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IX

Descobre o fundo nunca descoberto
As areas alli de prata fina,

Torres altas se vêm no campo aberto
Da transparente massa crystallina:
Quanto se chegam mais os olhos perto,
Tanto menos a vista determina,
Se he crystal o, que vê, se diamante;
Que assi se mostra claro e radiante.

X

As portas d'ouro fino, e marchetadas
Do rico aljofar, que nas conchas nace,
De esculptura formosa estão lavradas,
Na qual do irado Baccho a vista pace:
E vê primeiro em côres variadas
Do velho chaos a tão confusa face:
Vêm-se os quatro elementos trasladados,
Em diversos officios occupados.

XI

Alli sublime o Fogo estava em cima,
Que em nenhuma materia se sostinha,
Daqui as cousas vivas sempre anima,
Despois que Prometheo furtado o tinha.
Logo após elle leve se sublima
O invisibil Ar, que mais asinha
Tomou lugar, e nem por quente, ou frio
Algum deixa no mundo estar vazio.

XII

Estava a Terra em montes revestida
De verdes hervas, e arvores floridas,
Dando pasto diverso, e dando vida
Ás alimarias nella produzidas:
A clara forma alli estava esculpida
Das Aguas entre a terra desparzidas,
De pescados criando varios modos,
Com seu humor mantendo os corpos todos:

XIII.

N'outra parte esculpida estava a guerra,
Que tiveram os deoses co'os gigantes,
Está Typheo debaixo da alta serra

De Ethna, que as flammas lança crepitantes;
Esculpido se vê ferindo a terra
Neptuno, quando as gentes ignorantes,
Delle o cavallo houveram, e a primeira
De minerva pacifica oliveira.

Baccho he recebido por Neptuno ás portas do seu palacio, e pede a esta divindade que chame aos seus paços todos os deoses maritimos, para lhes serem communicadas cousas de altissima importancia

XIV

Pouca tardança faz Lyeo irado
Na vista destas cousas; mas, entrando
Nos paços de Neptuno, que, avisado
Da vinda sua, o estava já aguardando,
As portas o recebe, acompanhado
Das nymphas, que se estão maravilhando
De ver que, commettendo tal caminho,
Entre no reino d'agua o rei do vinho:

XV

O Neptuno, lhe disse, não te espantes
De Baccho nos teus reinos receberes;
Porque tambem co'os grandes e possantes
Mostra a fortuna injusta seus poderes:
Manda chamar os deoses do mar, antes
Que falle mais, se ouvir-me o mais quizeres;
Verão da desventura grandes modos,
Ouçam todos o mal, que toca a todos.

--

Neptuno manda convocar os deoses do mar pelo seu correio Tritão. Retrato deste personagem. - Enumeração das divindades que acudiram ao chamamento

XVI

Julgando já Neptuno, que seria
Estranho caso aquelle, logo manda

Tritão, que chame os deoses da agua fria,
Que o mar habitam d'huma e d'outra banda:
Tritão, que de ser filho se gloria
Do Rei, e de Salacia veneranda,
Era mancebo grande, negro e feio,
Trombeta de seu pai, e seu correio.

XVII

Os cabellos da barba, e os que decem
Da cabeça nos hombros, todos eram
Huns limos prenhes d'agua, e bem parecem,
Que nunca brando pentem conheceram:
Nas pontas pendurados não fallecem
Os negros misilhões, que alli se geram:
Na cabeça por gorra tinha posta
Huma mui grande casca de lagosta.

XVIII

O corpo nu, e os membros genitais,
Por não ter ao nadar impedimento;
Mas porêm de pequenos animais
Do mar todos cobertos cento e cento:
Camarões, e cangrejos, e outros mais
Que recebem de Phebo crescimento:
Ostras, e breguigões do musgo sujos,
As costas com a casca os caramujos.

XIX

Na mão a grande concha retorcida,
Que trazia, com força já tocava:
A voz grande canora foi ouvida
Por todo o mar, que longe retumbava.
Já toda a companhia apercebida
Dos deoses para os paços caminhava
Do deos, que fez os muros de Dardania,
Destruidos despois da Grega insania.

XX

Vinha o padre Oceano acompanhado
Dos filhos, e das filhas, que gerara:
Vem Nereo, que com Doris foi casado,
Que todo o mar de nymphas povoara:
O propheta Protêo, deixando o gado
Maritimo pascer pela agua amara,
Alli veio tambem; mas já sabia
O, que o padre Lyeo no mar queria.

XXI

Vinha por outra parte a linda esposa
De Neptuno, de Cælo, e Vesta filha,
Grave, e lêda no gesto, e tão formosa,
Que se amansava o mar de maravilha:

XXII

Amphitrite, formosa como as flores,
Neste caso não quiz que fallecesse,
O Delphim traz comsigo, que aos amores
Do Rei lhe aconselhou que obedecesse:
Co'os olhos, que de tudo são senhores,
Qualquer parecerá que o Sol vencesse :
Ambas vem pela mão, igual partido ;
Pois ambas são esposas d'hum marido.

XXIII

Aquella, que das furias de Athamante
Fugindo, veio a ter divino estado,
Comsigo traz o filho, bello infante,
No numero dos deoses relatado:
Pela praia brincando vem diante
Com as lindas conchinhas, que o salgado
Mar sempre cria, e ás vezes pela area.
No collo o toma a bella Panopêa.

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