A esperança do bem tenho perdida. De todo entregue vejo A quem, inda que brade, não responde; Ja debaixo da terra este qu'eu chamo, Aquelle a quem agora estou rendida. Ai quão devagar passa a triste vida! Que gloria, Amor cruel, com meu tormento, Que louvor a teu nome accrescentaste? Ou que te constrangeo a tal crueza, Mas tu como somente De ver-me estar morrendo te contentas, Quando mais me atormentas, Então desejas mais d'atormentar-me; E não queres matar-me Porque este mal de mi se não despida. Onde cousa acharei que alegre veja? Qu'inda não esperasse A seus males remedio achar vivendo: Hum mal tão grave e tão desesperado, Quanto a vida com elle he mais comprida. Arvoredo sombrio, verde prado, Qu' eu tenho a lingua muda, O alento me vai ja desamparando. Mas quando (ai triste!) quando D'hum dia hum' hora me virá contente, Qu'eu te veja presente, Pastor meu, e comtigo est' alma unida? Mas não sei se he sobrado atrevimento Que despois que lá vires meu tormento, Eu estou bem segura Que has lá de receber-me brandamente. Quão cara huma isenção com Amor custa: A hum' alma que lhe he pouco agradecida. Ai quão devagar passa a triste vida! D E S. ODE I. Detem hum pouco, Musa, o largo pranto Que Amor te abre do peito; E vestida de rico e ledo manto, Demos honra e respeito, Aquella, cujo objeito Todo o mundo allumia, Trocando a noite escura em claro dia. Ó Delia, que a pezar da nevoa grossa, Co'os teus raios de prata A noite escura fazes que não possa E o que n'alma retrata Amor por teu divino Raio, por qu'endoudeço e desatino : Tua candida fronte e faces bellas; Co'as rosas que semeias, Co'as boninas que gera O teu celeste humor na primavera: Suas sombras formosas; Para ti o Erymantho e o lindo Pylio As mais purpureas rosas; E as drogas mais cheirosas Desse nosso Oriente Guarda a felice Arabia mais contente. De qual panthera, ou tigre, ou leopardo Não temêrão teu fero e agudo dardo, Mais remotas e estranhas Ligeira atravessavas, Tão formosa que a Amor d'amor matavas? Pois, Delia, do teu ceo vendo estás quantos Furtos de puridades, Suspiros, mágoas, ais, musicas, prantos, As conformes vontades, Humas por saudades, Outras por crus indicios Fazem das proprias vidas sacrificios: E teu nome, co' os olhos feitos fontes, Pedindo (suspirando) Mercês á tua beldade, Sem que ache em ti hum'hora piedade. Por ti feito pastor de branco gado Nas selvas solitarias, Só de seu pensamento acompanhado, |