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LI

Fui dos filhos asperrimos da terra,
Qual Encèlado, Egeo, e o Centimano:
Chamei-me Admastor, e fui na guerra
Contra o, que vibra os raios de Vulcano:
Não que puzêsse serra sobre serra;
Mas, conquistando as ondas do Occeano,.
Fui capitão do mar, por onde andava
A armada de Neptuno, que eu buscava.

LVIII

Eram já neste tempo meus irmãos
Vencidos, e em miseria extrema postos;
E, por mais segurar-se os deoses vãos,
Alguns a varios montes sotopostos:
E como contra o ceo não valem mãos,
Eu, que chorando andava meus desgostos,
Comecei a sentir do fado imigo
Por meus atrevimentos o castigo.

LIX

Converte-se-me a carne em terra dura,
Em penedos os ossos se fizeram,
Estes membros, que vês, e esta figura
Por estas longas aguas se estenderam:
Em fim, minha grandissima estatura
Neste remoto cabo converteram
Os deoses; e, por mais dobradas magoas,
Me anda Thetis cercando destas agoas.

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Assi contava, e c'hum medonho choro
Subito d'ante os olhos se apartou:
Desfez-se a nuvem negra, e c'hum sonoro
Bramido muito longe o mar sôou.
Eu, levantando as mãos ao sancto côro
Dos Anjos, que tão longe nos guiou,
A Deus pedi, que removesse os duros
Casos, que Adamastor contou futuros.

EXCERPTOS DO CANTO VI

Os argonautas Portuguezes, amigavelmente recebidos, e muito festejados pelo Rei de Melinde, despedem-se do seu magnanimo hospedeiro, e proseguem na aventurosa navegação

I

Não sabia, em que modo festejasse
O Rei pagão os fortes navegantes;
Para que as amizades alcançasse

Do Rei Christão, das gentes tão possantes:
Pêza-lhe, que tão longe o aposentasse

Das Europeas terras abundantes

A ventura, que não no fez visinho

Donde Hercules ao mar abrio o caminho.

II

Com jogos, danças; e outras alegrias,
A segundo a policia Melindana,

Com usadas e lêdas pescarias,

Com que a Lageia Antonio alegra, e engana,
Este famoso Rei todos os dias

Festeja a companhia Lusitana,
Com banquetes, manjares desusados,
Com fructas, aves, carnes, e pescados.

ין

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Mas vendo o Capitão, que se detinha
Já mais, do que devia, e o fresco vento
O convida, que parta, e tome asinha
Os pilotos da terra, e mantimento;
Não se quer mais detêr; que ainda tinha
Muito para cortar do salso argento:
Já do Pagão benigno se despede,
Que a todos amizade longa pede.

IV

Pede-lhe mais, que aquelle porto seja
Sempre com suas frotas visitado;
Que nenhum outro bem maior deseja,
Que dar a taes barões seu reino e estado;
E que, em quanto seu corpo o esprito reja,
Estará de contino apparelhado

A pôr a vida, e reino totalmente,
Por tão bom Rei, por tão sublime gente.

Outras palavras taes lhe respondia
O Capitão, e logo, as velas dando,
Para as terras da Aurora se partia,
Que tanto tempo ha já, que vai buscando.
No piloto, que leva, não havia
Falsidade, mas antes vai mostrando
A navegação certa; e assi caminha
Já mais seguro, do que d'antes vinha.

Baccho, querendo oppor-se ao feliz exito do heroico commettimento dos navegadores Portuguezes, desce do Olympo, e vai-se à corte de Neptuno deos dos mares

VI

As ondas navegavam do Oriente

Já nos mares da India, e enxergavam
Os thalamos do Sol, que nasce ardente:
Já quasi seus desejos se acabavam.
Mas o mao de Thyoneo, que na alma sente
As venturas, que então se apparelhavam
A gente Lusitana, dellas dina,
Arde, morre, blasphema, e desatina.

VII

1

Vai estar todo o Ceo determinado
De fazer de Lisboa nova Roma:
Não no pode estorvar; que destinado
Está d'outro poder, que tudo doma.
Do Olympo desce em fim desesperado,
Novo remedio em terra busca, e toma:
Entra no humido reino, e vai-se á côrte
Daquelle, a quem o mar cabio em sorte.

Descripção do palacio de Neptuno

VIII

No mais interno fundo das profundas
Cavernas altas, onde o mar se esconde,
Lá donde as ondas sahem furibundas,
Quando ás iras do vento o mar responde.
Neptuno mora, e moram as jucundas
Nereidas, e outros deoses do mar, onde
As aguas campo deixam ás cidades,
Que habitam estas humidas deidades.

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