SANCTA MARIA

A ilha de Sancta Maria, não he mui alta e no meio della vereis duas quebradas grandes e lança-se de Leste Oeste, e se a tomardes de Norte Sul, faz duas quebradas da banda de Oeste e tem hum arrecife: em o mais alto d'ella estão humas barreiras brancas, tem o porto da banda de Sueste, e ao Nordeste d'esta ilha 4 ou 5 leg. ao mar, está um baixo mui roim a que chamão as Formigas, que correm de Norte Sul, em altura de 37 gr. e meio e algumas pedras d'este baixo apparecem sobre mar: está esta ilha Leste Oeste com o Cabo de S. Vicente.

(Roteiro de navegação de Indias e ilhas occidentaes pag. 31, junto ao Tractado de Navegação por Valentim de Sá; comprado por José do Canto, no Leilão de Livros do Marquez de Castello Melhor, N.° 3121 do Catalogo).

MOVIMENTO LIBERAL NOS ACORES

1828-1834

(Continuado de pag. 477)

EXTRACTOS dos Documentos para a Historia das Cortes Geraes da Nação Portugueza (*)

Officio de Antonio Izidoro de Moraes Ancora sobre a sublevação da guarnição do castello de Angra; 28 de

junho de 1828.

Ill.mo e ex.mo sr.-Pelas dez horas da noite do dia 21 do correute mez, as quatro companhias do 5.° batalhão de caçadores, que se acham estacionadas na cidade de Angra, se sublevaram nos seus quarteis. no castello de S. João Baptista, e, depois de prenderem os capities Francisco de Paula da Cunha e Patricio José Abranches, e o tenente José Manuel de Paiva, e obrigado a se darem por doentes o major e o ajudante, commandadas pelo capitão do mesmo corpo, chefe da revolta, José Quintino Dias, prenderam o governador d'aquella praça, alguns officiaes do corpo de artilheria, e surprebenderam as guardas d'este corpo que ali existiam. Teve o meu general apenas tempo para reforçar a sua guarda e a da alfandega e cofres reaes, com alguns milicianos da cidade que se poderam n'aquelle apuro reunir. Pelas duas horas e meia da madrugada desceu á cidade um destacamento de quarenta homens dos amotinados, commandado pelo tenente do mesmo corpo Francisco Eleutherio Lobão, o qual atacou a guarda do meu general, commandada pelo primeiro tenente Ignacio José Pinheiro, que se defendeu briosamente, e, depois de algum tempo de fogo, sustentado por uma e outra parte, se retirou o destacamento, ficando morto um paizano e ferido um soldado miliciano.

Pela manhã do dia 22 se apresentou no largo, em frente da ca

(*) Lisboa, 1888, Imprensa Nacional, Tom. V, anno de 1828, 618 pag.

a

sa do governo, o mencionado capitão José Quintino Dias, com as quatro compaubias de caçadores, exigindo fallar ao meu general, que se achava gravemente doente: protestou o dito capitão a s. ex. que aquelle corpo só pretendia dar uma publica demonstração dos seus sentimentos a favor dos direitos do senhor D. Pedro, asseverando com a sua palavra e respondendo pelo corpo que commandava, que se s. ex. annuisse aos desejos d'elle e do corpo, não seria transtornada a ordem publica, nem soffreria incommodo pessoa alguma; porém, se pelo contrario s. ex. se oppunha aquella deliberação, elle e os soldados estavam determinados a levar avante os seus intentos emquanto tivesse um soldado e lhe restassem alentos. S. ex., não tendo à sua disposi ção força sufficiente para rebater tanta ousadia, respondeu que annuia, para salvar a cidade e seus habitantes; exigiu então o capitão José Quintino Dias, para poder responder peio procedimento futuro dos soldados, que s. ex. passasse ordens para que as armas dos batalhões de milicias da cidade e da villa da Praia the fossem entregues, bem como toda a polvora encartuchada que existia na dita villa. Passaramse estas ordens, e. quando ellas principiavam a ter o seu effeito, foi então que este official, desmascarando-se, poz em sua execução o seu atraiçoado plano. Eu e o meu collega Manuel José Coelho, tenente coronel, fomos conduzidos immediatamente para o castello de S. João Baptista, escoltados por dois cadetes; as quatro companhias marcharam para a praça, fizeram reunir a camara preterita, presidida pelo actual juiz de fóra, e ali accordaram tirar o governo do bispado ao deão, para se formar um governo interino de pessoas de sentimentos e opiniões eguaes. Com effeito, foram nomeados governadores o conego vigario geral João José da Cunha Ferraz, o coronel engenheiro José Rodrigo de Almeida e o juiz de fóra José Jacinto Valente Farinho. o que se não fez sem a morte de quatro miseraveis individuos do povo e ferimento de outros tantos, feitos pelos soldados. Consta-me que Javraram um termo ou auto, cujo teor uão chegou ao meu conhecimento, porém não duvido que seja conforme à participação que aquelle governo interino fez aos governadores subalternos d'esta capitauia, a qual, quanto pude reter ua minha memoria, é como se ve no documen to n.o 1.

Na tarde do mesmo dia 22 foi o men general conduzido, debaixo de prisão, por uma escolta de caçadores, commandada pelo referido tenente Lobão, para o castello de S. João Baptista; e, pouco depois, se me intimou ordem de embarcar dentro em uma bora para esta illa do Faial, aonde me acho preso com homenagem. O primeiro tenente Ignacio José Pinheiro teve igual destino para a ilha de S. Jorge, e o honrado capitão Abranches para a ilha de S. Miguel.

