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mentos; e tú retendo os Trombetas, que te mandão pessoas livres, pelo meio de todos os inimigos fazes, que em ti vejamos, e pratiquemos Leis novas em nossos officios. Pelo que tú nunca terás honra jamais para com pessoas de merecimento, nem farás mais, que abocanhar a carne Christă; mas a Justiça Divina te castigará como tú mereces, e me dará graça, que tú, e os teus proveis a cortezia Franceza, cahindo nas minhas mãos, a qual eu te prometto em vingança de tuas crueldades, que eu poderei executar sobre ti, e sobre os teus, que cá tenho no Forte S. Luiz sendo doze salvagens, a que faço melhor tratamento, que posso. Por tanto não te ensoberbeças havendo espantado huns poucos de salvagens, os quaes te deixárão nas mãos alguns oitenta homens dos meus Francezes, governados pelo meu Tenente mancebo, e bravo Capitão, e experimentado na guerra, se jamais o houve, que foi morto na primeira occasião em que aqui se achou. Tambem havia outro bravo, e experimentado na guerra chamado Mons. du Prat, o qual me veio achar depois da defensa, que fez fazer aos Francezes, e Salvagens, de que não tirassem em modo algum do mundo em quanto durava o parlamento, e esta foi a causa, que tú a tão bom preço os tomaste contra toda a Lei da Guerra, violando tudo o que nella se pratica. O Senhor du Prat virou o rosto á larma, e vendo a desordem se poz a resistir, e vendo o atrevimento dos teus, e sua audacia acompanhou os seus pelejando até que te vio senhor do campo, e depois se salvou, e está com saude, donde me assistirá bravamente a tomar razão de teus crueis effeitos. Tú tens sómente a honra de ficar com a praça, a qual eu espero haver bem cedo, porque ainda me ficou assaz gente de bem para executar meu desenho, sem ter necessidade daquelles, que mandei ao Pará, os quaes espero cada dia, e outros muitos de França; e assim esperarei tambem tua resposta, sobre o que acima te digo, a qual me podes mandar sobre minha fé, e palavra, que eu nunca jamais quebrei, nem o farei. Porque tenho vinte e cinco annos de Governador de gentes, pelo que se te mostrares Christão, faze boa guerra aos meus, e manda-me o meu Trombeta, se não queres que á tua vista te faça enforcar em 54 horas todos os teus assim Portuguezes, como Salvagens. Este teu mortal inimigo. Diante do Forte S. Simão aos 21 de Novembro 1614.

Ravardiere.

Senhor Ravardiere. El-Rei Catholico de Hespanha nosso Senhor me mandou a este Rio Maranhão com o Capitão, e Sargento Mor de todo este Estado do Brazil Diogo de Campos meu collega, e muitos homens Nobres, Fidalgos e Cavalleiros de diversas gerações de Portugal, de que realmente eu tenho muita honra, e tanto me fio de sua companhia, que tenho dois filhos commigo nesta empreza, na qual nunca me persuadi, que tinha parte o Christianissimo Rei de França, nem os Francezes Nobres, que se me nomeão. Pois he de crer, que

sendo o meu Rei Emperador deste novo mundo ha mais de cento e doze annos, que não dará parte delle a outro Principe, e se lha der, que lha não tornará a tirar; pelo que sobre o titulo de nossa vinda não ha que disputar, que se os Reis o hão de averiguar, mal faz quem faz a guerra, e se as armas, escusadas são palavras.

