Espectros Espectros que velaes, emquanto a custo Adormeço um momento, e que inclinados Sobre os meus somnos curtos e cansados, Me encheis as noites de agonia e susto!... De que me vale a mim ser puro e justo, E entre combates sempre renovados Disputar dia a dia á mão dos Fados Uma parcella de saber augusto. Se a minh'alma ha-de vêr, sobre si fitos, Bem os sinto verter sobre o meu leito, ANTONIO CANDIDO GONÇALVES CRESPO (1846-1883) EM nunca atingir a superioridade de conceção de Antero de Quental, G. Crespo guindou-se por vezes a uma notavel perfeição. A sua obra Miniaturas e Nocturnos foi consagrada principalmente pela sua harmonia ritmica, de que o so neto Mater-dolorosa é um feliz espécimen, ao mesmo tempo que um modelo na pintura do quadro. G. Crespo nunca se deixou eivar do sentimentalismo de João de Deus, nem tambem rompeu com os modelos antigos, convertendose á poesia de idéa, mais que de coração. Na harmonia e na descrição do assunto foi superior no soneto Mater-dolorosa, porém esse assunto comparado ao de qualquer dos sonetos dos ultimos anos da vida de Antero é banal. Morreu bem novo, o que impediu que deixasse uma obra vasta. Quanto nos ficou dêle resume-se em poesias historicas, velho tipo romantico, e peças ligeiras liricas. Foi principalmente ás primeiras que êle deveu a sua celebridade pela facilidade do verso, a harmonia e a arte do dialogo. Ainda hoje são lidas com justo agrado as Primeiras lagrimas de el-rei e a Resposta do Inquisidor. Dos sonetos apartam-se os dois seguintes, o segundo dos quaes tem a impecabilidade da perfeição. Odor di Femina Era austero e sisudo; não havia Uma vez que na extensa livraria De que morrêra o venerando frade? Consta que um bibliophilo comprára Mater-dolorosa Quando se fez ao largo a nave escura Dos céus a curva era tranquilla e pura. Nas ondas se atufára o sol radioso, De alvôr banhando os alcantís das fragas... E aquella pobre mãe, não dando conta Que o sol morrêra, e que o luar desponta, A vista embebe na amplidão das vagas. |