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LXXXIV.

Dest'arte em fim conformes ja as formosa
Nymphas, co'os seus amados navegantes,
Os ornão de capellas deleitosas

De louro, e de ouro, e flores abundantes:
As mãos alvas lhe davão como esposas:
Com palavras formaes e estipulantes
Se promettem eterna companhia,
Em vida e morte, de honra e alegria.

LXXXV.

Huma dellas maior, a quem se humilha
Todo o côro das nymphas e obedece,
Que dizem ser de Celo e Vesta filha,
O que no gesto bello se parece;
Enchendo a terra e o mar de maravilha,
O Capitão illustre, que o merece,
Recebe alli com pompa honesta e régia,
Mostrando-se senhora grande e egregia.

LXXXVI.

Que despois de lhe ter dito quem era,
C'hum alto exordio de alta graça ornado,
Dando-lhe a entender, que alli viera
Por alta influição do immobil fado,
Para lhe descobrir da unida esphera
Da terra immensa e mar não navegado
Os segredos, por alta prophecia,
O que esta sua nação só merecia:

LXXXVII.

Tomando-o pela mão, o leva e guia

Para o cume d'hum monte alto e divino,
No qual hua rica fábrica se erguia

De crystal toda, e de ouro pure e fino.
A maior parte aqui passão do dia
Em doces jogos e em prazer contino:
Ella nos paços logra seus amores,
As outras pelas sombras entre as flores.

LXXXVIII.

Assi a formosa, e a forte companhia,
O dia quasi todo estão passando
N'huma alma, doce, incognita alegria,
Os trabalhos tão longos compensando.
Porque dos feitos grandes, da ousadia
Forte e famosa o mundo está guardando
O prémio lá no fim bem merecido,
Com fama grande, e nome alto e subido.

LXXXIX.

Que as nymphas do Oceano tão formosas,
Tethys, e a ilha angelica pintada,

Outra cousa não he, que as deleitosas
Honras, que a vida fazem sublimada.

Aquellas preeminencias gloriosas,

Os triumphos, a fronte coroada

De palma e louro, a glória e maravilha, Estes são os deleites desta ilha.

XC.

Que as immortalidades que fingia
A antiguidade, que os illustres ama,
Lá no estellante Olympo, a quem subia
Sobre as azas inclytas da fama

Por obras valerosas que fazia,

Pelo trabalho immenso, que se chama
Caminho da virtude alto e fragoso,

Mas no fim doce, alegre e deleitoso;

XCI.

Não erão senão premios, que reparte
Por feitos immortaes e soberanos

O mundo co'os barões, que esforço e arte
Divinos os fizerão, sendo humanos:
Que Jupiter, Mercurio, Phebo, e Marte,
Eneas, e Quirino, e os dous Thebanos,
Ceres, Pallas, e Juno, com Diana,

Todos forão de fraca carne humana.

XCII.

Mas a fama, trombeta de obras tais,

Lhe deo no mundo nomes tão estranhos
De Deoses, Semideoses immortais,
Indigetes, Heroicos, e de Magnos.
Por isso, ó vós que as famas estimais,
Se quizerdes no mundo ser tamanhos,
Despertai ja do somno do ocio ignavo,
Que o ânimo de livre faz escravo.

XCIII.

E ponde na cobiça hum freio duro,

E na ambição tambem, que indignamente
Tomais mil vezes, e no torpe e escuro
Vício da tyrannia infame e urgente:
Porque essas honras vãas, esse ouro puro,
Verdadeiro valor não dão á gente:
Melhor he merecê-los sem os ter,
Que possui-los sem os merecer.

XCIV.

Ou dae na paz as leis iguaes, constantes,
Que aos grandes não dem o dos pequenos;
Ou vos vesti nas armas rutilantes,
Contra a lei dos imigos Sarracenos:
Fareis os reinos grandes e possantes,
E todos tereis mais e nenhum menos:
Possuireis riquezas merecidas,

Com as honras, que illustrão tanto as vidas.

XCV.

E fareis claro o Rei que tanto amais,
Agora co' os conselhos bem cuidados;

Agora co' as espadas, que immortais
Vos farão, como os vossos ja passados:
Impossibilidades não façais;

Que quem quiz sempre pôde: e numerados
Sereis entre os Heroes esclarecidos,

E nesta ilha de Venus recebidos.

Camões I.

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OS LUSIADAS.

CANTO DECIMO.

I.

Mas ja o claro amador da Larissea

Adúltera inclinava os animaes

Lá para o grande lago, que rodea
Temistitão, nos fins Occidentaes:
O grande ardor do sol Favonio enfrea
Co'o sopro, que nos tanques naturaes
Encrespa a água serena, e despertava
Os lirios e jasmins que a calma aggrava:

II.

Quando as formosas nymphas co'os amantes

Pela mão, ja conformes e contentes,
Subião para os paços radiantes,

E de metaes ornados reluzentes;
Mandados da Rainha, que abundantes
Mesas d'altos manjares, excellentes,
Lhe tinha apparelhadas, que a fraqueza
Restaurem de cansada natureza.

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