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vasões do seculo v em França, na Italia, na Hespanha, no norte da Africa, sobre todo o dominio da cultura romana. O acordar d'essa quasi apagada cultura no fim do seculo XV, e seu influxo directo nas intelligencias do seculo XVI constituiu um verdadeiro Renascimento do genio helleno-italico na arte, na litteratura, nas ideias philosophicas e politicas entre as nacionalidades modernas. E' certo que essa germanisação foi attenuada pela infiltração christã entre os Frankos, Lombardos, Godos e Suevos, e até na propria Allemanha; mas a brutalidade guerreira systematisou-se socialmente na hierarchia feudal dos Barões e no absolutismo irrefreavel das Monarchias imperialistas ou militares. Mas os dois genios, radicalmente differentes, o germano e o latino, embora se repugnassem, cooperaram como factores na realisação do progresso humano. Ranke, na sua obra capital Historia das Nações germanicas e das Nações romanicas de 1495 a 1535, toma o quadro da civilisação moderna no momento em que termina a Edade Média pela renovação do espirito greco-romano, e os Humanistas iniciam a éra que se designou significativamente do Renascimento. O quadro é interessantissimo pela complexidade dos phenomenos sociaes em que os dois espiritos de novo se conflagram, mas sempre servindo um impulso, embora inconsciente, na marcha da civilisação moderna. A tentativa do imperador barbaro Ataulf de converter a unidade imperial da Romania, ou o mundo occidental em uma unidade germanica, ou Gothia, pela sobreposição das raças do norte, não se realisou, por

que esse exclusivismo de sangue fundiu-se no cosmopolitismo do genio latino, como o evidenciam as colonias hoje nações da America saxonia e da America latina, tão differenciadas no seu modo de sêr social, e tão interessadas no prolongamento da Civilisação occidental.

A paixão dos estudos humanistas no comêço do seculo XVI apodera-se da Allemanha, que se enriquece de Universidades meridionaes, imitando o genio latino pelos seus philologos e eruditos, como Erasmo, Reuchlin e Melanchton; mas essa harmonia moral, suscita novamente a impetuosidade germanica, na agitação da Reforma religiosa nascida da liberdade exegetica dos textos da Biblia. Escreve Jules Soury, confrontando os humanistas catholicos, eruditos orthodoxos, prelados ciceronianos, com a impetuosidade protestante: «A Refórma religiosa não poderia ter sido conseguida se não fosse a Renascença das Lettras; mas longe de ter nascido d'ella, foi pelo contrario uma reacção contra o espirito geral da Renascença.» Reacção contra o que chamavam o paganismo imperando na Egreja, nos cardeaes ciceronianos, no gosto das artes plasticas, na sumptuosidade artistica, n'esse espirito de franca admiração e de goso diante das obras primas da Antiguidade. O proprio Erasmo que visitou Roma, queixa-se de que os Cardeaes juram pelos Deuses immortaes, e receia que o culto pela Antiguidade faça retrogradar a Italia ao paganismo. Esta mesma má vontade se observa nos epigrammas de Ulrick de Hutten contra Julio II e Leão x. Como não havia de insurgir-se o

pobre frade augustiniano, Luthero, que tendo visitado Roma chama aos italianos os mais impios dos homens, motejando da verdadeira religião.» Ulrich de Hutten que estivera dois annos na Italia, serviu-se da cultura humanista para atacar em Satiras latinas o papa e a clericalha que ousavam perseguir Reuchlin. A coroação do poeta Hutten por Maximiliano em 1517, era o triumpho do espirito moderno, que ia irromper no protesto das 96 theses de Luthero contra a simonia romana.

