Exc. nunca the quizerão declarar: estes aduladores tem compromettida a V. Exc., feito offuscar as suas brilhantes virtudes, e irritado tanto os Povos, que tiverão a necessidade de lançar mão dos ultimos recursos; em fim das armas para reassumirem os seus direitos, e ficarem salvos dos males, que os opprimião. Basta portanto de escravidão, de oppressão, de prizões, e de exterminios de vassallos só por clamarem que os deixassem gosar da liberdade, e da paz, que o seo Soberano lhes havia concedido, e garantido por tantas ordens, e De cretos. Os habitantes de toda a Provincia estão unidos, e de commum accordo para levarem ao fim o plano da sua regeneração: tem havido tempo bastante para esta colligação; e cada uma oppressão que temos sentido, he um laço novo, que nos liga, e a installação do Governo he a prova mais decisiva da resolução constante dos Povos. As armas da terra estão á parte dos Povos, por que estes são opprimidos, e os mesmos opprimidos são os soldados, os officiaes, e Commandantes das Forças, que defendem a causa. O Governo porem não confia tanto nesta força, que está á sua disposição, quanto confia na justiça da sua causa, nas bases, em que tem fundado a sua authoridade, e nos exemplos de outros semelhantes procedimentos, que ja tem sido approvados pelo Soberano, e legitimados pelas Cortes de Lisboa. Declaramos finalmente que o Governo installado em Goianna só he para annunciar, e declarar a V. Exc. a vontade e resolução dos Povos; e que durará somente em quanto na capital de Pernambuco não se installar outro para fazer render este actual. Confiamos portanto, que V. Exc. cedendo á razão, e ás actuaes circunstancias, se digne installar um Governo Constitucional na Capital de Pernambuco para soccego dos Povos, e deixar de ensanguentar esta Provincia: nós protestamos a V. Exc. por toda a opposição, que houver de fazer contra esta pertenção justa dos Povos, por toda a perturbação, que motivar, e sangue que se derramar, perante ás Cortes do Reino, com quem V. Exc. contrahirá a mais restricta responsabilidade. Deos guarde a V. Exc. muitos annos. Salla do Governo Constitucional de Goianna 30 de Agosto de 1821. Illm. e Exm. Sr. Luiz do Rego Barreto, General de Pernambuco.Francisco de Paula Gomes dos Santos, Presidente.-José Camello Pessoa de Mello.-João Carlos de Mello e Araujo.-Manoel Ignacio de Mello, Capitão,e Commandante da Força.--Joaquim Martins da Cunha Soutomaior. -Joaquim Francisco de Mello Cavalcanti, Capitão, e Commandante do 70 Batalhão.-Miguel Pessoa de Araujo, Caitão —Joaquim Cavalcanti de Albuquerque, Capitão Commandante da 4a meia Brigada.—José Jeronimo de Albuquerque, Capitão da 4a Companhia do 15 Batalhão e Commandante.-Joaquim José de Mello Torres, Alferes.-João Gomes Ferreira de Abreo e Mello, Capitão e Commandante do 14 Batalhão.-José Romão da Costa e Souza. 1 5.o Discurso em Sessão. Senhores.-Sendo extraordinarias as circunstancias em que nos achamos, e vendo-me eu compromettido inteiramente com os resultados destas turbulencias em que nos vemos, se não houver alguma declaração desta Junta sobre o estado presente das cousas; e alem desta um assentimento geral ás medidas que se houverem de tomar para tranquilisar a Provincia; preciso explicar-me aqui, e chamar a attenção de Vs. Ss. a um objecto, que me parece merecer toda a seriedade. Eu tenho desde o dia 3 de Março posto em pratica os meios possiveis para manter a paz entre todos os habitantes. Bem me hão calumniado; e tudo hei soffrido na esperança do promptismo termo da minha commissão. Vs. Ss. todos quantos aqui se achão o sabem perfeitamente. He innegavel que o primeiro que quiz sacrificar esse fantasma de authoridade, que tantos attractivos tem para quem não cura de seus incertos resultados, fui eu, que no mesmo dia 3 de Março offereci mudar a forma do Governo á vontade do Povo; e o Povo, e os homens mais conspicuos recusárão este offerecimento. Na assemblea a que chamei muito depois os Deputados da Provincia fiz repetidas vezes o mesmo offerecimento, e tive o mesmo resultado: a despeito dos meos esforços. Continuei pois a governar contra o meo gosto, ainda que me via coadjuvado pelo Conselho Consultivo, que requeri de proposito para me não expor em tempos criticos aos erros que poderião provir dos dictames de um só homem. Mas nem por isso me livrei de inimigos, que progressivamente forão crescendo, como era de esperar; porque abalados de uma vez os animos continua o movimento sempre a mais, se não ha uma força que o sostenha. Essa não a houve, ao menos julgou-se geralmente, que se não podia fazer uso della. A chegada dos presos da Bahia foi fatal a esta Provincia: eu bem o vi; e buscando todos os meios possiveis para adoçar o rancor de que muitos vierão minados, não o pude conseguir. Os