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As damas da côrte usualmente poetavam e davam Motes, que eram glosados nos serões pelos galanteadores. Na Arte de Galanteria considerava-se esta prenda como distincção para uma dama: «que haga una Endexa y una Redondilla y que sepa responder a un Mote, y aunque haga algunas, sera cosa asás lucida, sin que las escriva en hojas de arboles, como los oraculos, ni profetisen como las Sybilas, seran estimadas como profecias y respetadas como oraculos. En todolos tiempos florescieron grandes ingenios en mugeres, no desdize la pluma del Aguila, que tambien se buela con ella como con la espada, aunque la Senhora D. Maria de Portugal, que igualó en lo mas la virtud y el entendimiento, que solo es discreta quien es santa, excellentemente dixo:

Se soubera fazer trovas,
De que me satisfizera,
Inda assi as não fizera.

< Pero enquanto Damas, no le aprovamos mas estudio, que antes le tomara rebolviendo unos jasmines que uno Tito Livio, rociando con agua de ambar que no sudando con una Arte poetica de Escaligero.» (Op. cit., 43.) Nas Moradias da Casa da rainha D. Catherina, figura Paula Vicente com o assentamento de Tangedora e môça da Camara; esta sympathica cooperadora de Gil Vicente na coordenação dos seus Autos, foi a mais dedicada companheira da Infanta. Tambem Joanna Vaz e Luisa Sigêa, que apparecem nas Moradias da Casa da Rainha com o titulo de Latinas e

o ordenado de 6$000 rs., (Jur., Obr., 1, 31) foram cedidas para a Infanta, como professoras e senhoras da sua casa. A entrada da Sigêa como mestra de linguas, em 1544, tendo então quatorze annos, explica-se pelo seu raro talento n'essa ordem de conhecimentos; d'ella escreve Feyjó, no Teatro critico: natural de Toledo y originaria de Francia, sobre ser erudita en la Philosophia e buenas-Lettras, fué singular en el ornamento de las lenguas: por que supo la latina, la grega, la hebraica, la arabica, e la syriaca, y en estas lenguas se diz que escribió una carta a Paulo III. Siendo despues su padre Diego Sigeo llamado á la côrte de Lisboa para preceptor de Theodosio de Portugal, Duque de Berganza, la Infanta D. Maria de Portugal hija del rey Don Manoel y de su tercera esposa Dona Leonor de Austria, que era muy amante de las letras, quiso tener en compania á la sabia Sigêa. E' de 1544 o seu assentamento na moradia, e de 1546 a data da Carta polyglota ao papa Paulo III. Luisa Sigêa sentiu na côrte portugueza uma corrente hostil, quando as disciplinas humanistas foram entregues aos Jesuitas em 1555; n'essa obnubilação que apagou o brilhantismo da Renascença em Portugal, Luisa Sigêa deixou a côrte privada de toda a protecção, em 1557, casando com um cavalleiro de Burgos, Francisco de Cuebas, senhor de Villanasur. Algumas cartas, que existem em Madrid e no Museu Britanico, escriptas por

1 Theatro critico, 1, p. 377.

Luisa Sigêa, mostram a tendencia especulativa do seu espirito para os problemas moraes. No seculo XVI, era costume na convivencia social fazer-se perguntas, para provocar respostas difficeis com subtileza e facilidade. Na Vida de Manoel Machado de Azevedo, pelo Marquez de Montebello, vêm umas vinte perguntas apresentadas no fim de um banquete a que assistiu Sá de Miranda, no solar de Crasto, na festa de Santa Margarida feita por seu cunhado. Eram:

Qual o maior engano?

Qual a mayor enfermidade?
Qual a mayor saude? etc.

Em uma Carta (VII, attribuida a Camões) achada por Juromenha, vem as perguntas: -Qual é o maior aggravo que se pode fazer a um homem?

- Qual é a cousa mais importuna?

-Que cousa é esperança ? e para que?

Na côrte da Infanta D. Maria era tambem usual o passatempo das Perguntas. Em uma das Cartas de Luisa Sigêa, do Museu Britanico, lê-se:

Senhor. Perguntastes-me est'outro dia, que livros me parecia que lêsseis para d'elles poder-vos aproveitar na conversação galante e a Perguntas e Respostas, que se apresen

aos que tratam d'ella.» Desculpando-se da demora em satisfazer o pedido, começa indicando as partes de que deve constar a boa conversação: Eu para mim a quereria graciosa, galante, cheia de novidade, sisuda e honesta, que se começasse com desejos e se acabasse sem enfado. Porque, se fôr galante, palavras, gestos, repentes, agudezas não fal

tarão a proposito e a seu tempo; e se fôr graciosa, não virão contos, que são os que entretêm fóra de tempo, antes se saberão intercalar por tal arte que pareçam proprios, não emprestados, naturaes, não furtados de outro, e gostosos, não inconvenientes. Se cheia de novidades, terá o que acima digo, e mais uma certa compostura de cousas que se soe tratar, travada por tal arte, que cada dia se deseja, e pareça sempre que fica começada, e nunca enfade. Não lhe fará damno sobre estas tres propriedades ser por vezes séria, honesta sempre, pois o siso e a gravidade nas pessoas dá confiança aos que conversam e credito aos com quem se conversa de se poder fiar d'elles palavras e outras cousas que traz comsigo a conversação. E a honestidade e compostura faz ser mais gostoso o que se ouve e diz, por que sob estas duas cabem todas as cousas que se podem desejar, tratar e descobrir e pretender na vida; e da desenvoltura e demasiada soltura não se fiam senão os que não sabem nem valem nada, que é mui pouco para desejar.

«Esta conversação alcança por tres meios: o primeiro, pelo habito de conversar sempre com pessoa de valor e de arte, que livremente possa e saiba ir á mão ao que não fôr como o que tenho apontado. O segundo, lição de livros galantes e avisados, de historias ou fabulas, como poetas, que em um verso disseram mais do que outros em quatro regras, e em uma pennada resumiram uma historia ou fabula, que é o que melhor parece na conversação, por quanto contenta o laconismo, ou os historiadores que misturaram bem cartas

sentenciosas e praticas com os grandes feitos e determinações de honra, para dar lustre ás historias tanto de homens como de mulheres, do que se pode tomar bastante, não só para persuadir na conversação o que se deseja como para dar com taes exemplos confiança e assim para se emprehender o que se pretende. Oradores egualmente, que com boas côres rhetoricas quanto quizerem saberão dar a entender e tratal-o com arte tal, que quem o ouvisse não se cansasse se fosse extenso, nem se enfadasse não sendo do seu gosto, tanta foi a força da persuasão e o sal que misturaram com as suas palavras em latim e em toscano, que é lingua para este effeito mais saborosa, os Triumphos de Petrarcha, as estancias e Asolanos de Bembo, e outros mil, que não temos que enumerar, pois o sabem todos, sabendo-o mui poucos, pelo pouco que os

usam.

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O terceiro, e principal via para alcançar a boa conversação é a determinação mui firme que se deve ter de não pensar, quem preten. der tel-a, nem dizer nem desejar cousa vil, nem soez... Resumindo, a pessoa que pretende ter boa conversação e de arte, deve ser no aspecto branda, nas palavras comedida,

1 Esta referencia aos Triumphos de Petrarcha, explica-nos o interesse que fez tentar a traducção anonyma em portuguez do texto fragmentario attribuido a Camões por Juromenha. Merecia conferir-se esta versão com a castelhana de 1553 en la medida y numero de versos que tiene en el toscano, y con nueva glosa » E' possivel que a impressa em Medina del Campo facilitasse a tentativa portugueza.

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