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De todo Amor contrárias,

Mas não como ti duras,

Onde lamenta e chora desventuras.

Das castas virgens sempre os altos gritos, Clara Lucina, ouviste,

Renovando-lhe as forças e os espritos:
Mas os daquelle triste,

Ja nunca consentiste

Ouvi-los hum momento,

Para ser menos grave o seu tormento.
Não fujas, não de mi! Ah não t'escondas
D'hum tão fiel amante!

Ólha como suspirão estas ondas,

E como o velho Atlante

O seu collo arrogante

Move piedosamente,

Ouvindo a minha voz fraca e doente.

Triste de mi! Qu'alcanço por queixar-me,

Pois minhas queixas digo

A quem ja ergueo a mão para matar-me,
Como a cruel imigo?

Mas eu meu fado sigo,

Que a isto me destina,

E qu'isto só pretende e só m'ensina.

Oh quanto ha ja que o Ceo me desengana!

Mas eu sempre porfio

Cada vez mais na minha teima insana.

Tendo livre alvedrio,

Não fujo o desvario;

Porque este em que me vejo

Engana co'a esperança o meu desejo.

Oh quanto melhor föra que dormissem
Hum somno perennal

Estes meus olhos tristes, e não vissem
A causa de seu mal

Fugir, a hum tempo tal,

Mais que d'antes proterva,

Mais cruel que ursa, mais fugaz que cerva!
Ai de mi, que me abrazo em fogo vivo,
Com mil mortes ao lado;

E quando morro mais, então mais vivo!
Porque tee ordenado

Meu infelice fado,

Que quando me convida

A morte, para a morte tenha vida.

Secreta noite amiga, a que obedeço,
Estas rosas (por quanto

Meus queixumes me ouviste) te offereço,
E este fresco amaranto,

Humido ja do pranto,

E lagrimas da esposa

Do cioso Titão, branca e formosa.

O DE II.

Tão suave, tão fresca e tão formosa,
Nunca no ceo sahio

A Aurora no princípio do verão,
Ás flores dando a graça costumada,

Como a formosa mansa fera, quando
Hum pensamento vivo m'inspirou,
Por quem me desconheço.

Bonina pudibunda, ou fresca rosa,
Nunca no campo abrio,

Quando os raios do sol no Touro estão,
De côres differentes esmaltada,

Como esta flor, que os olhos inclinando,
O soffrimento triste costumou

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Ligeira, bella Nympha, linda, irosa, Não creio que seguio

Satyro, cujo brando coração

D'amores commovesse fera irada,
Qu'assi fosse fugindo e desprezando
Este tormento, donde Amor mostrou
Tão próspero começo.

Nunca, emfim, cousa bella e rigorosa
Natura produzio,

Qu'iguale aquella fórma e condição,

Que as dores em que vivo estima em nada. Mas com tão doce gesto, irado e brando,

O sentimento, e a vida m'enlevou,

Que a pena lhe agradeço.

Bem cuidei d'exaltar em verso, ou prosa,

Aquillo que a alma vio

Entre a doce dureza e mansidão,

Primores de belleza desusada;

Mas quando quiz voar ao ceo cantando,
Entendimento e engenho me cegou
Luz de tão alto preço.

Naquella alta pureza deleitosa
Que ao mundo s'encobrio;

E nos olhos Angelicos, que são
Senhores desta vida destinada;
E naquelles cabellos, que soltando
Ao manso vento, a vida me enredou,
M'alegro e m'entristeço.

Saudade e suspeita perigosa,
Que Amor constituio

Por castigo daquelles que se vão;
Temores, penas d'alma desprezada,
Fera esquivança, que me vai tirando
O mantimento que me sustentou,
A tudo me offereço.

Amor isento a huns olhos m'entregou, Nos quaes a Deos conheço.

O DE III.

Se de meu pensamento

Tanta razão tivera d'alegrar-me,

Quanto de meu tormento

A tenho de queixar-me,

Puderas, triste lyra, consolar-me.

E minha voz cansada,

Qu'em outro tempo foi alegre e pura,

Não fora assi tornada,

Com tanta desventura,

Tão rouca, tão pezada, nem tão dura.

A ser como sohia,

Pudera levantar vossos louvores;

Vós, minha Hierarchia,

Ouvireis meus amores,

Qu'exemplo são ao mundo ja de dores.

Alegres meus cuidados,

Contentes dias, horas e momentos,
Oh quanto bem lembrados

Sois de meus pensamentos,

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Reinando agora em mi duros tormentos!

Ai gostos fugitivos!

Ai gloria ja acabada e consumida!

Ai males tão esquivos!

Qual me deixais a vida!

Quão cheia de pezar! quão destruida!

Mas como não he morta

Ja esta vida? como tanto dura?

Como não abre a porta

A tanta desventura,

Qn' em vão com seu poder o tempo cura?

Mas para padecê-la

S'esforça o meu sogeito e convalece;

Que só para dizê-la,

A força me fallece,

E de todo me cansa e m'enfraquece.

Oh bem affortunado

Tu, que alcançaste com lyra toante,
Orphêo, ser escutado

Do fero Rhadamante,

E co'os teus olhos ver a doce amante!

As infernaes figuras

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