempo com sua duração consome, e põe no esquecimento; e se alguns se querem mostrar lembrados, contam as coisas por tão differentes termos do que passaram, como já hoje a muitos as ouvimos; e ver tambem quão breve se, mostrou o dontor Gregorio de Almeida no livro que compoz intitulado Restauração prodigiosa de Portugal, no logar em que trata d'esta guerra é seu successo. Isto, como digo, me obrigou a tirar e pôr meus rascunhos em limpo, com toda a certesa e verdade, que n'esta breve relação te offereço.- Vale.

I

De como morto Miguel de Vasconcellos, e coroado em rei de Portugal D. João IV, que Deus guarde, duque que era de Bragança, mandou a Francisco de Ornellas trazer a sua voz a esta ilha.

Foi tão prodigioso e extraordinario o caso da morte que a Miguel de Vasconcellos deram os valorosos e sempre leaes portuguezes o primeiro dia de dezembro do anno de 1640, que me pareceu não satisfazia com dizer sómente o dia e anno em que foi morto; mas fazer uma breve consideração sobre sua miseravel morte, e desgraciada sorte. Quem for lido, assim nas lettras divinas como humanas, e considerar a vida e morte d'este desgraciado peccador, achará muitos casos e muitas pessoas, que ao vivo o representem; mas as pessoas e acontecimentos que a meu julgar melhor espelho seu são, é o Apostolo S. Paulo sendo ainda Saulo, e Juliano apostata: e assim podemos dizer que elle foi o Saulo e Juliano dos nossos tempos, porque na vi- . da imitou a Saulo, e na morte seguiu ao apostata Juliano.

Tomou Saulo à sua conta perseguir aos catholicos seus naturaes, e dar fim a seu catholico reino, levado não só de sua má natureza, mas de ambição e privança que queria ter com os grandes da synagoga, fazendo se grande com elles; e para mais os obrigar, sabendo que em Damasco havia christãos, se foi ter com elles, e lhes pediu cartas para prender a todos os que esta facção seguissem, e este santo nome invocassem, sem perdoar a homem, nem mulher, fidalgo, nem peão, secular, nem ecclesiastico; e alcançadas se poz ao caminho para pôr seu damnado feito em execução; e sem duvida destruiria de todo este catholico reino, fundado pelo mesmo Christo, se o Senhor The não saira ao caminho e encontro, e com o raio de sua voz o não prostára por terra, derribando-o do cavallo em que ia anhellando suà so

berba, dizendo-lhe: Saule, Saule, cur me persequeris; pois sabe que durum est tibi contra stimulum calcitrare (Act. apostolor. c. 9.°), e sem duvida que se (conheceu de seu erro) não obedecera, e dissera: Domine quid me vis facere, em corpo e em alma ficara sepultado no inferno, como o apostata Juliano, do qual diz Theodorico, (Lib. 63, Hist. eccles. cap. 25) que sendo pelo mesino Deus, por outras taes perseguições como as de Saulo, ferido com uma setta mandada do ceo, foi tal sua obstinação, que em logar de pedir perdão, como Saulo, e mais obstinado em seu peccado. tomava o sangue que pelo logar da setta de seu corpo saia, em suas mãos, e o espalhava pelos ares, fazendo com elle tiro para o ceo, dizendo; Vicisti galilea, galilea vicisti: e assim obstinado morreu, e foi tomar morada para sempre no infer

DO.

Que melhor espelho e retrato se pode dar da vida e morte de Miguel de Vasconcellos, que estes dois homens, porque, como outro Saulo, anhelando em soberba, tyrannia e crueldade, nascida não só de seu mau natural, mas de sua ambição e privança, procurou novas fintas e tributos, com que affligia a seus naturaes, e grandes provisões e cartas para os prender, usurpando para si até a jurisdicção ecclesiastica, só a fim de detruir o reino plantado pelo mesmo Christo, tornando o uma miseravel provincia; e imitando n'isto a Saulo perseguidor, não o imitou no conhecimento de sua culpa; porque sendo por Deus Nosso Senhor admoestado, por meio de seus pregadores e ministros, os não ouvia, antes a uns degradava, e outros prendia, e á egreja desobedecia. fazendo conselho e n'elle assento, que no que tinha intentado se não obedecesse ao papa, e prendendo o seu collector o enviou com guardas a Madrid. E porque imitando a Saulo na vida, não no imitando no conhecimento e contricção de seu peccado, veiu a morrer obstinado, como Juliano apostata, e como elle dentro em si dizia: vicisti Galilea, vicisti; não com setta do ceu caida. mas por mãos dos sempre leaes portuguezes, que acudindo por sua patria, liberdade e reino, the deram a morte que elle merecia, com o que ficon tudo quieto, e o reino restituido a seu dono, a quem directamente pertencia por linha direita masculina, como filho que é do excellentissimo senhor D. Theodosio, duque que foi da real casa de Bragança, e neto da altissima senhora D. Catharina, e por sua parte bisneto du maito excellentissimo infaute o senhor D. Duarte, filho do muito alto e muito poderoso, de gloriosa e eterna memoria, sr D. Manoel, que sauta gloria haja. E assim podemos dizer, que o reino que lhe tinha usurpado o poder das armas dos muito catholicos reis de Castelia, the restituin o ceo por meio da morte d'este insolente e atrevido homem, que por nome não perca Miguel de Vasconcellos, do qual podemos conjecturar que com a morte do corpo padeceria tamben a alma: de que o diabo na ilha de S. Miguel deu testemunho em certa occasião, que um frade nosso, por nome frei Francico de S. Pedro, no conven

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