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E este adeus derradeiro á patria disse,
Cortando-lhe o alento enfraquecido
Agora os sons, agora a voz quebrada:
Terra da minha patria! abre-me o seio
Na morte aomenos. Breve espaço occupa
O cadaver d'um filho. E eu fui teu filho...
Ein
que te hei desmer'cido, ó patria minha?
Não foi meu braço ao campo das batalhas
Segar-te louros? Meus sonoros hymnos
Não voáram por ti á eternidade?

E tu, mãe descaroavel, me ingeitaste.
Ingrata... Oh! não te chamarei ingrata;
Sou filho teu : meus ossos cobre aomenos,
Terra da minha patria, abre-me o seio.

>> Vivi : que me ficou da vida, agora
Que baixo á sepultura? Não remorsos,
Vergonhas não. Para a corrida senda
Sem pejo os olhos de volver me é dado.
E tranquillo direi : vivi ; — tranquillo
Direi : morro. Não dormem no jazigo
Os ossos do malvado! Não: contínuo,
Na inquieta campa estão rangendo
Ao som das maldições, deixa de crimes,
Legado ímpio dos maus. Eu socegado
Na terra de meus paes heide encostar-me....

» Ja me sinto ao lumiar da eternidade:

Veo, que ennubla, na vida, os olhos do homem,

Se adelgaça: rasgado, os seios me abre

Do escondido porvir... -Oh! qual te has feito,
Misero Portugal.-oh! qual te vejo,
Infeliz patria! Serves tu, princeza,
Tu, senhora dos máres!... Que tyrannos
As aguas passam do Guadiana? A morte,
A escravidão lhes tras ferros e sangue...
Para quem? Para ti, mesquinha Lysia.
Que naus são essas, que ufanosas surcam
Pelo esteiro do Gama? Pendões barbaros
Varrem o Oceano **,
", que pasmado busca,
Em vão! nas poppas descubrir as Quinas.
Em vão; da hastea da lança escalavrada
Roto o estandarte cai dos Portuguezes.

>> Cinza, esfriada cinza é todo o alcaçar
Da glória lusitana... Uma faísca,
Esquecida a tyrannos, la scintilla

Mas quam debil que vens, sopro de vida.
Um so momento com vigor no peito
O coração te pulsa. Exangue, enferma
So te ergues d'esse leito de miseria
Para cahir, desfallecer de novo.

» Onde levas tuas aguas, Tejo aurifero? Onde, a que máres? Ja teu nome ignora

* Os Hespanhoes.

** As naus hollandezas.

Neptuno, que tremeu de outrora ouvi-lo.
Suberbo Tejo, nem padrão aomenos
Ficará de tua glória? Nem herdeiro

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De teu renome?... Sim: recebe-o, guarda-o,
Generoso Amasonas, o legado

De honra, de fama, e brio: não se acabe
A lingua, o nome portuguez na terra.
Prole de Lusos, peja-vos o nome

De Lusitanos? Que fazeis? Se extincto
O paterno casal cahir de todo,
Ingratos filhos, a memoria antiga

Não guardareis do patrio honrado nome?

» Oh patria, oh minha patria!... >>

A voz, que afrouxa,

Interromperam sons desconhecidos

De voz de estranho, que na estancia humilde Entra do vate. « Perdoae, se ousado

Entrei, senhor; mas...>>

-« Quem sois vós? Ha inda

Homem no mundo, que a poisada obscura

D'um moribundo saiba?»

-« Cavalleiro,

Desde o alvor da manhan que vos procuro:

De Africa hoje cheguei... >>

« Ah! perdoae-me. Sois vós, conde? Voltastes? E que novas

Me trazeis? >>>

«Tristes novas, cavalleiro.

Ai! tristes. D'ésta carta que vos trago

Sabereis tudo. » -

Ao vate a carta entrega:
Do missionario* era, que dos carceres
De Fez a escreve. Saúdoso e triste,
Mas resignado e placido lhe manda
Consolações, palavras de brandnra,
De alívio e de esperança.. -« Extincto é tudo
N'ésta mansão de lagrymas e dores;
(As lettras dizem) tudo; mas a patria
Da eternidade, so a perde o impio.

Deus,

e a virtude restam: consolae-vos... >>

>> Oh! consolar-me... (exclama, e das mãos trémulas A epistola fatal lhe cai) Perdido

É tudo pois!... » No peito a voz lhe fica;
E de tammanho golpe amortecido
Inclina a frente, e como se passára,
Fecha languidamente os olhos tristes.
Anciado o nobre conde se aproxima

Do leito... Ai! tarde vens, auxílio do homem.
Os olhos turvos para o ceo levanta;

E ja no arranco extremo : « Patria, ao menos Junctos morremos... E expirou co'ʼn patria. »

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Fray Josepe Indio. Veja-se a nota do poema, pag. 204,

ANONYMO, Camões poema.

FIM DO PRIMEIRO VOLUME.

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