Pagina-afbeeldingen
PDF
ePub

XII

Manda logo os feitores Lusitanos
Com toda sua fazenda livremente,
A pezar dos imigos Mahometanos;
Porque lhe torne a sua presa gente:
Desculpas manda o Rei de seus enganos.
Recebe o Capitão de melhor mente.
Os presos, que as desculpas; e, tornando
Alguns negros, se parte as velas dando.

XIII

Parte-se costa abaixo; porque entende,
Que em vão co'o Rei gentio trabalhava
Em querer delle paz, a qual pretende,
Por firmar o commercio, que tratava:
Mas como aquella terra, que se estende
Pela Aurora, sabida já deixava;
Com estas novas torna á patria chara,
Certos sinaes levando do que achara.

XIV

Leva alguns Malabares, que tomou
Por força, dos que o Samorim mandara,
Quando os presos feitores lhe tornou:
Leva pimenta ardente, que comprara:
A sêcca flor de Banda não ficou,
A noz, e o negro cravo, que faz clara
A nova ilha Maluco, co'a canella,
Com que Ceilão he rica, illustre, e bella.

XVI

Isto tudo lhe houvera a diligencia
De Monçaide fiel, que tambem leva;
Que, inspirado de angelica influencia,
Quer no livro de Christo, que se escreva.
Oh ditoso Africano, que a clemencia
Divina assi tirou d'es ura treva,
E tão longe da patria achou maneira
Para subir a patria verdadeira!

XVI

Apartadas assi da ardente costa
As venturosas náns, levando a prôa-
Para onde a natureza tinha posta,
A meta Au-trina da esperança boa,
Levando alegres novas, e resposta
Da parte Oriental para Lisboa,

Outra vez commettendo os duros medos
Do mar incerto, timidos e ledos:

XVII

O prazer de chegar a patria chara,
A seus penates charos, e parentes,
Para contar a peregrina, e rara:
Navegação, os varios ceos, e gentes:
Vir a lograr o premio, que ganhara
Por tão longos trabalhos, e accidentes,
Cada hum tem por gosto tão perfeito,
Que o coração para elle he vaso estreito.

A Deosa Venus, affeiçoada aos Portuguezes, determina offerecer aos esforçados navegadores, depois de tantas fadigas e perigos, algum deleite, algum descanço, fazendo-os aportar a huma ilha deliciosa situada no meio do Oceano

XVIII

Porêm a deosa Cypria, que ordenada
Era para favor dos Lusitanos,

Do Padre eterno, e por bom genio dada,
Que sempre os guia já de longos annos;
A gloria, por traballos alcançada,
Satisfação de bem soffridos danos,
Lhe andava ja ordenando, e pretendia
Dar-lhe nos mares tristes alegria.

XIX

J

Despois de ter hum pouco revolvido
Na mente o largo mar, que navegaram:
Os trabalhos, que pelo Deos, nascido
Nas Amphionêas Thebas, se causaram:
Já trazia de longe no sentido,

Para premio de quanto mal passaram,
Buscar-lhe algum deleite, algum descanso
No reino de crystal liquido, e manso:

XX

Algum repouso em fim, com que podesse
Refociliar a lassa humanidade.

Dos navegantes seus, como interesse
Do trabalho, que eucuria a breve idade.

[blocks in formation]

Isto bem revolvido, determina
De ter-lhe aparelhada lá no meio
Das aguas alguma insula divina,
Ornada d'esmaltado e verde arreio;
Que muitas tem no reino, que confina
Da mãe primeira co'o terreno seio,
Afora as que possue soberanas

Para dentro das portas Herculanas.

Os Portuguezes avistam de longe a ilha encantada. Bellissima pintura daquella deliciosa paragem.

LI

Cortando vão as náos a larga via
Do mar ingente para a patria amada,
Desejando prover-se de agua fria
Para a grande viagem polongada:
Quando juntas, como subita alegria
Houveram vista da ilha namorada,
Rompendo pelo ceo a mãi formosa
De Memnónio, suave e deleitosa.

LII

De longe a ilha viram fresca e bella;
Que Venus pelas ondas Iha levava,
(Bem como o vento leva branca vela)
Para onde a forte armada se enxergava;
Que, porque não passassem, sem que nella
Tomassem porto, como desejava,
Para onde as nãos navegam a movia
A Acidália, que tudo em fim podia.

LIII

Mas firme a fêz e immobil, como vio,
Que era dos nautas vista, e demandada;
Qual ficou Delos, tanto que pario
Latona Phebo, e a deosa á caça usada.
Para lá logo a prôa o mar abrio,
Onde a costa fazia huma enseada
Curva e quieta, cuja branca area
Pintou de ruivas conchas Cytherea.

LIV

Tres formosos outeiros se mostravam
Erguidos com soberba graciosa,

Que de gramineo esmalte se adornavam,
Na formosa ilha alegre, e deleitosa:
Claras fontes, e limpidas manavam
Do cume, que a verdura tem viçosa:
Por entre pedras alvas se deriva
A sonorosa lympha fugitiva.

LV

N'hum valle ameno, que os outeiros fende,
Vinham as claras aguas ajuntar-se,
Onde huma meza fazem, que se estende
Tão bella, quanto pode imaginar-se :
Arvoredo gentil sobre ella pende,
Como que prompto está para affeitar-se,
Vendo-se no crystal resplandecente,
Que em si o está pintando propriamente.

« VorigeDoorgaan »