Pagina-afbeeldingen
PDF
ePub

XXI

Isto bem revolvido, determina
De ter-lhe aparelhada lá no meio
Das aguas alguma insula divina,
Ornada d'esmaltado e verde arreio;
Que muitas tem no reino, que confina
Da mãe primeira co'o terreno seio,
Afora as que possue soberanas

Para dentro das portas Herculanas.

Os Portuguezes avistam de longe a ilha encantada. Bellissima pintura daquella deliciosa paragem.

LI

Cortando vão as nãos a larga via
Do mar ingente para a patria amada,
Desejando prover-se de agua fria
Para a grande viagem polongada:
Quando juntas, como subita alegria
Houveram vista da ilha namorada,
Rompendo pelo ceo a mãi formosa
De Memnónio, suave e deleitosa.

LII

De longe a ilha viram fresca e bella;
Que Venus pelas ondas lha levava,
(Bem como o vento leva branca vela)
Para onde a forte armada se enxergava;
Que, porque não passassem, sem que nella
Tomassem porto, como desejava,
Para onde as nãos navegam a movia
A Acidália, que tudo em fim podia.

LIII

Mas firme a fêz e immobil, como vio,
Que era dos nautas vista, e demandada;
Qual ficou Delos, tanto que pario
Latona Phebo, e a deosa á caça usada.
Para lá logo a prôa o mar abrio,
Onde a costa fazia huma enseada
Curva e quieta, cuja branca arêa
Pintou de ruivas conchas Cytherea.

LIV

Tres formosos outeiros se mostravam
Erguidos com soberba graciosa,

Que de gramineo esmalte se adornavam,
Na formosa ilha alegre, e deleitosa:
Claras fontes, e limpidas manavam
Do cume, que a verdura tem viçosa:
Por entre pedras alvas se deriva
A sonorosa lympha fugitiva.

LV

N'hum valle ameno, que os outeiros fende,
Vinham as claras aguas ajuntar-se,

Onde huma meza fazem, que se estende
Tão bella, quanto pode imaginar-se:
Arvoredo gentil sobre ella pende,
Como que prompto está para affeitar-se,
Vendo-se no crystal resplandecente,
Que em si o está pintando propriamente.

LXII

A candida cecêm, das matutinas
Lagrimas rociada, e a mangerona :
Vem-se as letras nas flores Hyacinthinas,
Tão queridas do filho de Latona:
Bem se enxerga nos pomos, e boninas,
Que competia Chloris com Pomona.
Pois se as aves no ar cantando vôam
Alegres animaes o chão povoam:

LXIII

A longo da agua o niveo cysne canta,
Responde-lhe do ramo philomela:
Da sombra de seus cornos não se espanta
Acteon n'agua crystallina e bella:
Aqui a fugace lebre se levanta

Da espessa mata, ou timida gazella:
Alli no bico traz ao charo ninho
O mantimento o leve passarinho.

Tendo os Portuguezes desembarcado na deleitosa ilha que Venus lhes prepara, são nella acolhidos e festejados pela deosa Thetis e pelas Nereidas, com as quaes celebram festivas bôdas, que não eram, outra coisa mais do que hum symbolo das honras que acompanham perpetua e indivisivelmente os varões que se assignalam por grandes façanhas. Dada esta explicação deste periodo do poema, o grande poeta remata o seu nono canto com huma calorosa exhortação aos seus compatriotas desejosos de fama immortal

LXXXIV

Desta arte em fim conformes já as formosas
Nymphas co'os seus amados navegantes,
Os ornam de capellas deleitosas,
De louro, e de ouro, e flores abundantes:
As mãos alvas lhe davam como esposas:
Com palavras formaes, e estipulantes
Se promettem eterna companhia
Em vida e morte. de honra e alegria.

LXXXV

Huma dellas maior, a quem se humilha
Todo o coro das nymphas, e obedece,
Que, dizem, ser de Cælo e Vesta filha,
O que no gesto bello se parece;
Enchendo a terra, e o mar de maravilha,
O Capitão illustre, que o merece,
Recebe alli com pompa honesta e regia,
Mostrando-se senhora grande e egregia;

LXXXVI

Que, despois de lhe ter dito, quem era,
C'hum alto exordio de alta graça ornado,
Dando-lhe a entender, que alli viera
Por alta influição do immobil fado;
Para lhe descobrir da unida esphera,
Da terra immensa, e mar não navegado
Os segredos por alta prophecia,
O que esta sua nação só merecia:

LXXXVII

Tomando-o pela mão, o leva, e guia
Para o cume d'hum monte alto e divino,
No qual hua rica fabrica se erguia
De crystal toda, e de ouro puro, e fino.
A maior parte aqui passam do dia
Em doces jogos, e em prazer contino::

LXXXVIII

Assi a formosa, e a forte companhia
O dia quasi todo estão passando,
N'huma alma, doce, incognita alegria,
Os trabalhos tão longos compensando:
Porque dos feitos grandes, da ousadia
Forte e famosa o mundo está guardando
O premio lá no fim bem merecido
Com fama grande, e nome alto e subido:

LXXXIX 4

Que as nymphas do Oceano tão formosas,
Tethys, e a ilha angelica pintada,
Outra cousa não he, que as deleitosas
Honras, que a vida fazem sublimada:
Aquellas preeminencias gloriosas,
Os triumphos, a fronte coroada
De palma e louro, a gloria e maravilha,
Estes são os deleites desta ilha ;

XC

Que as immortalidades, que fingia
A antiguidade, que os illustres ama,
Lá no estellante Olympo, a quem subia
Sobre as azas inclytas da fama.
Por obras valerosas, que fazia,
Pelo trabalho immenso, que se chama
Caminho da virtude alto e fragoso,
Mas no fim doce, alegre, e deleitoso.:

« VorigeDoorgaan »