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clara visto o perdam da parte que apresenta e pagará quatro mil reis pera piedade. E por quanto, logo pagou os ditos quatro mil reis pera ao bispo de Sancthomé do meu conselho, e meu esmoler segundo delle fuy certo per hum seu assynado e, per outro de alexandre lopes meu capellão e escrivam do dito carguo que os sobre elle carregou em recepta Vos mando que o mandeis soltar se por al não for preso. E da quy em diante o não prendaes, nem mandeis prender, nem lhe façaes nem consintaes ser feito mal nem outro desaguisado quanto he por razão do conteudo em sua petiçam em esta ultima carta declarado por que minha mercê e vontade he de lhe assy perdoar pela guisa que dito he. O que asy compry huns e outros e al não façaes. Dada em esta minha cidade de Lixboa aos sete dias do mez de Março e feita aos 3 do dito mez. El Rei nosso Sr. o mandou por dom gonçallo pinheiro bispo de Viseu e per o doutor Joham Mont ro chanceler do mestrado de nosso senhor Jesu Christo ambos do meu conselho e seus desembargadores do paço e petições. francisco martins a fez por antonio godinho anno do nascimento de nosso Senhor Jesu Christo de mil quinhentos e cincoenta e tres annos, e eu antonio godinho a fiz escrever. Concertado. Pedro de Oliveira. Concertado. Luis Carvalho, Pedro Gomes 1

Passada a Carta de Perdão em 7 de Março, obteve Camões a soltura na hypothese mais favoravel no dia seguinte, tendo apenas dezeseis dias de liberdade até á hora do embarque para a India em 24 de Março de 1524. Nem tempo teve para preparar-se com roupas e alimentos para uma tormentosa viagem de

1 Perdões e Legitimações de D. João III, Livro xx, fl. 296 v. - Juromenha, Obr., t. I, p. 166. - Custa a crêr como este documento tão patente na Torre do Tombo não despertou a curiosidade de nenhum investigador camoniano, D. Antonio Alvaro da Cunha no seculo xvii ou D. Francisco Alexandre Lobo, no seculo XIX.

seis mezes e sob a disciplina inflexivel do homem de guerra. 1

D'esta vez não se appresentou seu pae como fiador, no Registo da Casa da India, como em 1550. D'aqui se infere que estava ausente de Lisboa, ou que, melindrado pela prisão do filho se não quizesse prestar a nova responsabilidade. As tradições, colhidas pelos linhagistas, auxiliam o esclarecimento do problema. No Manuscripto genealogico de Cabedo (1602 a 1604) encontrou Camillo Castello Branco esta referencia a Simão Vaz de Camões: « que foi por Capitão de uma náo á India, e deu á cósta á vista de Goa; salvou-se em uma taboa, e lá morreu, deixando viuva Anna de Macedo, dos Macedos de Santarem.»

Quasi dez annos depois d'este trecho de

1 Quando era ainda ignorada a existencia da Carta de Perdão, que authentíca a data da partida de Camões para a India, já Severim de Faria tinha determinado o anno de 1553 por um processo deductivo: Não achei em seus versos, nem em memoria alguma o anno em que se embarcou. Sómente escreve, que tanto que chegou a Gôa sahiu o Vice-Rei com uma armada sobre o Rey da Pimenta Foi esta empreza, segundo referem as historias da India, no fim do anno de 1553. Pelo que consta que partiu de Lisboa no março de 1553 com Fernando Alvares Cabral, que, indo por Capitão de quatro náos, só elle chegou á India no primeiro de Setembro do mesmo anno.» (Disc., fl. 3) Fixada tão lucidamente esta data, para que havia Faria e Sousa fabricar um documento, como o increpa o Dr. Storck, repetindo o que já estava sabido?

2 A Carta de perdão a Camões nada tem de humilhante; já em 1551 fôra passada a Christovam Falcão uma carta de perdão por ter ferido o Meirinho de Portalegre.

Cabedo, publicou Pedro de Mariz em 1613, na biographia do poeta, que Simão Vaz: «foy por Capitão de uma náo á India, naufragando nas costas da terra firme de Gôa.»

E fallando do naufragio do poeta, confunde-o com o do pae, misturando dados da tradição de Cabedo, d'esta fórma: « E como o nosso Poeta ficou sem pay, e tão pobre, que se salvou em uma taboa em tempo que esperava ficar rico: vendo-se n'este desamparo (ou como dizem homiziado ou desterrado por huns amores no Paço da Rainha, se embarcou para a India.» Pelo Indice de toda a Fazenda, por Figueiredo Falcão, sabe-se que uma Não Conceição, em 1553 arribada, tinha em 1555, no seu naufragio, segundo a relação de Manoel Rangel, por Feitor um tal Simão Vaz, que ahi morreu.