desgraçados partidos Europeo e Brasileiro, que não tem cessado de existir desde 4847 revivêrão mais fortes de repente com a chegada desses homens. Os clubs, que ate então havia com alguma cautella, tornarão-se frequentes, e feitos ás claras. Não houve mais medida do Governo que não causasse escandalo; fervião os pasquins mais injuriosos contra mim; formarão-se immensos ajuntamentos, mil queixumes resoavão contra a minha supposta tyrannia, fui taxado de despota feroz; e no meio destes ruidos se maquinou a minha morte. Entretanto clamava toda a gente Europea que estava vendida, que os que vierão da Bahia tornavão aos seus empregos, que eu os recebia em minha casa, que me trahirião, que em breve rebentaria nova revolução, que esta seria cruelissima, que havia de acarretar vinganças terriveis, que a segurança publica estava em perigo. E quando eu com todo o disvello procurava affastar estes receios fui ferido mortalmente á traição. Este successo acabou de exacerbar os animos. No mesmo momento se julgárão perdidos os Europeos: corrêrão espontaneamente as milicias a unir-se ao 2 Batalhão do Exercito de Portugal, o Povo do mesmo modo; os clamores forão terriveis: prendeo-se essa gente que para Lisboa se mandou: quiz eu que se soltassem alguns individuos que mais innocentes me parecêrão: pouco faltou para haver uma sedição; e não tive outro remedio se não deixallos hir. Poucos dias depois tractei de abandonar de todo o governo: communiquei o meo projecto ao Ouvidor da Commarca; fiz sciente do mesmo aos Srs. Mairink, e Moraes, que aqui presentes se achão: elles approvárão a minha determinação. Esperava restabelecer-me um pouco mais; porem no dia 29 do passado á noite soube que a Vilia de Goianna havia sido nesse mesmo dia sorprendida por gente armada, que proclamou um Governo provisorio, e a existencia do da Capital; e promettia que havia de durar aquelle em quanto na mesma Capital outro se não cregisse. Chamei a Conselho os Officiaes Commandantes com assistencia do Desembargador Antero José da Maia: conveio-se do que eu havia projectado. Escrevi á Camara desta Capital, pedindo-lhe que fizesse uma solemne convocação, e nesta a votos se elegesse outra fórma de Governo. Assim se fez. Constou-me que houve quem gritasse desmarcardamente ja contra mim, ja a meo pró; dizem que o numero destes ultimos era maior, que ouve tambem quem clamasse pela minha morte, que alguns efficiaes havião tirado as espadas, que tornarão a embaiuhar á simples voz do Sr. Moraes; mas em fim que se não derramára uma só gota de sangue; que o ruido se acabara, e que as mesmas Tropas, e Povo me havião reeleito General Governador. Isto me foi participado pela Camara, e abertamente o recusei por duas vezes, offerecendo-me apenas para governar acompanhado de pessoas, que o povo elegesse, com responsabilidade igual à minha: nisto se conveio, e eu tive a fortuna de achar-me com Vs. Ss. Comtudo o partido de Goianna foi subsistindo: annunciou-se-lhe a instauração do Conselho, ou Junta Governativa Constitucional; não a reconheceo, e unindo o aleive ao odio, escreveo que tinhamos sido nomeados entre baionetas, que havia corrido sangue, que as Igrejas se achavão atulhadas de tropas do Paiz, que gemião por unir-se a elles ; que as violencias, os roubos, e as atrocidades fervião; e finalmente que este Governo era intruso, que eu me devia retirar, que o Batalhão de Portugal era quem se oppunha á Constituição, e outros delirios infames com que pertendem illudir, e de facto tem illudido a gente do interior naquella parte da Provincia. Mandamos na direcção de Goianna o Tenente Coronel Cayola com alguma força; mas para levar a paz do que para fazer a guerra. O Dezembargador Ouvidor de Olinda, que marchou para aquella Villa, foi encarregado de fazer entrar essa gente nos seus deveres, offerecendo da nossa parte a admissão de um, ou dous membros de cada Camara neste Governo: nada obteve. Um momento de embriaguez causou a deserção vergonhosa da maior parte do 4o Batalhão de Caçadores : o Coronel Cayola a instancias do Ouvidor se havia retirado estando ja a umas quatro legoas de Goianna: o medo dominava naquella Villa; ninguem se atreveria a resistir, se quizessemos entrar á força; mas as medidas de paz causarão o revez da deserção, e o orgulho do partido opposto; e o Tenente Coronel Cayola retirou-se para Olinda. Nestes momentos de desgosto pela noticia do malogro das nossas medidas, forão os Desembargadores Antero, e Maciel encarregados de proposições pacificas, mas não opprobriosas para nós, e para a Capital. Chegarão hontem á noite; mas eu não tenho esperança alguma de que hajão concluido o negocio, visto a louca pertinacia dos do partido de Goianna em querer a Guerra na Provincia, principalmente nesta Villa. Elles