Na minha passagem pela ilh de S. Jorge fallei ao governador, e ficou commigo não reconhecer aquelle governo interino. O commandan dante militar d'esta comarca pareceu-me ao principio possuido d'este

mesmo sentimento, porém a ordem do dia, que remetto por copia a v. ex., n.o 2. destro a boa presumpção que eu tinha a seu respeito.

a

Cumpre que v. ex.a saiba que as quatro companhias que se revolucionaram apenas téem reunidas duzentas e noventa praças, pouco mais ou menos; porém, o governo intruso tem passado ordens para se reunirem em Angra os destacamentos que estão nas differentes ilhas, e, se o conseguirem, fica tendo á sua disposição um batalhão completo. Ex. sr., pareceu-me do meu dever participar a v. ex. na primeira occasião que se me offerece, vencendo bastautes difficuldades, este tão extraordinario acontecimento. Emquanto a mim, espero que v. ex. decida do meu destino; porém, emquanto aos infelizes habitautes da cidade de Angra, eu não tenho expressões que descrevam o susto e o terror de que ficaram possuidos, estando à mercè de uns homens desmoralisados e sem freio, que continuamente os ameaçam roubos e mortes. Aquelles que possuem alguns bens e os que fizeram mais patente a sincera satisfação que lhes causou a acclamação do serenissimo senhor D. Miguel, são constrangidos a abandonarem as suas casas e a procurarem nos matos abrigo ao rancor da soldadesca e dos homens maus que os alliciaram, pois que só a qualidade de realista é para os perversos sufficiente pretexto para os seus maleficios.

Deus guarde a v. ex.a muitos annos. Ilha do Faial, 28 de junho de 1828.-Ill." mo mo e ex." sr. José Antonio de Oliveira Leite de Barros, ministro e secretario de estado dos negocios da marinha e ultramar. -Antonio Izidoro de Moraes Ancora, tenente coronel ajudante de ordens do governo dos Açores.

Officio do governo interino d'Angra sobre as occorrencias que constam do officio anterior; 22 de junho de 1828.

Participamos a v. s. que hoje o batalhão de caçadores n.° 5 tomou a briosa deliberação de restaurar a legitimidade do senhor D. Pedro IV e de sua augusta filha a senhora D. Maria II, nossa rainha, e foi pelo mesmo batalhão preso o governador e capitão general, e immediatamente se nomeou, na conformidade da lei, o governo interino. (Segue a ordem para se retirar a Angra o destacamento do batalhão de caçadores que houver na ilha.)

a

Deus guarde a v. s.a Sala do governo, 22 de junho de 1828. João José da Cunha Ferraz José Jacintho Valente Farinho-José Rodrigo de Almeida.

N." 2

Ordem do dia de 26 de junho de 1828.

mo

Quartel do governo da comarca da Horta, 26 de junho de 1828. --Ordem do dia.-O. ill. sr. governador militar da comarca, tendo ultimamente recebido a funesta noticia de que o 5.o batalhão de caçadores, estacionado na cidade de Angra, tomou no dia 22 do corrente mez a heroica deliberação de restaurar a legitimidade do senhor D. Pedro IV e de sua augusta filha a senhora D. Maria II, tem a maior satisfação em o fazer constar aos corpos da primeira e segunda linha d'esta ilha, persuadido como está de que todos os individuos que os compõem não podem deixar de possuir-se do maior jubilo, vendo que os seus camaradas consegniram restituir os habitantes d'aquella cidade e de toda a ilha à legitima observancia das soberanas determinações dadas pelo senhor D. Pedro IV em 29 de abril de 1826, observancia de que se não têem desviado os dignos habitantes d'estas duas ilhas, e especialmente os corpos da guarnição d'esta villa.

Tendo o batalhão 5.° de caçadores prendido o governador e capitão general d'estas ilhas no referido dia 22. foi logo installado um governo interino na cidade de Angra, a qual o ill.mo sr. governador militar ten pedido alguns esclarecimentos, que espera receber com a maior brevidade; e como a esse tempo terá de fazer embarcar para aquella cidade as praças do 5.° batalhão de caçadores, que aqui se acham destacadas, ordena o ill.mo sr. governador que estas se apromplem para o embarque, que deverá ter logar logo que chegue a resposta ao officio que dirigiu.

Espera o illmo sr. governador que o augmento d'esta força, e do que d'aquelle batalhão se acha em S. Miguel, será sufficiente para conservar o sorego publico na cidade de Angra; mas quando para esse fim fosse necessario destacar d'aqui alguma força da companhia de linha. está o ill. sr. governador bem certo de que os individuos que a compozessem. gostosos aproveitaram uma tal occasião de fazer um dis tincto serviço. Domingos de Sillos Teixeira da Cunha, alferes ajudante de ordens do governo militar da comarca.

mo

Está conforme a uma copia que me foi apresentada por pessoa de toda a fé e conceito. Antonio Izidoro de Moraes Ancora, tenente coronel ajudante de ordens do governo dos Açores.

Officio de Manoel José Coelho Borges sobre a revolta em Angra a favor da causa liberal; 30 de junho de 1828.

Imo ex. mo sr. Posto que me não julgue auctorisado para ler a hora de me dirigir a v. ex. por uma maneira official; comtudo,

a