1

1 Na Relação do Naufragio da Náo Conceição em 1555, no Baixo de Pero dos Banhos, lê-se: Tanto que Simão Vaz, Feitor da Náo, a viu arrombada, logo se metteu na primeira batelada, em a qual saíu em terra, e andou n'ella por espaço de uma hora toda em redondo, tão pasmado, como homem fóra de seu juizo. Lembrou-se que lhe ficára um pouco de dinheiro em um cofre; tanto que lhe lembrou, tornou-se a embarcar para tornar á Náo, e quando lá foi já o não achou; então se tornou com o Capitão e com Affonso da Gama, que inda não tinha vindo á terra, e quando se veiu ao desembarcar não se quiz sahir do batel, e disseThe o Capitão Affonso da Gama : — Não torneis á Náo, que não tendes lá que fazer. Elle, dizem que, respondeu: Eu quero tornar para fazer tirar algumas cousas que são necessarias. E não se quiz sahir e ficou em o batel com o Contra-mestre e marinheiros; e tanto que o batel foi remando e que se afastou das pedras, olhou para terra e então disse que o tornassem a pôr

Faria e Sousa transcrevendo as indicações que encontrou no Livro de apontamentos das Pessoas que passaram á India, continúa:

Aunque el Poeta se huviese alistado el año de 1550 no se embarcó: hizolo el de 1553 en que fué por Capitão Mayor de las Naves Fernando Alvares Cabral.»

E accrescenta Faria e Sousa os esclarecimentos decisivos:

«En el Registro de la gente d'ella y titulo de la Gente de guerra, ay este assiento: = Fernando Casado, hijo de Manuel Casado y de Blanca Queymada, moradores en Lisboa, Escudero. Fué en su lugar LUIZ DE CAMÕES, hijo de Simão Vaz y Ana de Sá, Escudero; y recebio 2400 reis como los de

mas =

No livro do viajante Pyrard, contendo a

em terra; e os marinheiros e Contra-Mestre não quizeram, por que tinham já levada a fateixa, e os mares quebravam muito rijo; não ousaram a tornar; e n'isto chamou por um mancebo que se chamava Pedro Alvares sobrinho do Mestre, marinheiro da Náo, e dizem que lhe dissera d'esta maneira : — Dizei-me, Foam; querem-me matar os marinheiros? E elle lhe respondeu, que nem dissesse tal cousa, nem cuidasse n'isso. Respondeu então o Feitor: Se sois meu amigo, ponde-me em terra, se não lançar-me-hei ao mar. E n'isto lhe disse um Antonio Gonçalves, que vinha por Condestavel da Náo, que se lançasse, se quizesse, que não havia de tornar á terra; e elle com isto se despediu e se lançou ao mar, e indo para terra, vieram uns mares grandes, e passaram por riba d'elle, e vindo junto das pedras veiu um mar e o botou entre as mesmas pedras, e alli se afogou e ao outro dia o acharam morto, porque o mar o botou fóra, e vinha com umas mordeduras nas pernas, que pareciam de peixes, e en

noticia da sua navegação das Indias Orientaes, de 1601 a 1611, descreve-se a organisação das Armadas que partiam de Lisboa: « Quando se quer fazer um embarque de Lisboa para a India, fazem uma léva de soldados por todo o Portugal, em cada freguezia, como cá se faz com os gastadores, e acceitam toda a sorte de gente, de qualquer qualidade e condições que seja, comtanto que chegue á edade de nove a dez annos; e esses tomam a rol e ficam tidos e pagos por soldados. Se não se acha quem queira ir de propria vontade, fazem-nos ir por força, sem differença de edade, e todos matriculados na Casa da India, de Lisboa, onde dão fiador até embarcarem. Adianta-se-lhes todo o dinheiro da viagem, por que a maior parte são filhos de gente pobre, e têm necessidade de se vestir e

terramol-o na Ilha, e com a sua morte fômos muito tristes, porque até então não tinha morrido nenhuma pessoa. (Historia Tragico-maritima, t. 1, p. 186.)

Seria este Simão Vaz o pae do Poeta? Com este simples nome é referido como pae de Luiz Vaz de Camões na Carta de Perdão de 7 de Março de 1553, e no Assento da Casa da India para o embarque do poeta em 1550; e esse mesmo Simão Vaz que trabalhava nos Armazens da Guiné e India e nas Armadas em 1529, é o Simão Vaz Feitor da Náo Conceição naufragada em 1555.

Além disso, Simão Vaz de Camões era filho de D. Guiomar da Gama, e o piloto da Náo era Affonso da Gama, que tratava o Feitor com intimidade.

As tradições conservadas por Cabedo e Pedro de Mariz de ter o pae do poeta naufragado, salvando-se em uma taboa (batelada) em tempo que esperava ficar rico e depois lá morreu, coincidem com a época de 1553 (ausente de Lisboa) e 1555 em que morre.

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