nos dirão se o Desembargador Ochôa está retido por aquelle Governo, como me tem informado. As pertenções desses homens são absurdas, subversivas, escandalosas, e de fataes resultados. Tem-se-lhes (para não alterar a paz publica) feito todos os partidos, que o liberalismo, e a boa fé podem offerecer; mas elles querem dar a lei, querem fazer um Governo da sua facção, querem formar uma reunião numerosa em Olinda, querem entrar no Recife, e estabelecer aqui esse novo Governo. O povo, qne tem mostrado confiar em nós, desespera á idea de novo ajuntamento. Este he inteiramente impolitico. Vs. Ss. sabem quantos proprietarios tem abandonado esta Capital, o susto que nella reina; a população Europea treme por sua segurança; as vistas desses homens sem duvida são sinistras: os successos que se contão da Bahia parece indicarem suspeitas sobre os de Goianna; he preciso tractar da defensão desta terra. Ja eu disse, que com muito gosto partiria daqui, uma vez que se julgasse que a minha pessoa era o alvo dos tiros dos levantados. Vs. Ss. affirmarão-me que não. Eu não sou capaz de fugir dos perigos, mas he preciso cautellas: e para as tomarmos neste tempo desejo saber claramente se o Povo se quer defender. Eu vejo que nos devem cuidado tantos homens bons, tantos negociantes poderosos, tanto povo innocente, tanto cabedal em perigo; e ultimamente uma terra populosa, que pesa gravemente na balança dos interesses da Nação. Nós temos todos os meios de nos defendermos; não digo dessa gente, que nos ameaça, mas de muito mais numerosos, o aguerridos inimigos. Comtudo he preciso 4o que se saiba se o Povo quer defender-se, ou entregar-se. 2.0 No caso de querer defender-se, que façamos uma solemne declaração, e protesto de que nos defendemos dos inimigos da paz, que com o veo de amor á Constituição cobrem os mais perversos designios. 3o Que deve haver quem ajude a guardar o interior da terra das cila das de alguns traidores. 40 Que a gente miliciana nos auxilie. Ultimamente, Senhores, eu sou General da nossa Patria, e tão amante da Constituição da Monarchia como Vs. Ss. sabem: as minhas acções bem publicas tem sido: Vs. Ss as tem observado; e não só Vs, Ss., o Povo todo. Comtudo assim como eu estou prompto a dar a TOMO III. 8 vida em defensa desta grande povoação, assim pertendo que Vs. Ss. me ponhão a salvo da responsabilidade que me pode resultar do derramamento de sangue; para que se não diga o que tantas vezes se tem dito: ja que lanço fogo aos templos, ja que vivo acastellado, que roubo a fazenda publica, atropello as casas honestas; em fim Vs. Ss. sabem de que horriveis baldões hei sido cuberto por meus inimigos. Decidão pois Vs. Ss. sobre este objecto; chamem se quizerem a Camara, e aquellas pessoas que mais conspicuas lhes parecerem; fação-se os protestos e declarações precisas; que se o Povo quizer defender-se eu o defenderei. Hontem á noite vierão alguns Capitães de Navios surtos no Porto offerecer-nos duzentos homens, e tem elles que os offerecem para sua propria defensa: elles põem em mim alguma confiança; e a devem ter toda em Vs. Ss.; eu desejarei poder servir a todos de alguma utilidade. Porem se o Povo em geral se não quizer defender, eu devo logo, logo retirar-me; e não esperarei que um General Portuguez, que tem com honra servido a sua Patria se tracte com menoscabo, e desdouro; o que não estou com animo de soffrer, ainda que a vida perca ás mãos dos que ousarem insultar-me. E Vs. Ss., cujo caracter nobre, e honrado conhece todo Pernambuco, me darão a salva-guarda que hei mister para mostrar ao So berano Congresso, e a El-Rei que cumpri com os meus deveres; e nem offendi os habitantes do paiz, nem abandonei o posto por o não querer defender; mas sim porque o voto geral não foi a favor da defensa. Luiz do Rego Barreto. Manifesto do Governo Constitucional da Provincia de Pernambuco. Havendo-se nesta Capital eregido por voto das Tropas, e Povo della o Conselho, ou Junta Constitucional Governativa interina da Provincia, em consequencia de um officio do ex-Capitão General (actual Presidente da mesma Junta) á Camara desta Villa, em que recommen dava á mesma que chamasse aos seus Paços a Tropa, e Povo de todas as Classes, a fim de que por eleição geral se escolhesse um Governo; a Junta erecta depois da insistencia do mesmo ex-Governador e Capitão General em não querer continuar no seo cargo, passou desde logo a celebrar as suas Sessões, e a tratar da direcção dos negocios da Provincia. O primeiro objecto que mereceo a attenção da Junta foi esse punhado de homens, que em Goianna entrou de mão armada no dia 29 do passado. proclamando um novo Governo, que instaurou á força em quanto na Capital se não formasse outro. Formado este como fica referido, e propondo desde logo claramen |