Por averiguar duvidas, e saber quem estava nessa Ilha, mandei os dias passados os meus Indios com a paz á mesma Ilha, e tomarãomos os Francezes, della vierão outros a buscar-me com engano, dissimulei, e mandei-os livres; depois disto vierão os Francezes de Itapari a esta coroa de areia, que me jaz defronte, e pozerão bandeira branca de paz, a que logo acudi com um barco, em que hia um filho meu, e hum Capitão da Casa Rangel para ver sua falla: vierão com armas cubertas os Francezes, e tanto que entenderão poder damnar aos meus, lhes tirárão cruelmente muitos golpes de arcabuz, e mosquete. Eisaqui, Senhor Ravardiere, quem por trez vezes rompeu, e violou a lei das gentes, e do primor da guerra, e quem se fez incapaz de fidelidade: passadas estas coisas vierão os Francezes a tomar dois pobres cascos de navios desarmados a meus pobres marinheiros, os quaes estavão á boa fé no mar d'ElRei nosso Senhor, sem fazerem mal a pessoa, e foi a interpreza a horas, e termos pouco valentes, em fim ficamos lastimados de tanta ousadia, e má visinhança. Passado isto, Senhor Ravardiere, vierão os Francezes em nnmero grande com todas as forças do Estado dos Indios destas Comarcas enganados para nos comerem, e tirarem a vida á fome, e sede, e ao cutelo, e andando-nos apercebendo para a nossa defeza, mandarão hum Trombeta não sei de quem, o qual queria, que dentro em quatro horas nos rendessemos; e em quanto fallava com meu companheiro Diogo de Campos, a gente Franceza desembarcava, e os Salvagens se chegavão, os Francezes astuciosamente se fortificavão; sendo assim, que cada crime destes he intoleravel: Pelo que, seguindo-se o effeito pela nossa parte, começando, a Deos graças, o Trombeta ficou salvo, e a vosso serviço, e vos dou palavra de o mandar quando for tempo por minha cortezia, e vossa boa tenção; não pelo merecimento da causa, que já vai declarado para diante dos que da nossa arte mais entenderem. Do sangue, que se derramou de Francezes, e Portuguezes, Deos he testemunha, que não tenho eu a culpa, a quem a tiver elle dará a pena. Por tanto se os meus que lá estão enforcardes, mal fareis aos vossos, que cá tenho, que são nove com o Trombeta, e um vosso Tambor, mas il será, comme vous plairă.

Todos os mortos Francezes fiz enterrar como pude; não como merecem, se delles algum he necessario, ou os ossos, podem livremente vir por elle, sem nenhum interesse: a muitos salvei a vida, mas os Salvagens, que vem commigo, confesso, que são mais crueis, que os vossos, não para comerem carne humana, e assim he fabula, que faltou perna, nem braço a nenhum Francez, e isto sobre minha honra, antes a hum soldado meu valeroso de casaca grisante, que morreu pelejando dentro já na cerca, os vossos Tapuias,, ou Salvagens lhe cortarão hum braço, e sem elle foi á terra; nem me maravilhei disso, porque sou velho, e ha muitos annos, que ando nestas

coisas, e por derradeiro sei, que será o que Deos quizer. Dada no forte Santa Maria no Rio Maranhão a 24 de Novembro 1644.

Jeronymo de Albuquerque.

Andava fóra á caça, por tanto não mandei a resposta mais cedo: as cartas dos meos vi, fallão verdade: mas póde alguem enganar-se com ellas, torno-as a mandar, para que as vejão mais de espaço.

Senhor de Albuquerque. Tenho visto pela tua a boa guerra, que tens feito aos meus Francezes, que eu governo, e assim estou mui alegre, e crê de mim hum natural, que jámais ficará vão de cortezia, e que assim tudo te pagarei em dobro, quando Deos me der occasião. Peço-te, que me mandes os nomes dos meus, a quem tú salvaste a vida, e não creias, que se te dará por isso hum só enojo, e assim me avisa, quando me dás tua palavra, e tua fé para que eu mande hum Fidalgo dos meus a vêr o corpo do meu lugar Tenente General, homem de Casa illustre, e se tú m'o queres mandar buscar por alguem, eu te dou minha fé, e minha honra, que póde vir, e tornar seguramente; e assim se alguem dos teus Padres quizer vir, eu lhe farei, que veja os nossos, e responderei de viva voz a todos os pontos da tua Carta a pessoa, que mandares, ou a quem lá for sobre tua palavra, na qual me fio tanto, como tú te podes fiar da minha, pois que t'a dou como Christão verdadeiro, e servidor fiel do meu Rei, e teu amigo. Manda-me dizer, se me dás a palavra para ir lá o Capitão Malharte, que tú já viste em Pernambuco; e assim te rogo, que me faças escrever em Francez, ou em Hespanhol pelos teus, que tú tens, que sabem de tudo. Dada em 22 de Novembro de 1614.

Ravardiere.

Senhor Ravardiere. Mais obriga aos cavalleiros portuguezes um termo cortez do que a força das armas, e assim dou minha palavra que afóra a guerra que trazemos, tudo o que for do gosto e serviço do Senhor Ravardiere, hei de faze-lo muito a ponto. Logo que recebi esta segunda mensagem, enviei dous capitães com dous Francezes, eo trombeta, em busca do corpo de Mr. de Pizieux; e mal baja a fortuna e desconfiança que de mim se teve, que se elles não pelejassem tam valerosamente, e se quizessem render á minha pessoa, o que tanto se lhes rogava; sostendo o impecto dos meus, todos estariam hoje vi

vos; ou pelo menos, se no mesmo dia da batalha fosse avisado, como em taes casos se costuma, para enterrar os mortos, podera estar feito o que á amisade e lealdade de taes homens se devia, e por vida de meus filhos que os houvera sepultado mui de outra maneira. Porém como cousa sem noticia, fi-los enterrar á volta dos meus, para quem todo o bosque é mui honrada e ditosa sepultura; e deste geito, pelo que toca aos mortos, tenho feito a devida diligencia.