Na Edade média duas raças se acham em contacto, a germanica, pela sua Realeza imperial impondo-se á cultura latina, que é. representada pela Egreja. As luctas entre o Sacerdocio e o Imperio não deixaram fundir-se estes dois elementos antagonicos em uma sociedade europêa progressiva. Uma Christandade e uma Gothia, esgotaram-se em conflictos temporaes; mas o sentimento religioso, pela sinceridade popular, estabelecera uma solidariedade europea denominada a Republica christā, a ponto de, na lucta das Cruzadas esse espirito da Republica christã impôr-se aos reis e chefes militares e mesmo a desobedecer-lhes. O espirito de reforma religiosa, que irrompe como exhortações mysticas no seculo XV, revela que findara a unanimidade dos crédulos; e nas luctas dos differentes estados, quer nos conflictos politicos procurando um novo equilibrio europeu, quer nas querellas religiosas, fulge um espirito que unifica as intelligencias em uma concordia: é a admiração das obras primas da Antiguidade classica, formando esse gosto uma Republica das Lettras. Ante ella não ha fronteiras na

cionaes; um mesmo sentimento se communica em cartas intimas entre todos os Humanistas italianos, portuguezes, francezes, allemães, hollandezes e hespanhoes. Emquanto os monarchas se combatem, é a Republica das Lettras que lhes atenua as furias destemperadas, humanisando-os no delirio da Monarchia universal, a que aspiram. Na Renascença do seculo XVI o Humanismo alenta o espirito universalista, os homens da Refórma, e o encanto dos eruditos, dos dignatarios ecclesiasticos, como Bembo e Sadoleto. Os papas, como Leão x, e os reis, como Francisco I, abrem as suas côrtes a esse espirito universalista. Mas quando esta concordia ia imprimir á sociedade europea o caracter civilista sobre o imperialismo medieval, um fermento de dissolução veiu lançar o cahos na marcha imponente do seculo XVI: a Realeza quer retomar o seu Imperialismo medieval, e a Egreja cavilla para restaurar a decahida Theocracia. Esse fermento foi uma recrudescencia do germanismo. Como em uma nova edade do mundo, começam as grandes guerras entre as Nações, em que o desenvolvimento do commercio, da industria, da navegação, das Litteraturas, das Artes, da consciencia religiosa e da educação scientifica, tornaram mais profunda a separação do Occidente e do Norte da Europa, do espirito latino e do esforço germanico. As Nacionalidades separadas pelos odios dos soberanos, desenvolvem se pela unidade de cultura, inicio da civilisação moderna, emquanto os politicos buscam um equilibrio europeu n'essas luctas da França de Carlos VIII, da Allemanha de Maximiliano, da

Italia de Sforza, na Hespanha de Fernando e Isabel. O pensamento ou doutrina da Monarchia universal, hallucina a cabeça de Carlos V, em que Hutten via, depois da eleição pelos magnates teutonicos, um Arminius symbolisando as luctas da Germania contra Roma; a mesma vertigem em Francisco 1, Henrique VIII, e os seus antagonismos é que tornam irrealisa vel o sonho imperialista, fazendo com que as duas correntes germanica e romana, como observa Ranke, se não absorvessem em uma tyrannia unica. Jacob Grimm, na sua Mythologia allemã, fundava no antagonismo germanico contra a cultura latina, representada no Catholicismo, a causa immanente do Protestantismo, que por esse ethos da raça, predominou nos tres ramos teutonicos, Germanos, Scandinavos e Anglo-Saxonios. A lucta pelo imperialismo germanico era uma aspiração ao nacionalismo, assim como na separação da Inglaterra da Egreja de Roma. Sómente na monarchia hespanhola, é que o Imperador Carlos v, faltando ás esperanças protestantes, fundiu a prepotencia germanica com a auctoridade latina, lançando a Europa da segunda metade do seculo XVI em um tremendo retrocesso catholico-monarchico. Ter-se-hia inutilisado todo o vigor da Renascença, se o espirito moderno não se firmasse em um facto decisivo que revolucionou o mundo com novas condições da vida - os Descobrimentos dos Portuguezes.

N'este quadro complicado dos factores da Renascença, que se conflagram em impulsos vitaes e retrocessos sangrentos de instituições anachronicas que se impõem á sociedade, a

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