O trombeta dirá como ficamos, e eu direi que melhor tractamento The houveramos dado, se estivessemos na nossa patria; mas como somos homens para quem um punhado de farinha e um pedaço de cobra (quando os ha) é sustento sobejo, quem com isto se não accommodar, ha de, certo, fugir a nossa companhia.

Com os demais prisioneiros tenho ainda que averiguar certas diligencias, que fazem ao serviço de El-rei meu senhor, concluidas as quaes, se tractará de dar gosto a todos Entretanto se parecer conveniente, poderá vir á terra algum Francez dos mais qualificados, para que vá tambem um Cavalleiro portuguez dos meus a tractar de viva voz os mais pontos, como se me promette, advertindo que nisto vae a fé de M. de la Ravardiere, e de Jeronimo de Albuquerque, e não haverá quem seja capaz de nodoa-las. Feita no forte de Santa Maria no rio Maranhão em 22 de Novembro de 1614. (*)

Jeronimo de Albuquerque.

Meu Senhor de Albuquerque. A clemencia de aquelle grande Capitão de Albuquerque, Vice-Rei da Magestade D. Manoel nas Indias Orientaes apparece em vós na cortezia, que fazeis aos Soldados Francezes meus, e a sepultura, que haveis dado aos meus mortos, entre os quars tenho hum que amei em vida como a irmão, porque era brabo, e de boa casa: eu louvo a Deos com tudo esperando que, se tornarmos ás mãos, tomára minha justa causa, e minhas coisas nas suas. Para responder a vossa Carta, como vier assinada, a mandarei communicar ao resto dos meus Capitães, e lida se vos dará a resposta, fiando-me inteiramente na vossa fé, e palavra, tanto que vier o vosso sinal posto assi, como vós vedes na minha: eu vo-la mando, e não digo por hora outra coisa, senão que honrarei a casa, e nome dos d'Albuquerques. Feita ante o forte de Santa Maria a 23 de Novembro 1614 no Maranhão.

Ravardiere.

(*) Esta carta está em Hespanhol no opusculo de Diogo de Campos.

Senhor de Albuquerque. Tenho considerado os pontos principaes da vossa Carta, e conforme aos discursos, que vós tendes feito ao meu Trombeta, parece que tudo não attende mais, que á paz. Por esta banda de cá, como os nossos Reis tem pela parte della com muito estreita liança, e como me fallarão em Suas Magestades, logo me resolvi com meus Capitães, que não he possivel terdes soccorro por mar. Todavia vos quero ouvir sobre o que me quereis propôr á cerca do de cima, e isto tanto de palavra, como por escripto por aquellas pessoas, que me mandardes, sejão quem forem, eu vos dou minha fé, e minha honra em penhor, que podem vir seguramente, e tornar quando quizerem; e se for servido o Senhor Diogo de Campos de vir, eu serei contentissimo, porque falla Francez, e nós havemos feito a guerra hum contra outro servindo nossos Reis, quando elle andava com o Principe de Parma, segundo me disserão. Eu lhe beijo as mãos com vossa licença, e o mesmo faço a vós ambos. Vosso servidor.

Ravardiere.

Peço-vos, que sempre me escrevaes em Francez, ou bem Hespanhol; porque não podemos ás vezes achar de pressa o sentido de Vossas Cartas. Feita diante do forte Santa Maria a 25 de Novembro 1614.

Senhor Ravardiere. Tenho a satisfação de vos enviar o capitão Diogo de Campos, meu companheiro, e outro capitão de infantaria, para tractarem dos pontos, a que por ora não respondo, confiando que se usará com elles a cortezia em taes casos costumada; mas para que guardemos os estilos da guerra, não obstante a grande confiança que tenho em vossa fé e palavra, convem que venham á terra de vossa parte um cavalleiro de S. João, que tendes ahi, e o capitão Malharte, que ha de conhecer-me. O capitão Diogo de Campos, e eu, vos beijamos as mãos uma e mil vezes; quanto á segurança da minha parte, sempre a darei, e dou com os termos devidos. Dada no forte de Santa Maria em 25 de Novembro de 1614.

Jeronimo de Albuquerque. (*)

Luiz, pela graça de Deos Rei de França, e de Navarra, & A todos aquelles, que as presentes letras virem, saude. Fazemos sa

(*) Esta tambem he traduzida do original hespanhol.

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